Brasil busca desenvolver o mercado de capitais para mineradoras

No Brasil, as pequenas empresas do setor mineral enfrentam dificuldades para captar recursos financeiros e, por consequência, boa parte delas abre capital em países como Canadá, Austrália e Inglaterra, onde encontra maior facilidade para obtê-los. O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), entidade que representa as mineradoras, e a B3, a bolsa de valores brasileira, almejam mudar este cenário e buscam soluções para desenvolver o mercado de capitais do País.
A gerente de Pesquisa e Desenvolvimento do Ibram, Cinthia Rodrigues, diz que, independente do porte, as mineradoras se deparam com obstáculos para listar no Brasil. Vale, CSN Mineração, Companhia Brasileira de Alumínio (CBA) e Aura Minerals são as únicas que figuram na B3.
Entretanto, quando se fala especificamente em obter financiamentos, as junior companies, aquelas que estão atuando na pesquisa mineral, são as que esbarram nas maiores objeções, conforme ela. Isso porque a fase de exploração dos depósitos é a de maior risco, o que, por vezes, afasta os investidores. “Para cada mil projetos de pesquisa, apenas um vai virar lavra”, pontua.
Cinthia Rodrigues afirma que são poucos os mecanismos disponíveis no País de auxílio às mineradoras nesse estágio, e as companhias precisam obter recursos para financiar os trabalhos. Logo, se organizam e vão, usualmente, a Toronto, Sydney e Londres, mercados que são mais abertos a risco, porque dispõem de incentivos fiscais e tributários por parte do governo.
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Nesses locais, se o papel comprado cair devido a uma não descoberta mineral, o investidor pode abater a diferença de valor no imposto de renda, conforme a gerente. Ela ressalta que não é necessário copiar, mas que o Brasil tem que se ater a opções como esta. Para sugerir propostas e mostrar exemplos, o Ibram conversa frequentemente com executivos e o Congresso Nacional.
Ecossistema desenvolvido em outros países precisa ser replicado no Brasil
O superintendente de Relacionamento com Empresas da B3, Leonardo Resende, pondera que a bolsa de valores depende de duas partes para que um negócio aconteça: uma companhia que queira se listar e um investidor que queira apostar naquela empresa. Atualmente, esse ecossistema não está tão bem desenvolvido para que as junior companies atraiam investidores brasileiros.
No Canadá, Austrália e Inglaterra, existe um ecossistema completo, que inclui regulação, analistas de research e investidores com conhecimentos específicos geológicos que possibilitam uma análise mais fiel aos desafios de uma pequena mineradora em fase de pesquisa mineral. Esse fato, de acordo com ele, faz com que companhias do mundo inteiro procurem esses mercados.
Resende esclarece que para esse ecossistema ser desenvolvido no País é preciso aprofundar mais sobre o que são as junior companies e o que será exigido delas que seja compatível com o que conseguem fornecer e suficiente para que o investidor entenda o tamanho do risco envolvido no investimento. Ao mesmo tempo, é necessário desenvolver corretoras especializadas nos desafios geológicos do setor. E, por fim, os investidores precisam mapear a demanda.
Esses três pilares, na avaliação dele, passam pela B3, mas também por outros agentes, como o próprio Ibram, banco de investimentos, entre outros. “De nada adianta uma regra perfeita, se eu não tiver empresas preparadas para preencher esse segmento e investidores com vontade de investir”, pondera. Para o superintendente, a construção desse ecossistema vai levar tempo, contudo, existe um enorme potencial no Brasil para que o mercado de capitais seja destravado.
Ações do Ibram e da B3 envolvem conversas sobre a legislação e dupla listagem
Em conjunto com outras entidades privadas, instituições públicas e representantes de órgãos, o Ibram formou a Invest Mining, que visa promover condições que favoreçam o financiamento da mineração no País. Cinthia Rodrigues destaca que participam da rede, especialistas em captar recursos em outros países orientando como a legislação brasileira poderia ser desenhada.

Para ela, a lei precisa vir casada com algum tipo de incentivo para as mineradoras – não necessariamente financeiro. Conforme a gerente, há conversas em andamento sobre um novo projeto de debêntures incentivadas, pois o existente não contempla todo o setor mineral.
Na Lei 14.514, de 29 de dezembro de 2022, fala-se na permissão de utilizar títulos da mineração como garantia já desde a etapa de pesquisa mineral, o que representa uma evolução positiva para as junior companies. Entretanto, de acordo com Cinthia Rodrigues, a legislação não está regulamentada, e não há estimativa de data para que essa regulamentação ocorra.
A B3, que também faz parte da Invest Mining, mantém um debate ativo para acelerar o mercado de capitais brasileiro. Segundo Resende, uma das iniciativas da bolsa em prol desse avanço é replicar no Brasil os papéis de companhias que estão listadas em outro mercado, ou seja, uma dupla listagem, como ocorreu com a Sigma Lithium, por meio de BDRs (Brazilian Depositary Receipts, certificados representativos de ações de empresas estrangeiras, negociados no País).
A criação de um fundo de investimentos em projetos de minerais estratégicos, por parte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que prevê mobilizar até R$ 1 bilhão para mineradoras júnior e de médio porte, foi um passo importante. Embora não seja uma ação da B3, o superintendente a considera uma etapa preliminar à bolsa de valores, já que a empresa pode entrar no mercado de capitais no futuro mais preparada e com menos desafios.
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