Economia

Mercado teme que Confins não seja prioridade para CCR

Possível saída de sócia da BH Airport do negócio já no próximo mês é alvo de especulações no mercado
Mercado teme que Confins não seja prioridade para CCR
O Aeroporto Internacional de Belo Horizonte enfrenta percalços para atingir o sonhado “céu de brigadeiro” | Crédito: Divulgação/BH Airport

Inaugurado em 1984, o hoje robusto e conhecido Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, localizado em Confins, na região metropolitana, por muitos anos foi considerado um elefante branco.

A distância da área urbana da capital mineira e as poucas opções de voos e serviços culminaram com essa classificação, deixada para trás na medida em que os investimentos públicos e privados foram dando corpo à estrutura que hoje permite com que o terminal ocupe o segundo lugar em número de destinos entre os aeroportos do Brasil. 

Mas, engana-se quem acredita que os desafios foram todos transpostos. Idealizado como importante hub logístico nacional e internacional no início dos anos 2000, o ativo, de fato, caminha para o posto, entretanto, há novos obstáculos antes de se alcançar o tão almejado céu de brigadeiro, como se diria na aviação, para definir um cenário ideal de operação para o terminal.

Já é consenso entre especialistas e lideranças do Estado que Minas Gerais precisa cada vez mais da chamada nova economia para manter sua pujança econômica e diminuir a dependência das atividades primárias. Alguns vão além: para que esses novos setores alcancem o peso necessário no desenvolvimento, faz-se necessário uma logística avançada que passa pela consolidação do aeroporto como um hub internacional.

“A consolidação deste hub por sua vez, depende de outros avanços, como o aprimoramento do acesso ao terminal, a continuidade de políticas públicas favoráveis à pujança do aeroporto e seu entorno e investimentos constantes no ativo”, defende Luiz Antônio Athayde, responsável por propagar o conceito de aerotrópole pelo Estado, ainda no início dos anos 2000.

Mercado se preocupa com interesse da CCR por Confins

Neste sentido, desde que conquistou a operação de outros 15 aeroportos na 6ª Rodada de Concessões Aeroportuárias do Governo Federal, em leilão realizado em 2021, a CCR Aeroportos, uma das sócias da BH Airport, concessionária que administra o Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, junto da Zürich Airport e a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), tem despertado a preocupação do mercado no que se refere à continuidade dos esforços e investimentos no principal equipamento aeroportuário de Minas Gerais. 

Especula-se, inclusive, uma possível saída da empresa do negócio, cuja decisão poderá ser oficializada já no próximo mês.

Diferentes fontes ouvidas pela reportagem, questionam até que ponto a empresa estaria disposta a seguir empenhando recursos e desenvolvendo estratégias para um aeroporto cujos ganhos são divididos com os demais operadores, enquanto nos demais aeroportos sob sua gestão, tanto as decisões quanto as receitas são exclusivas.

“A CCR precisa priorizar o Aeroporto de Belo Horizonte até mesmo por seu potencial. Mas uma questão de negócio e rentabilidade pode implicar nas decisões da empresa em vista de viabilizar as operações dos outros terminais. O projeto de hub internacional do Aeroporto de Belo Horizonte foi desenvolvido diante suas competitividades e vantagens comparativas aos demais aeroportos do Brasil, desde a plataforma de infraestrutura, passando pela logística até a própria localização. Mas é preciso investir e avançar em todas essas frentes”, argumenta um especialista.

Outro agente de mercado diz que as lideranças políticas do Estado precisam trabalhar na defesa junto à concessionária para não deixar perder o caráter de priorização do ativo. “Estamos falando da segunda economia do País e enquanto nosso aeroporto não se fortalece, São Paulo ganha cada vez mais espaço. Os centros de decisões já estão lá, mas a CCR que é uma das principais interessadas não é acionista nem de Guarulhos nem de Viracopos, o que conta a nosso favor. Mas uma quebra da malha já seria suficiente para arruinar esses planos”, afirma.

Aeroporto em Confins foi idealizado para ser um hub logístico nacional e internacional | Crédito: Rodrigo Lima/Nitro

CCR reforça seu compromisso com Confins

Procurada, a CCR disse, por nota, que reforça seu compromisso com o desenvolvimento do hub logístico multimodal do aeroporto para sua consolidação como centro de recebimento, armazenagem e distribuição de cargas, para o Estado de Minas Gerais e de conexões com outros destinos.

Para isso, tem focado na execução do plano estratégico do aeroporto, que aponta caminhos – de médio e longo prazos  –  visando ao aumento de volume, à abertura de novas rotas internacionais e à sinergia com outros modais.

“O número de rotas internacionais já foi triplicado, passando de dois destinos – Panamá, com Copa Airlines, e Lisboa, com TAP – para seis destinos, incluindo Fort Lauderdale, Orlando e Curaçao, com Azul Linhas Aéreas; e Bogotá, com a Avianca. A concessionária continuará buscando trazer desenvolvimento para o Estado e para o País, por meio do desenvolvimento de novas rotas internacionais e novas rotas cargueiras”.

