Cofeci regulamenta tokenização imobiliária: Setor vê avanço com regras
O Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci) editou a Resolução de número 1.551, criando um marco específico para transações imobiliárias digitais no Brasil. O ato foi publicado no DOU de 15 de agosto desse ano e entra em vigor 60 dias após a publicação.
A norma cria o Sistema de Transações Imobiliárias Digitais, define o Token Imobiliário Digital (TID) e estrutura a atuação de PITDs, que são Plataformas Imobiliárias para Transações Digitais, e ACGIs, os Agentes de Custódia e Garantia Imobiliária.
O que foi publicado, por que importa e o que muda na prática
Entre os objetivos, estão padronizar processos, reduzir riscos operacionais e dar previsibilidade jurídica a operações que já vinham ocorrendo com o uso de blockchain/DLT. Logo no início, a resolução delimita seu âmbito de aplicação.
Trata exclusivamente de intermediação imobiliária (Lei 6.530/1978) em ambiente digital, deixando claro que não alcança anúncios classificados, valores mobiliários (competência da CVM) e a prestação de serviços com ativos virtuais realizada por VASPs autorizadas pelo Banco Central.
A não ser quando esses serviços envolverem diretamente TIDs negociados em PITD credenciada pelo Cofeci. Essa separação ajuda a evitar confusões com o universo de criptoativos e com o mercado financeiro regulado. A resolução exige credenciamento e registro das PITDs no Sistema de Governança e Registro (SGR) do Cofeci-Creci.
Da mesma forma que as corretoras de criptomoedas, as plataformas precisam comprovar capacidade técnica, governança, políticas de segurança da informação e de PLD/FT, além de resiliência operacional e plano de continuidade de negócios.
Para quem já operava, há a possibilidade de credenciamento provisório em regime de sandbox, por 12 meses, mediante procedimento simplificado e sob supervisão, com obrigação de migrar ao credenciamento definitivo ao fim do prazo.
Para os ACGIs, a norma exige credenciamento e estabelece deveres fiduciários ligados à correspondência entre os direitos tokenizados e o imóvel subjacente, inclusive com segregação patrimonial e auditorias internas periódicas.
O ACGI pode deter a titularidade registral ou uma garantia real/fiduciária para assegurar os direitos representados, atuando em benefício dos titulares dos TIDs. O SGR, criado anteriormente pelo Cofeci, é o eixo de integração e registro que dá transparência às operações e gravames incidentes sobre TIDs.
Segurança jurídica, compliance e tecnologia
A resolução afasta expressamente sua aplicação a valores mobiliários (Lei 6.385/1976) e à prestação de serviços com ativos virtuais sob a Lei 14.478/2022, regulamentada pelo Decreto 11.563/2023 que atribuiu competência regulatória ao Banco Central para VASPs, mantendo a CVM no papel de supervisionar o mercado de capitais.
Em outras palavras, tokenização imobiliária em PITDs credenciadas é uma coisa, serviços com criptoativos e valores mobiliários digitais são outra. Sendo assim, operações com ativos virtuais são executadas em ambientes próprios, reguladas como prestadoras de serviços de ativos virtuais (VASPs).
Enquanto a Resolução 1.551 trata da intermediação imobiliária digital com TIDs. O texto abraça princípios de legalidade, segurança jurídica, transparência, proteção ao usuário, segregação patrimonial e PLD/FT, além de neutralidade tecnológica.
Na prática, isso se traduz em requisitos de KYC, governança de riscos, smart contracts auditáveis, registro e consulta de gravames e mecanismos de supervisão em cima de trilhas de auditoria.
O Cofeci também prevê integrações institucionais com Bacen, CVM, OAB, CFC, CNJ e outros conselhos quando a interoperabilidade agregar valor à fiscalização e à redução de assimetrias informacionais.
Prazos, sandbox e cronograma de adequação
A entrada em vigor simultânea em todo o país ocorre 60 dias após a publicação, configurando janela para que plataformas e custodiantes organizem documentação de credenciamento, políticas internas, infraestrutura e integração ao SGR.
O sandbox regulatório dá sobrevida operacional a quem comprovar atividade prévia, por até 12 meses, sob fiscalização do sistema Cofeci-Creci, com plano de adequação aos requisitos completos. Empresas que não migrarem ao registro definitivo no prazo terão o provisório cancelado.
A movimentação do Cofeci gerou reação do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB), que publicou Nota Técnica questionando a competência do conselho profissional para regulamentar a tokenização em aspectos que tangenciam o registro público.
O documento sugere excesso regulatório e possível conflito com a Lei de Registros Públicos, além de apontar riscos de inconsistência entre os registros em cartório e os registros em DLT. O debate é importante porque a comprovação de propriedade no Brasil, hoje, depende da matrícula no cartório de registro de imóveis.
A norma não altera a competência dos cartórios nem pretende substituir o registro público, mas organiza a intermediação em plataformas digitais, definindo papéis e responsabilidades com foco em transparência e governança.
A expectativa no mercado imobiliário é de ganho de eficiência na emissão e circulação de direitos representados por TIDs, com fracionamento de participações e automação por smart contracts.
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