Indústria mineira avança em outubro, mas perde fôlego no acumulado do ano
A indústria de Minas Gerais registrou avanço no faturamento e nas horas trabalhadas em outubro, segundo levantamento divulgado nesta quarta-feira (3) pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg). Apesar do resultado positivo no mês, o indicativo é de desaceleração no acumulado de 2025, influenciada por juros elevados, demanda interna enfraquecida, restrições fiscais e ambiente internacional desfavorável.
Segundo os dados da Fiemg, o aumento foi de 2,3% no faturamento de outubro frente a setembro e houve crescimento de 1,3% nas horas trabalhadas, em um movimento associado ao ciclo de produção para abastecimento da Black Friday e das festas de fim de ano.
Para o analista de Pesquisas Econômicas da Fiemg, Arthur Augusto Dias de Oliveira, o desempenho mensal está ligado ao calendário. Ele afirma que a produção costuma acelerar nesse período para atender aos pedidos do varejo. “Esse desempenho de outubro está muito relacionado à demanda do fim de ano e da Black Friday. A indústria produz para abastecer o comércio e isso sustenta algumas altas até dezembro”, afirma.
Apesar do impulso sazonal, o estudo mostra que o setor perdeu tração ao longo de 2025. O acumulado dos últimos 12 meses registra alta de 1,9% no faturamento e 1,2% nas horas trabalhadas, índices inferiores aos observados no fim de 2024.
Conforme Oliveira, o movimento reflete o impacto da política monetária, com juros que são os maiores desde 2006. “Quando os juros estão altos, as famílias repensam o consumo e o empresário avalia se o investimento produtivo se paga, já que aplicações financeiras passam a render mais”, explica.
A economista Diana Chaib, doutora pelo Cedeplar/UFMG, observa que outubro combina “fatores sazonais e inércia de pedidos”, mas o ritmo do ano mostra perda de fôlego. “O acumulado em 12 meses indica uma desaceleração mais forte ao longo de 2025, em um ambiente de política monetária contracionista, pouco espaço fiscal e cenário externo mais difícil”, observa.
O consultor e conselheiro econômico Stefan D’Amato reforça que o ciclo atual tem menor impulso da demanda interna. Ele afirma que a economia avançou nos últimos meses associada ao ciclo sazonal de fim de ano, com maior volume de pedidos e algum avanço do emprego formal, mas destaca que 2025 perdeu dinamismo em relação a 2024 devido à renda comprimida, crédito caro e ambiente externo adverso.
Mercado de trabalho pressiona demanda interna
A combinação de alta no emprego e recuo no rendimento médio aponta para contratações com salários menores e redução de adicionais. Para Diana Chaib, esse padrão limita o potencial de consumo. “Em termos macroeconômicos, isso é preocupante porque a indústria depende muito da demanda interna. Uma renda média em queda tende a limitar o consumo de bens duráveis e semiduráveis. Então, a curto prazo, as empresas ganham alguma folga de custo, mas a médio prazo isso pode virar um freio adicional para a atividade porque as famílias têm menos capacidade de sustentar o consumo”, avalia.
O economista Stefan D’Amato complementa que a perda de renda reduz a capacidade de reação da demanda interna e torna o crescimento mais dependente de fatores sazonais que de fundamentos estruturais.
Juros altos, contas públicas e cenário externo
A política monetária segue como elemento central associado ao desempenho da indústria. Arthur Oliveira avalia que sinais de maior equilíbrio fiscal poderiam abrir espaço para cortes mais rápidos. “Se observássemos preocupação com a sustentabilidade das contas públicas, talvez o Banco Central pudesse reduzir essa taxa de juros mais rapidamente. Reduzindo a taxa, a economia ganha fôlego e poderíamos ter retomada na indústria”, comenta.
Outro aspecto que aparece como fator adicional de incerteza é o quadro fiscal. Segundo o analista da Fiemg, programas de estímulo como Bolsa Família e Auxílio Gás, além de iniciativas para construção civil, impulsionam a economia no curto prazo, mas aumentam a preocupação do mercado com a dívida pública. Isso pressiona o custo de financiamento do governo e mantém os juros altos.
No cenário internacional, a sobretaxa de 40% imposta pelos Estados Unidos a produtos brasileiros segue afetando setores industriais do Estado. Arthur Oliveira destaca que os avanços recentes nas negociações envolveram café e outros produtos agrícolas, mas não alcançaram a maioria dos bens industriais. Assim, a redução das exportações para o mercado norte-americano tem limitado a produção de empresas mineiras.
Perspectivas para 2026
Os três especialistas concordam que o resultado de outubro funciona como um “respiro” sazonal e não como sinal claro de reversão. Diana Chaib observa que “é mais um alívio pontual do que uma virada consolidada”, enquanto D’Amato avalia que, mantido o cenário de juros elevados e espaço fiscal restrito, a tendência inicial de 2026 é de continuidade da desaceleração.
O futuro da atividade industrial dependerá de medidas estruturais. Diana Chaib destaca a necessidade de política industrial focada em inovação, adensamento de cadeias produtivas, crédito direcionado e uso das compras públicas. Stefan D’Amato aponta para investimentos em modernização, transição energética, logística e redução de custos regulatórios.
Arthur Oliveira reforça que a redução gradual dos juros permanece como condição necessária, mas não suficiente, para uma retomada consistente. Ele afirma que o cenário exige “cautela dos empresários e revisão de decisões de investimento”, dado o enfraquecimento da demanda.
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