Vale terá que continuar a pagar auxílio em Brumadinho

Na última sexta-feira (28), o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) determinou que a Vale mantenha o pagamento integral do Programa de Transferência de Renda (PTR) aos atingidos pelo rompimento da barragem em Brumadinho, até que suas condições de vida sejam plenamente restabelecidas a níveis pré-tragédia. A decisão deu um certo alívio para moradores e comerciantes da cidade, que já preocupavam com o futuro econômico após a extinção do programa, prevista para 2026.
A determinação da Justiça atende questionamento da Associação Brasileira dos Atingidos por Grandes Empreendimentos, a Associação Comunitária do Bairro Cidade Satélite e o Instituto Esperança Maria, que representam as vítimas e propuseram a ação questionando o fim do programa antes dos reparos serem totalmente concluídos. A alegação, conforme informações do TJMG, é de que as vítimas têm “direito à continuidade do Programa de Transferência de Renda e/ou à implementação de novo auxílio emergencial até a restauração dos modos de vida prévios ao desastre-crime”.
A empresária Regina Moraes, proprietária da ReModas, uma loja de moda presente na cidade há mais de 40 anos, conta que o sentimento de alívio, de fato, nunca chegou. Para ela, desde o rompimento da barragem, resiliência é uma palavra de ordem.
“Primeiro veio o crime que nos tirou não só vidas, mas clientes e amigos de décadas e décadas. Depois a cidade viveu um luto coletivo por mais de um ano em que festas e comemorações foram praticamente nulas. Depois, passamos pela pandemia, o endividamento da população, e agora, quando a gente esperava uma normalização, veio o corte do PTR”, comentou.
O último desafio citado por Regina Moraes refere-se a fase de transição, definida na época no edital do programa que sucedeu o auxílio emergencial, em que o pagamento seria reduzido gradativamente para que os atingidos não fossem pegos de surpresa com um corte abrupto do pagamento, como explicou o gerente de projetos, André Gonçalves, da Fundação Getúlio Vargas, instituição escolhida para gerenciar o PTR.
Entretanto, na opinião da empresária Regina Moraes “na época, a previsão era que a cidade e os moradores já estivessem bem financeiramente e se beneficiando da reconstrução, o que não é a nossa realidade”.
Decisão do TJMG dá prazo de cinco dias para FGV e Vale se manifestarem
Conforme informações do Tribunal de Justiça, na época da tragédia, foi estabelecido o Pagamento Emergencial (PE), que era gerido e efetivado pela Vale. Porém, em fevereiro de 2021, foi celebrado o Acordo Judicial para Reparação Integral, com a destinação de R$ 4,4 bilhões para o Programa de Transferência de Renda (PTR), substituindo o PE.
Em setembro do mesmo ano, o juízo homologou termo de colaboração e a FGV passou a gerenciar o PTR, cujos pagamentos se iniciaram em novembro daquele ano. Nesse mesmo mês, a FGV anunciou a redução dos valores, como previsto, para a partir de março deste ano.
Agora, com a decisão do juiz Murilo Sílvio de Abreu, da 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte, a FGV, no prazo de cinco dias, deverá apresentar a quantia necessária para que os beneficiários continuem recebendo o mesmo valor pago antes da redução ocorrida em março deste ano, considerando o termo final previsto para o encerramento do programa.
Além disso, a Vale foi intimada a realizar um novo depósito judicial correspondente a 1/3 do valor indicado pela FGV, também no prazo de cinco dias.
Quanto à decisão, o gerente de projetos da FGV, André Gonçalves, comentou que a entidade ainda não foi notificada. “A FGV não tem poder decisório, a gente cumpre ordens judiciais. Assim que formos notificados, iremos cumprir o que determinou o juiz”, afirmou.
Procurada pela reportagem, em nota, a Vale comentou que em outubro de 2021, a empresa realizou o depósito de R$ 4,4 bilhões previstos no Acordo Judicial de Reparação Integral, firmado em 2021, em que caberia a ela a “obrigação de pagar” o valor estabelecido como solução definitiva para o pagamento emergencial. Dessa forma, a empresa entende que com o depósito realizado, foi encerrada a obrigação da Vale referente ao tema.
Comércio de Brumadinho aposta na retomada do pagamento integral da Vale para não sofrer ainda mais
Nesta terça-feira (1º), data do pagamento da transferência de renda, a empresária Regina Moraes contou que diversos clientes reclamaram que o benefício teria sido pago com os valores menores, como previsto. Entretanto, a decisão do TJMG acendeu uma pequena luz de esperança entre os moradores e empresários, que mesmo sabendo que a decisão cabe recurso, acreditam que ela seja cumprida.
“As pessoas estão reclamando que o depósito veio pela metade. Mas, eu espero que a decisão seja realmente cumprida e que a cidade retome uma economia mais saudável”, diz Regina Moraes.
A empresária do setor da moda relata ainda que desde a tragédia, a cidade passou a ter um custo de vida muito alto que endividou os moradores. “Muitos trabalhadores vieram para cá, em função das obras de reparação, então, tudo ficou muito caro e os moradores foram os mais prejudicados, pois tudo inflacionou. Aluguel que era R$ 500, passou a custar R$ 1 mil, R$ 1,5 mil porque eram pagos pelas empresas aos trabalhadores. Não dá para cortar o auxílio que já foi incorporado no rendimento deles”, detalhou.
Outra impactada foi a empresária Regina Ottoni, da loja de presentes Encantar. Ela espera que a retomada do pagamento integral surta um efeito positivo no comércio. “A gente espera que dê uma animada no pessoal, eles já estavam muito preocupados com o corte e o fim do auxílio. Muitos comentam que os valores mal dão conta do básico, que tudo já está muito caro”, disse.
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