Alta de juros não freia busca por veículos no Brasil

Apesar dos altos juros praticados no mercado financeiro e dos elevados preços dos automóveis, o financiamento de veículos tem aumentado no Brasil. De acordo com dados da B3, em maio deste ano, entre novos e usados, foram 602 mil unidades financiadas, alta de 4,3% na comparação com o mesmo período de 2024. Em relação a abril deste ano, o aumento foi de 6,1%.
No segmento de autos leves, houve crescimento de 1,4% ante maio de 2024. Comparado a abril de 2025, o saldo foi 4,7% maior. Já o financiamento de motos cresceu 2,3% em relação a abril de 2025 e 4,7% em relação a maio de 2024.
De acordo com o presidente da Associação dos Revendedores de Veículos no Estado de Minas Gerais (Assovemg), Glenio Junior, o resultado nacional se repete em Minas Gerais. De janeiro a maio, ele afirma que o financiamento registrou pequeno crescimento no Estado em comparação com o ano passado, atribuído, em especial, ao interesse do consumidor por veículos entre R$ 20 mil e R$ 80 mil. “Este nicho tem melhorado bastante, tem crescido e está se mantendo sustentável”, avalia.
Apesar dos bons resultados, a taxa de juros do Brasil sobe desde setembro do ano passado, impactando as taxas médias de juros para financiar veículos. Em janeiro deste ano, a taxa anual de financiamento de veículos alcançou 29,5% e protagonizou a maior taxa de juros desde que o Banco Central passou a contabilizar as operações de financiamento de automóveis. Mesmo assim, o financiamento de veículos não caiu.
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Na visão do economista Gabriel Ivo, trata-se de uma situação que pode parecer contraditória. Pela lógica, com a taxa de juros mais alta, haveria uma redução no consumo, especialmente quando observada a compra parcelada, porém os dados mostram que isso não está acontecendo. “Quando há uma alta na taxa de juros, isso leva um tempo para se manifestar, não é imediato. A médio e longo prazo, esse consumo deve diminuir”, observa.
O economista do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) Bruno Inácio atribui a alta ao bom desempenho das vendas de veículos desde o ano passado. “O mercado já estava muito aquecido e continuou aquecido”, pontua.
Ele pontua que a demanda por carros está muito alta e atribui os motivos ao cenário econômico. “Estamos com baixas taxas de desemprego, mercado de trabalho pujante, apetite de crédito muito forte do sistema bancário, inadimplência baixa em termos de risco sistêmico e, ao mesmo tempo, crédito direcionado muito intensificado, atendendo principalmente imóveis e automóveis”, avalia.
O economista Gabriel Ivo ressalta que muitos consumidores compram o veículo por necessidade de mobilidade ou para o trabalho, e as instituições financeiras acabam oferecendo condições melhores em linhas de crédito específicas para essas situações. “As pessoas dão preferência ao usado, que é mais barato, mas acabam comprando mesmo com juros altos”, afirma.
Glenio Junior, da Assovemg, também faz essa observação. Na visão dele, está havendo uma mudança no interesse do consumidor. “O consumidor está migrando do carro zero para o carro seminovo, em função dos altos preços dos veículos zero, ou preferindo o consórcio, que tem aumentado mês a mês”.
Disponibilidade de crédito
Outro motivo que pode estar contribuindo para o aumento dos financiamentos é a maior disponibilidade de crédito. Conforme dados do Banco Central, o estoque de crédito livre às pessoas físicas cresceu 0,5% no mês de maio e 12,8% em doze meses, somando R$ 2,3 trilhões no quinto mês do ano.
O crescimento mensal mostrou-se concentrado nas modalidades de cartão de crédito à vista (+1,2%), financiamento para aquisição de veículos (+1,3%) e crédito pessoal não consignado (+0,9%). “Hoje, muitas agências já trabalham com cartão de crédito dividindo a entrada para facilitar a compra do veículo. Além disso, os bancos, em geral, estão com muito dinheiro em caixa para fazer financiamentos de automóveis e motos”, lembra Glenio Junior.
Inadimplência pode aumentar
Apesar do cenário promissor, os bons números podem trazer um impacto negativo, na visão do economista Gabriel Ivo: a inadimplência. Conforme dados do Banco Central, a taxa média de juros das concessões de crédito do sistema financeiro atingiu 31,5% ao ano, e a inadimplência já demonstra pequenas taxas de crescimento.
“O Banco Central já vem apontando isso. As pessoas compram por necessidade, mas poderão ter mais dificuldade para arcar com o compromisso a médio e longo prazo”, observa Ivo.
O economista do BDMG, Bruno Inácio, acredita que, apesar de já manifestar alta, a inadimplência ainda não é um risco. “É um movimento normal no início do ano; depois, ela tende a se estabilizar. Ela não cresceu por causa de risco no sistema, mas sim em função da Resolução 4.966, que mudou um pouco a forma de medir a inadimplência. Ela está maior, mas ainda próxima das baixas históricas”, afirma.
Entretanto, concorda que, se as condições macroeconômicas permanecerem com inflação elevada, com juros contracionistas por muito tempo e as famílias perderem o poder de compra, “aí sim a gente acende o sinal amarelo, mas, por enquanto, ainda não”, completa.
Financiamento de veículos pesados retrai
O número de financiamentos para o segmento de veículos pesados, de acordo com dados da B3, em maio de 2025, foi, no entanto, 2,1% menor do que em maio de 2024 e 2,1% inferior a abril de 2025, o pior resultado entre os segmentos. O desempenho ruim reflete o cenário macroeconômico, segundo os especialistas.
Dados divulgados pela Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), referentes a maio, mostram que o número de emplacamentos de caminhões apresentou retração de 5% em relação ao mesmo mês de 2024, assim como os implementos rodoviários, que acumularam redução de 13% no mesmo período.
O presidente da Fenabrave, Arcelio Junior, atribui os maus resultados à insegurança dos transportadores quanto à economia. “O mercado de caminhões vem enfrentando um ambiente desafiador, impactado pelo aumento da Selic, do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e pelo encarecimento do crédito, dificultando as compras de veículos pesados”, afirma.
A taxa básica de juros, combinada ao aumento do IOF, tem dificultado, na avaliação do presidente da Fenabrave, a renovação de frota, sobretudo entre transportadoras que atuam nos setores do agronegócio e da construção civil, segmentos altamente dependentes de financiamento.
O presidente da Assovemg também pontuou que a retração atingiu ainda o mercado de veículos premium em Minas Gerais – aqueles veículos acima de R$ 200 mil.
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