Economia

Gerdau deve anunciar aportes na mineração em Minas Gerais

Minas responde por cerca de 70% da produção total de aço e gera 11 mil empregos diretos dos cerca de 17 mil postos de trabalho da empresa no Brasil | Crédio: Gerdau/Divulgação
O novo pacote de investimentos será aplicado especificamente em ações de sustentabilidade e será anunciado nos próximos meses.

“Brasileira de nascimento. Mineira de coração”, diz um dos slogans da Gerdau. Siderúrgica fundada há mais de 120 anos no Rio Grande do Sul, chegou a Minas Gerais no final dos anos de 1980 e, desde então, tem cada vez mais apostado no protagonismo do Estado para sua história, operações e ações nos campos social, cultural, esportivo e de sustentabilidade.

Atualmente, Minas responde por cerca de 70% da produção total e gera 11 mil empregos diretos dos cerca de 17 mil empregos diretos da empresa no Brasil. Assim, não por acaso, o Estado também tem sido destino certo de investimentos bilionários da companhia nos últimos anos. O último deles, anunciado em maio, prevê R$ 5 bilhões a serem aplicados na modernização e ampliação das unidades mineiras, no aumento do maciço florestal e na geração de energia limpa, principalmente a eólica e a solar.

E novos aportes vêm por aí. Dessa vez, na área de mineração. O novo pacote de investimentos será aplicado especificamente em ações de sustentabilidade e será anunciado nos próximos meses. Tamanha importância poderia, quem sabe, levar Minas, no futuro, a abrigar a sede da empresa, como ocorre hoje com São Paulo.

As informações e declarações são do CEO da Gerdau, Gustavo Werneck, que, nesta entrevista exclusiva ao DIÁRIO DO COMÉRCIO, falou sobre a atuação da empresa não apenas sob o ponto de vista operacional, mas também nas áreas social e de meio ambiente.

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Na conversa, Werneck, que também é mineiro, falou ainda sobre tendências macroeconômicas mundiais, mercado doméstico, taxa de juros, construção civil, investimentos em infraestrutura, novas tecnologias, consumo de aço per capita, reindustrialização do País e descarbonização.

“A Gerdau só chegou até aqui porque sempre equilibrou a geração de resultados econômicos e financeiros com a devolução para a sociedade daquilo que ela vem nos emprestando ao longo dos anos. Isso deveria ser o papel de todo empresário e de toda empresa no mundo”, frisou.

A empresa tem feito investimentos robustos em Minas Gerais nos últimos anos. Qual o objetivo?

Pela própria característica do minério e do aço, Minas Gerais se tornou um grande ímã para a Gerdau ao longo do tempo e hoje a gente é, de fato, uma empresa mineira de coração. A Gerdau nasceu no Rio Grande do Sul e era natural que ao longo do tempo fixasse novas raízes em Minas Gerais. Hoje a sede está em São Paulo e quem sabe, no futuro, também não haverá uma sede em Minas? A companhia é mineira de coração e vai estar cada vez mais presente no Estado. Temos feito investimentos muito significativos em nossas operações e estamos planejando, agora, um novo ciclo muito intenso de aportes, dessa vez, na mineração. Mas quando a gente fala ‘mineira de coração’ amplia a possibilidade de querer estar no Estado não somente para gerar resultados financeiros. Queremos uma presença que transcenda a geração de resultados econômicos. E o coração traz o envolvimento emocional e a vontade de contribuir para a sociedade no que diz respeito às grandes dificuldades do Brasil, seja na formação de cidadania, na educação, no empreendedorismo ou na melhoria do dia a dia das pessoas. A presença em Minas, dentro do slogan de ‘moldar o futuro’ está ligada a moldar Minas Gerais em vistas de uma economia, uma sociedade e uma vida cada vez melhor para todos os mineiros e mineiras.

Os investimentos fora da linha operacional estão relacionados com esse objetivo?

Estão alinhados para a contribuição que queremos dar para uma sociedade cada vez melhor. Nossa experiência de muitos anos nos Estados Unidos, por exemplo, nos mostrou que o esporte é uma grande fonte de melhoria da sociedade. Imaginem quantas crianças em Minas Gerais crescem sem uma formação adequada e o esporte tem se tornado um grande meio para a formação desses cidadãos e cidadãs. Os patrocínios que temos feito no vôlei do Minas ou nos clubes de futebol incluem centenas de iniciativas relacionados à categoria de base, ao apoio às crianças que muitas vezes vêm do interior e não recebem um apoio do adequado para educação ou saúde. Por isso, para nós, mais do que estampar nossa marca nas camisas, está a alegria de no futuro ver grandes atletas contribuindo com a melhoria de tudo o que ainda precisa ser feito no Brasil.

E dentro do core-business, as cifras bilionários anunciadas para a usina em Ouro Branco visam à modernização da planta?

