Inflação: Armínio Fraga endossa a troca de alimentos mais caros

Rio de Janeiro – O economista e ex-presidente do Banco Central (BC), Armínio Fraga, disse nesta segunda-feira (17) que o presidente da República, Luiz Inácio da Silva, tinha razão ao dizer para a população não comprar alimentos mais caros e buscar substituí-los por outros mais baratos. Segundo Armínio, é assim que o mercado funciona e a inflação dos alimentos flutua de acordo com os preços internacionais, com a taxa de câmbio e fatores climáticos.
“É difícil mesmo”, disse Fraga a jornalistas antes de uma aula magna no ImpaTech, o curso de graduação do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa). “O presidente Lula apanhou quando falou então não come, procura outro alimento. Mas ele tem razão. O preço dos alimentos varia. Ele não está sendo muito feliz em algumas declarações, mas isso que ele falou está correto. É assim que o mercado funciona. Em tudo, e em alimentos também”, disse Armínio.
Segundo ele, a inflação dos alimentos é parte do mundo da inflação e sua contenção não tem milagre. Questionado se as medidas de redução de imposto de importação sobre alimentos poderiam ajudar, Armínio disse que, de forma geral, não gosta de medidas pontuais porque dão a impressão de que podem resolver um problema no médio prazo, quando isso não é tão preciso. Mas se disse também a favor de uma revisão mais ampla das alíquotas de importação do País.
“Há muitos anos eu sou a favor de uma revisão geral das nossas alíquotas de importação. O Brasil já passou por momentos de abertura, e o certo mesmo seria uma revisão geral das tarifas de importação, que exibem uma variância muito grande, inexplicável para a grande maioria dos setores, por fatores econômicos ou mesmo sociais”, disse.
Armínio fez referência à fala de Lula a rádios da Bahia no início de fevereiro. Na ocasião Lula disse que “uma das coisas mais importantes para que a gente possa controlar o preço é o próprio povo”. “Se você vai no supermercado aí em Salvador e você desconfia que tal produto tá caro, não compra. Ora, se todo mundo tiver essa consciência e não comprar aquilo que acha que está caro, quem está vendendo vai ter que baixar (o preço) pra vender, porque se não vai estragar”, acrescentou Lula.
“Entorno mais difícil”
Armínio Fraga disse que o presidente Lula não está conseguindo repetir o desempenho de seus dois primeiros mandatos e que, para isso, têm pesado um “entorno mais difícil”, em menção ao Congresso Nacional, e a falta de ideias.
“Sou um admirador da história do presidente Lula, mas ele não está repetindo o desempenho que teve nas presidências anteriores, inclusive porque o entorno é mais difícil, não tem o controle do Congresso, e também porque a falta de ideias me parece bem preocupante”, disse.
“No Brasil há taxas de juros que, sem fazer nada, você ganha 15% Com a inflação a 5%, está ganhando 10%. Há um problema sério. Os sintomas do paciente Brasil, na parte financeira, são extremamente graves, e nos sintomas de crescimento, não conseguiu dar uma arrancada, algo que já vem de longa data. Não estou muito confortável”, completou o economista em resposta a perguntas dos alunos.
Antes, durante a palestra, Armínio fez uma apresentação com o objetivo de responder porque o Brasil não aprende com erros do passado para um crescimento sustentado.
Ele disse que em 2016, já sob Michel Temer, foi a última vez que o governo brasileiro acertou com reformas como a da Previdência, e marcos legais como o do saneamento e a Lei das Estatais. “De lá para cá (governos Bolsonaro e Lula), acho que a gente se perdeu na economia”, disse.
“Não vejo uma visão, uma estratégia de desenvolvimento. É preciso ter prioridade e qualidade no gasto público, e aí a coisa pode andar. Falta uma estratégia, uma reforma do estado pra valer”, disse, ao fazer uma diferenciação para o que Donald Trump está fazendo nos Estados Unidos, o que definiu como “desmantelamento do Estado”, assinalou. “A gente não precisa disso (desmantelamento à moda Trump) de jeito nenhum. Nosso Estado é de tamanho médio e está de bom tamanho para nós. Mas poderia estar melhor. Não é para diminuir, mas para melhorar”, comentou.
Armínio Fraga lembrou que, hoje, os chamados gastos tributários, “basicamente subsídios”, são sete pontos do PIB, e que a previdência tem um buraco enorme, motivo pelo qual terá de passar “inevitavelmente” por outra reforma.
“Hoje nós temos uma situação fiscal, financeira, do governo muito frágil, que pressiona as taxas de juros, as maiores do planeta, e isso não é maldade do Banco Central”, ressaltou.
Reportagem distribuída pela Estadão Conteúdo
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