Economia

CENÁRIOS | O Brasil e a OCDE no marco da atração de investimentos estrangeiros diretos

CENÁRIOS | O Brasil e a OCDE no marco da atração de investimentos estrangeiros diretos
Crédito: Charles Platiau/Reuters

O DIÁRIO DO COMÉRCIO vem publicando série de artigos quinzenais, voltados para a entrada do Brasil na OCDE e o impacto na atração de investimentos estrangeiros diretos. Os autores convidados são Marcos Mandacaru, assessor especial da Vice-Governadoria de Minas Gerais e especialista em atração de investimentos, e Juliano Alves Pinto, subsecretário de Desenvolvimento Econômico e diplomata de carreira.

PARTE III

Na edição anterior, descreveu-se o contexto no qual se construiu a posição brasileira em relação à OCDE enquanto líder dos países em desenvolvimento, marcada pelo distanciamento quando não certo antagonismo em relação ao organismo internacional, marcadamente capitalista e que congregava, sem exceção, países desenvolvidos, integrantes do então chamado Primeiro Mundo. A entrada do México na OCDE marcaria o início de uma nova fase, apenas suficientemente compreendida pela diplomacia brasileira ao fim da década passada.

Ainda que desde as últimas três décadas do século XX sucessivas crises econômicas vêm balançando as economias em escala global, não sendo diferente nem no Brasil nem na América Latina como um todo, é possível dizer que os fluxos internacionais de investimento, sobretudo com o advento de novas tecnologias e com a progressiva desregulamentação dos mercados, tornaram-se mais intensos. Fato é que os bons investimentos, aqueles duradouros, dentro da ótica da produção e não apenas sob perspectiva meramente financeira, passaram a buscar países nos quais houvesse mais transparência, mais governança, mais previsibilidade e mais credibilidade.

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A entrada de países latino-americanos na OCDE obedece à lógica de que para se aumentar o fluxo de investimentos é preciso empreender reformas econômicas estruturantes, que promovam melhoria significativa no ambiente de negócios. Não se trata de uma falsa compreensão da realidade típica das economias emergentes, em que o reconhecido potencial econômico, seja na produção de matérias primas seja na indústria de transformação convive com um ainda alto contingente da população vivendo em condições de pobreza, para o qual devem ser enfrentados os imensos desafios de natureza social, sobretudo em matéria de saúde e educação.

Muito embora não seja possível afirmar uma correlação direta entre a entrada na OCDE e os aumentos de fluxo de investimento, já que estes, muitas vezes, obedecem a múltiplos fatores, como no caso do México a entrada no Nafta em 1994, no caso do Chile o boom das commodities agrícolas a partir de 2008 e no da Colômbia na melhoria de sua imagem externa, a partir de exitosa política de combate ao narcotráfico e à atuação terrorista de grupos de guerrilha de esquerda. É, no entanto, constatável que uma agenda que privilegia a adoção de boas práticas tende a sinalizar para as economias mais dinâmicas que existe um ambiente mais favorável ao acolhimento de investimentos estrangeiros. É possível que os fatores externos mencionados, conjugados à agenda reformista promovida pela OCDE: (Ver gráfico)

A OCDE não mais se distingue por ser o clube dos países mais ricos, porém se trata reconhecidamente do grupo de países democráticos que adota e dissemina práticas modernas de governança, regulação, proteção à propriedade intelectual, transparência e integridade.

Existe, no entanto, o receio de que a adesão à OCDE pode representar o fechamento de portas a parceiros estratégicos de fora da organização. Sem contestar a legitimidade da assertiva, justamente aquela que caracterizou o posicionamento brasileiro até 2016, pode-se afirmar que o século XXI não mais reserva espaço ao terceiro-mundismo característico dos anos sessenta, setenta e oitenta. Em boa medida, a emergência da China enquanto aspirante a potência hegemônica e os maciços investimentos chineses na Ásia, na África e na própria América Latina, tornaram o cenário econômico mundial muito mais eclético e interdependente.

A entrada do Brasil na OCDE foi considerada tabu ao longo de décadas pelo Itamaraty, posição essa que passou a ser revertida somente a partir de 2016, quando houve, finalmente, sinalização do governo brasileiro favorável à acessão àquela organização. Até hoje, entretanto, não há como se afirmar que a entrada do País na OCDE representa, de fato, um ponto pacífico na diplomacia brasileira.

Ainda que o processo de acessão do Brasil à OCDE não se tenha concluído, há grande expectativa pela adoção de reformas importantes que permitam criar ambiente regulatório e de liberdade econômica compatível com as melhores práticas internacionais.

No tocante à agenda anticorrupção, é digno de nota o esforço recente do Governo de Minas Gerais, por meio da Controladoria Geral do Estado, em utilizar parâmetros da OCDE para a promoção da integridade, especialmente no que diz respeito à disseminação de valores, o estabelecimento de um canal seguro e anônimo de denúncias e na adoção de uma rigorosa cartilha de compliance. Não é para menos que Minas foi considerada em 2021 o estado mais transparente do Brasil, obtendo a nota máxima, juntamente com Ceará e Espírito Santo, na Escala Brasil Transparente, da Controladoria Geral da União (CGU).

Por seu turno, neste ano de 2021, a OCDE resolveu suspender o processo de adesão do Brasil ao organismo por conta tanto da ambivalência do País no combate ao desflorestamento quanto de um alegado relaxamento nas políticas de combate à corrupção, coincidente com as recentes decisões do STF em anular parte do processo da operação Lava Jato correspondente à condenação do ex-presidente Lula. A suspensão não significaria interrupção da acessão ao bloco, muito embora é possível que por alguns anos o Brasil ainda fique de fora da organização.

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