Quando adquirimos a usina de Ouro Branco, há muitos anos, ela era um ativo muito focado na produção de semiacabados, produtos voltados para a exportação. A gente tem feito uma transformação intensa na unidade voltada para a produção de produtos finais para os consumidores internos. Estamos investindo numa segunda ampliação da produção de bobinas a quente, que atende os setores de máquinas e equipamentos, óleo e gás e construção. Mas também visa uma modernização, já que a planta está chegando ao final de um ciclo de sua existência. São investimentos que visam transformar a usina em uma das produtoras de aço mais modernas do mundo, reduzindo a missão de CO₂, buscando cada vez mais alternativas que tornem a planta sustentável. Um pacote de investimento muito significativo que começou ano passado e vai se estender pelos próximos anos.

Como está a demanda no mercado doméstico? Há tendência de melhora?

O mercado doméstico no Brasil é muito poderoso. Exemplo disso é o próprio consumo de aço por habitante, um indicador importante e medido, inclusive, pelo Fórum Econômico Mundial, porque o consumo de aço mede a riqueza de um país. E no Brasil, o consumo de aço não tem evoluído nos últimos 20 anos. Está, em média, em 100 kg por habitante por ano. A Coreia do Sul, por exemplo, chega até 900 kg. Ou seja, há uma diferença de patamar de geração de riqueza e de melhoria da qualidade de vida. O consumo no Brasil pode ampliar nos próximos anos e, em ele ampliando, vai haver uma melhoria no dia a dia das pessoas. Vemos de forma muito otimista e não ficamos presos no que acontece num determinado mês ou trimestre, nossa visão é de longo prazo e olhando o Brasil no longo prazo, vemos as possibilidades que o País tem. Depois de 122 anos, a gente aprendeu a olhar para frente. Parar de se queixar das coisas e criar, de fato, soluções para que a gente possa melhorar o País.

Onde estão essas potencialidades de consumo de aço?

Na habitação existem possibilidades quase infinitas, assim como na construção não residencial. A construção metálica consegue ser mais rápida e gerar muito menos impacto ambiental. Nos países mais desenvolvidos as construções metálicas permitiram a geração de riqueza ao longo do tempo. Por isso, a Gerdau tem investido em novos negócios, por meio da Gerdau Next. No Brasil, temos a Brasil ao Cubo, uma empresa de construção metálica que faz boa parte das suas atividades num galpão industrial e depois transfere essa construção praticamente pronta para ser montada em qualquer local. Durante a pandemia usamos esse modelo de negócio para construir hospitais em 100 dias – um recorde de construção no Brasil. Hospitais que depois viraram legado para a sociedade, sendo integrados à rede pública de saúde e hoje são utilizados pela população.

A retomada do “Minha Casa, Minha Vida” pode impulsionar ainda mais esse consumo?

É só questão de tempo. Esses programas são fundamentais não apenas para o consumo de aço em si, mas também para criar condições para resolver problemas importantes que o Brasil tem, como a própria habitação. Mas a Gerdau também tem suas próprias iniciativas. Queremos ser protagonistas na busca por soluções. A Gerdau só chegou até aqui porque sempre equilibrou bem a geração de resultados econômicos e financeiros com a devolução para a sociedade daquilo que ela vem nos emprestado. Isso deveria ser o papel de todo empresário e de toda empresa no mundo.

O programa Pró-trilhos prevê investimentos bilionários em ferrovias no Brasil. A Gerdau pode voltar a avaliar a produção de trilhos no País, como ocorreu em 2011?

Essa produção de trilhos no Brasil vem de muitos e muitos anos e bate com muitas outras do ponto de vista do planejamento de longo prazo e dos investimentos em infraestrutura que serão feitos no País. O governo não vai ter condição de resolver sozinho todos esses problemas e entendemos que as parcerias com a iniciativa são uma solução importante. O Brasil tem tido dificuldade de reinvestir a depreciação da sua infraestrutura, não só a ferroviária, mas também a rodoviária e é imprescindível que ações sejam tomadas. Nos Estados Unidos temos observado uma demanda adicional de aço, emprego e renda, devido a um grande pacote do governo federal para investir em infraestrutura. Essas parcerias são imprescindíveis para solucionar problemas como esses também no Brasil. E, à medida que sentirmos confiança e vermos como esses investimentos serão transformados em realidade, certamente, estaremos presentes analisando todas as possibilidades para contribuir. A produção de trilhos certamente vai ser um debate que vai voltar para a mesa no futuro.

É impossível falar de Gerdau, de Minas e não falar de mineração. Quais são os planos da empresa para o setor? Temos novos ativos no radar?

A mineração é muito importante para a Gerdau em vários aspectos. Em primeiro lugar, ela nos ajuda a trazer competitividade para nossa operação na totalidade. Fazemos investimentos contínuos para que ela possa suprir as necessidades internas de minério, mas a Gerdau não quer se tornar um futuro produtor de minério para vender ou exportar. Queremos produzir para nosso consumo próprio. Mas também, a mineração é uma grande fonte de geração de riqueza e de renda. De toda forma, para nós, a mineração só faz sentido, se conseguirmos, de fato, ter uma atividade sustentável e responsável. Desde fevereiro não utilizamos mais barragem de disposição de rejeitos e todo o processamento passou a ser feito através do empilhamento a seco. Além disso, vamos anunciar ao longo dos próximos trimestres, novos investimentos para a área, que vão estar relacionados a uma mineração sustentável. Vamos mostrar para o mundo que a mineração em Minas e a nossa, principalmente, podem ser feitas absolutamente alinhadas aos conceitos mais modernos de sustentabilidade.

