Haddad terá desafios na pasta da Fazenda

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nomeou Fernando Haddad para comandar o Ministério da Fazenda. O anúncio foi feito na última sexta-feira (9). O ex-prefeito da cidade de São Paulo (2013-2017) e ex-ministro da Educação durante as gestões de Lula e Dilma Rousseff (2005-2012), é considerado um dos grandes aliados do petista e chegou a ser cotado para assumir outras pastas durante o processo de transição de governo.
Velho conhecido da população, Haddad é bacharel em Direito, mestre em Economia e doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo (USP). Também é especialista em Direito Civil e Economia Política. Em 2018, ele foi o candidato do PT na disputa presidencial, no entanto, foi derrotado por Jair Bolsonaro (na época, PSL, atualmente, PL). Na eleição deste ano, o professor de ciência política disputou o governo paulista, mas quem venceu foi Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Para a nova função, o político de 59 anos terá vários desafios. Especialistas ouvidos pelo DIÁRIO DO COMÉRCIO citam, por exemplo, a desconfiança do mercado, a possível falta de autonomia na condução da pasta e a polêmica do controle fiscal.
“Ele foi no passado muito infeliz em alguns comentários sobre a sua própria formação e seu próprio conhecimento em economia. É como se diz: ‘quem fala muito, dá bom dia a cavalo’. É preciso ter muito cuidado em relação a esse tipo de coisa, porque em algum momento ele poderia assumir algum cargo desse tipo, exatamente como vai assumir. Mas, deixando isso de lado, a função dele também é política. Então, ele pode se cercar de pessoas com conhecimento necessário para caminhar corretamente. No entanto, tenho dúvidas de qual será a qualidade de quem estará ao seu lado na equipe”, disse o coordenador do curso de Ciências Econômicas do Ibmec BH, Ari Francisco Araújo Júnior.
Segundo Araújo, Fernando Haddad também não tem tanta capacidade de diálogo e de interação com deputados de outros partidos, outro fator que pode afetar a condução do ministério. Além disso, ele analisa que o petista deve ter um poder de atuação menor que o do atual ministro da Economia e isso porque a pasta será desmembrada. Ainda segundo ele, Paulo Guedes tinha um forte controle relativo a diversas áreas e uma maior facilidade para elaborar políticas econômicas, o que tende a ser diferente no próximo governo.
O coordenador também salienta que como a política petista está associada a um nível mais macro, a capacidade dele afetar regiões específicas e locais, como Minas Gerais, também deve ser mais restrita. Apesar desse tipo de pauta ser importante, ele ressalta que a maior preocupação precisa ser a política fiscal do País.
“Mais do que atender a políticas locais, a preocupação que eles não terão, mas é a que deveria se ter, é a questão da política fiscal. O sinal da aprovação disso é a PEC Fura Teto (PEC da Transição). Então, a preocupação não é com a política fiscal. Esse governo quer gastar mais e, provavelmente, isso vai impactar de alguma forma, por exemplo, a inflação e a taxa de juros”, ressaltou.
O professor de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Mauro Sayar prefere aguardar a pré-julgar a indicação do novo ministro. Segundo ele, apesar de ter contato natural com pessoas mais ligadas ao perfil petista de, historicamente, ter menos ortodoxia no trato com as finanças, Fernando Haddad vem conversando com pessoas que veem a economia de outra forma. “Embora tenha esse viés do partido em relação ao controle fiscal, prefiro dar um voto de confiança”, disse.
Sayar destaca também que a proposta do gasto fora do teto de cerca de R$ 200 bilhões sem a devida sinalização de uma fonte de receita, elevará o déficit primário para o ano que vem e isso ampliará a dívida pública brasileira, uma das mais elevadas dentre os países emergentes. Segundo ele, este crescimento impacta na vida das pessoas mais pobres e até mesmo afasta investimentos, opondo-se assim aos objetivos do governo.
“Se a sinalização for concretizada, o governo terá que arrumar uma receita adicional para que o déficit público não cresça nessa magnitude. Então, temos que aguardar para ver quais serão as regras fiscais. Embora eu fique com um ‘pé atrás’, prefiro aguardar um pouco para saber qual será a política, confiando que o ministro tem capacidade para entender que não se gera crescimento de forma contínua com gasto público, como algumas pessoas do próprio PT acreditam. Isso não existe. Se existisse, não haveria país pobre no mundo, não haveria problema de dívida pública, pois, segundo essa lógica, o gasto seria autofinanciável, elevaria o PIB e a expansão do PIB geraria um acréscimo de receita que mais que compensaria os gastos iniciais”, afirmou.
“Infelizmente, não tem atalho para o desenvolvimento e para o crescimento. Sabemos que algumas coisas não dão certo, como indisciplina fiscal, que gera consequências bastante adversas. Espero que ele reconheça as limitações da forma de pensar dos seus pares de partidos”, completou.
Ainda segundo o professor, o desafio de Fernando Haddad não será apenas o de promover uma política que controle a dívida pública, mas também como alocar os recursos públicos.
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