Economia

Apreensivo, setor produtivo vê oportunidade em tarifaço de Trump

Setor produtivo em Minas Gerais está apreensivo, mas medida do governo dos EUA pode dar mais competitividade para a pauta de exportações
Apreensivo, setor produtivo vê oportunidade em tarifaço de Trump
foto: Leah Millis / Reuters

O setor produtivo de Minas Gerais está apreensivo, mas, ao mesmo tempo, enxerga uma oportunidade competitiva na aplicação das tarifas recíprocas de 10% dos EUA sobre todas as exportações brasileiras, impostas no “tarifaço” anunciado nesta quarta-feira (2) pelo presidente do país americano, Donald Trump.

Os produtos mineiros mais vendidos ao mercado norte-americano em 2024 foram o café, ferro fundido e ferro-ligas. O setor produtivo aponta que as novas tarifas podem gerar uma vantagem competitiva principalmente com o café, mas ainda não está claro se a medida vai gerar um efeito cumulativo para a indústria siderúrgica.

A Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) destacou, em nota, que, embora o tarifaço represente um endurecimento nas políticas comerciais americanas, a entidade entende que também pode ser “uma vantagem competitiva para o Brasil frente aos demais países e, eventualmente, uma oportunidade para a indústria nacional”.

A Fiemg afirmou que é preciso entender se a nova tarifa comercial se soma a outras taxas já em vigor no mercado norte-americano, como as taxas de 25% aplicadas recentemente sobre a importação de aço, alumínio e setor automotivo. “A imposição de 25% de tarifas sobre produtos siderúrgicos, já anunciadas anteriormente e agora, se acrescidas de 10%, afetarão diretamente a competitividade da indústria nacional”, declarou.

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No setor automotivo, a Fiemg aponta que o tarifaço de Trump pode ter uma repercussão negativa sobre a produção nacional, “especialmente em Minas Gerais, que é um dos principais exportadores de peças e acessórios para veículos para os EUA”.

Entre os 194 países que as exportações mineiras alcançaram em todo o mundo no ano passado, os Estados Unidos foram o segundo principal destino, com uma fatia de 11% de todos os embarques do Estado. O país ficou atrás apenas da China, que representou 36,6% de todas as vendas realizadas em território mineiro ao exterior em 2024.

Apesar da liderança chinesa, as exportações de Minas Gerais para os EUA totalizaram US$ 4,6 bilhões, um crescimento de 27,5% em relação a 2023. Já para o mercado chinês, as vendas do Estado somaram US$ 15,4 bilhões, uma queda de 4,6% em relação ao ano anterior.

Com experiência na área de exportação em cooperativas, o cafeicultor da Fazenda Monjolo, em Três Pontas, no Sul do Estado, Allan Botrel, ressaltou que qualquer barreira comercial é sempre preocupante para o setor, mas a posição dos EUA, no caso do café, é muito dependente dos grandes produtores mundiais, como o Brasil.

Em caso de um tratamento igualitário entre os produtores, o setor cafeeiro estadual e nacional não deve ser prejudicado. Segundo Botrel, uma perda de mercado só aconteceria em caso de tratamento diferencial desfavorável. É o que pode ocorrer com o Vietnã, o segundo maior produtor mundial de café, taxado em 46% no tarifaço desta quarta-feira. “Em termos relativos, o café vietnamita, majoritariamente robusta, que aqui a gente chama conilon, vai ficar mais caro, então a gente está ganhando competitividade nesse segmento”, analisa.

O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) preferiu não se manifestar no momento sobre o tarifaço de Trump. O Cecafé aguarda a formalização das tarifas recíprocas para ter a certeza de qual será a tributação efetiva. Enquanto isso, o Conselho faz contato com a National Coffee Association, a principal associação para pesquisa de mercado e indústria cafeeira dos EUA, para saber tanto da confirmação do tributo, quanto os possíveis impactos nas exportações brasileiras e no mercado consumidor norte-americano.

Somente a exportação do café de Minas Gerais para os EUA gerou US$ 1,5 bilhão em 2024, um crescimento de 66,3% em relação a 2023. O resultado foi impulsionado pela alta na cotação do produto no mercado internacional, que alcançou recordes históricos recentemente.

Os embarques mineiros de ferro fundido e ferro-ligas geraram, respectivamente, montantes de US$ 965,3 milhões e US$198,1 milhões no ano passado. Comparado a 2023, o valor das exportações ficou relativamente estável no caso do ferro fundido, com leve alta de 0,81%. Já em ferro-ligas houve aumento de 10,8%. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic).

Impacto na queda de exportações do aço para EUA pode ser de quase R$ 840 milhões

É possível vislumbrar o potencial impacto que o “tarifaço” de Trump pode ter no Estado, a partir de medidas anteriores no mesmo sentido. Ainda neste mês de março, por exemplo, entrou em vigor a cobrança de tarifas de 25% sobre todas as importações de aço e alumínio nos Estados Unidos, também estabelecida por meio de um decreto de Donald Trump.

Cerca de um quarto de todo o aço utilizado na indústria da maior economia do mundo é importado. Em termos de volume, o Brasil é o segundo maior fornecedor de aço para os EUA, atrás apenas do Canadá. Foram 4,1 milhões de toneladas exportadas do Brasil para os Estados Unidos no ano passado. Os dados são do Departamento de Comércio dos EUA.

A Fundação João Pinheiro (FJP) realizou simulações dos impactos, em Minas Gerais, causados por uma redução nas exportações do Estado para os EUA, especificamente do setor de produção de ferro-gusa/ferro-ligas, siderurgia e tubos de aço sem costura. A FJP aponta que qualquer redução dessas exportações pode ter efeito cascata em toda a economia estadual.

Foram analisados três cenários com diferentes níveis de queda nas exportações, com baixas de 5%, 10% e 15%. Os resultados, expressos em milhões de reais a preços de 2024, revelam o potencial impacto direto e indireto sobre o Valor Adicionado (VA) da economia do Estado.

Uma queda de 5% nas exportações do setor, de Minas para os EUA, pode gerar uma redução de R$ 279,62 milhões no VA da economia mineira. Se essa queda for de 10%, a retração do Valor Adicionado será praticamente o dobro do primeiro cenário: R$ 559,23 milhões. Já na conjuntura mais pessimista, com baixa de 15%, o impacto no VA da economia do Estado seria uma redução de R$ 838,85 milhões.

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