Como estão as operações de grafeno? Novas soluções serão lançadas neste ano?

O grafeno é, sem dúvida, um dos materiais mais poderosos que a humanidade descobriu e desenvolveu ao longo dos últimos anos. Mas ele não é um produto que vai existir sozinho, ele vai coexistir com outros já existentes e o aço é um deles. Nossos investimentos na área visam encontrar aplicações para podermos entregar produtos cada vez mais sustentáveis, leves e resistentes aos nossos clientes. Um exemplo prático é uma linha de tintas, feita através da Gerdau Next. São tintas que ao serem aplicadas em estruturas de aço, permitem que essas estruturas tenham maior durabilidade e maior resistência à oxidação. São novas possibilidades, mas um exercício de longo prazo que, provavelmente daqui a 100 anos, terá se tornado realidade.

Como avalia, hoje, o cenário econômico internacional?

Existem megatendências que estão ficando absolutamente claras. Uma delas é a desglobalização. Tudo aquilo que a gente viu no passado, de busca de cadeias globais mais competitivas em países que tinham condições ou custos mais baratos, está indo no caminho contrário. Depois do conflito entre a Ucrânia e a Rússia e a própria Covid, surgiu a necessidade de os países buscarem novamente a interiorização de suas capacidades produtivas. O que se chama no mercado de reshoring ou nearshoring está acontecendo fortemente. Na nossa operação nos Estados Unidos, estamos vendendo mais aço para a construção de fábricas de semicondutores locais. Megatendências como essa indicam que temos que reconfigurar a empresa todos os dias para que ela esteja pronta para atender as necessidades. Outra diz respeito à sustentabilidade. A menor emissão de CO₂ vai, de certa forma, no futuro, contribuir muito para os nossos negócios. São movimentos positivos.

E o nacional, considerando o contexto de juros elevados e ambiente político?

Sem dúvida o País precisa voltar, em algum momento, a ter juros mais baixos. Vimos o quanto de riqueza, investimentos e possibilidade de consumo foi gerado quando o Brasil conseguiu viver num ciclo de juros baixos e é inevitável que o País volte, num futuro mais breve possível, a ter uma economia de juros baixos. É imprescindível e questão de tempo. Mas para nós a grande possibilidade e o grande desejo é que o País possa novamente voltar a enxergar a indústria nacional como uma grande geradora de riqueza. A indústria tem reduzido sua participação no PIB ao longo do tempo. Em 20 anos, o PIB brasileiro da indústria saiu de mais de 20% para baixo de 10%. Um país da nossa característica não tem possibilidade de um futuro melhor se a indústria não for muito poderosa. É claro que as reformas de curto prazo, como a tributária, vão nos ajudar a melhorar o ambiente de negócios, mas a retomada da indústria brasileira é fundamental para a evolução que o País precisa.

O que a própria indústria pode fazer para contribuir para a retomada desse protagonismo?

Isso é uma mudança de imagem, deveríamos trabalhar mais para mostrar para as pessoas que a indústria brasileira é muito competitiva. Na Gerdau, essa questão de competitividade e de performance é olhada com muito carinho, porque faz muita diferença. A gente só chegou aos 122 anos porque sempre cuidou muito bem da performance operacional. Medimos e comparamos nossos indicadores e vemos que dentro dos nossos muros somos muito competitivos. Não ficamos devendo nada para ninguém. Existe uma imagem de que a indústria do aço é ultrapassada, que não investe ou que polui. Mas ao entrar hoje numa planta da Gerdau, nem se sabe que está produzindo aço ali dentro, tamanha organização e limpeza. A questão é que fora dos porões da usina existe um ambiente de baixa competitividade e de aumento de custo. E aí fica muito difícil competir.

Quais são as frentes de atuação da Gerdau tendo em vista a descarbonização?

Esta é uma preocupação muito relevante para a indústria do aço e a Gerdau é referência no mundo em termos de baixa missão de CO₂. Temos um modelo de negócio baseado na economia circular, por meio da reciclagem de sucata, que faz com que nossa emissão seja inferior à média mundial. Esse modelo de negócio foi criado há muitos anos e ter essa posição competitiva é muito relevante também para nossos clientes. Mas temos que encontrar alternativas em vistas de descarbonizar ainda mais o setor e à medida que as tecnologias forem aparecendo, vamos poder, de fato, ser uma indústria carbono neutro. Este é mais um exercício de longo prazo, não existem tecnologias disponíveis no momento, mas temos planos muito consistentes de seguirmos dando nossas contribuições à descarbonização.

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