Outra fonte em anonimato falou que a sociedade é justamente o maior desafio do aeroporto. “O aeroporto tem um desafio único e muito complexo: ter três sócios operadores aeroportuários que, às vezes, têm interesses conflitantes e objetivos diferentes. Isso torna a gestão muito mais complexa em diversos sentidos. Apenas como exemplo, nos últimos oito anos, a concessionária teve quatro presidentes. Sinceramente, isso não é usual. Na minha visão, o grande desafio está em harmonizar essa relação”, disse em alusão à recente saída do até então CEO da BH Airport, Kleber Meira.

O próprio executivo oficializou sua saída do cargo, por meio de um post nas redes sociais. “Assumi a posição de CEO em dez/2020, no meio da Covid-19, e com uma conjuntura extremamente complexa e desafiadora para o setor aeroportuário. Estou muito orgulhoso do que conquistamos, merecendo destacar que dobramos a margem Ebitda, evitamos a necessidade de aporte de capital, melhoramos substancialmente o caixa da empresa e ampliamos a malha área, transformando o Aeroporto Internacional de Belo Horizonte em um importante hub aéreo e um dos aeroportos mais elogiados e premiados do Brasil”, diz trecho da mensagem.

Tanto o Grupo CCR quanto a BH Airport foram questionados sobre a saída de Meira, mas nenhum deles comentou o assunto. O executivo também preferiu não se manifestar.

Desenvolvimento do Aeroporto Internacional de Belo Horizonte

Secretário de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais na primeira gestão de Aécio Neves, Wilson Brumer recorda que ainda em 2003 a então equipe de governo buscou fazer um planejamento para o Estado que incluía o desenvolvimento de um ambiente mais favorável à atração de investimentos privados. E entre as várias vertentes trabalhadas estava o potencial logístico do território, ladeado por outras grandes potências econômicas nacionais, cortado pelas principais rodovias do País e ainda extensa malha ferroviária.

“Faltava, nesse contexto, o modal aéreo. Na época, o Aeroporto da Pampulha era nossa opção, um aeroporto central, mas com grandes limitações. E havia também o chamado Aeroporto de Confins, um verdadeiro elefante branco. Demos início às discussões para transferirmos os voos para a cidade da RMBH e ancorar o desenvolvimento da parte Norte de Belo Horizonte, que crescia mais sentido Sul. Não fazia mais sentido continuar explorando a Pampulha diante de tantas limitações de crescimento, como o adensamento populacional, porte e monumentos históricos”, explica.

No dia 5 de março de 2005 todos os voos foram transferidos da Pampulha para Confins. Brumer admite que foram inúmeros os questionamentos, especialmente no que se refere ao acesso ao terminal. Por isso, junto com a transferência das operações, o governo desenvolveu e investiu na chamada Linha Verde. “E então as pessoas começaram a entender que era um projeto de desenvolvimento, que ia além do aeroporto. Ali, Minas começava a decolar”, comentou.

O ex-secretário avalia que o cenário hoje é outro e que o mundo passa por profunda transformação, com forte tendência de geolocalização das cadeias produtivas. Sob essa ótica, são grandes as oportunidades, mas igualmente elevados os desafios.

“Enquanto naquela época, somados, o Aeroporto da Pampulha e Confins tinham capacidade máximas de 4,5 milhões de passageiros por ano. Hoje, sozinho, o Aeroporto Internacional de Belo Horizonte já ultrapassa os 10 milhões e tem capacidade para 22 milhões. O desafio é manter essa trajetória de crescimento e consolidar o terminal como hub”, avalia.

Também integrante do governo Aécio Neves e do seguinte, de Antonio Anastasia, Luiz Antônio Athayde lembra que, à época, apenas o governo mineiro investiu R$ 600 milhões em obras de acesso viário e na implementação do Aeroporto Industrial – o primeiro do tipo em operação no País. E que os investimentos da BH Airport, desde o início da concessão, já ultrapassam R$ 1 bilhão. Tudo isso para estruturar um projeto maior de conectividade entre rotas nacionais e internacionais, transformando o aeroporto em importante hub logístico.

“Naquela época contamos com o auxílio de um grande especialista de áreas aduaneiras diferenciadas no mundo, Juan Torres Tolosa, que já chamava atenção para a posição de aeroporto com melhor potencial de conexões no Brasil. Pampulha já não tinha mais como crescer e Minas precisava se conectar a outras regiões para aproveitar esse potencial até chegar ao posto de hub internacional. Foi então que iniciamos os esforços de transferência dos voos”, diz.

Para Athayde, o fato atual mais claro de que foi uma decisão acertada diz respeito à concorrência entre os aeroportos do Galeão e Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Enquanto o primeiro quase sucumbe pela falta de voos, o segundo opera acima da capacidade, levando ao desequilíbrio das operações.

Ele explica que não existem duas malhas nacionais e, por isso, se preocupa com uma quebra em Minas com a retomada de voos comerciais para a Pampulha: “Seria trágico e acabaria com o Aeroporto Internacional de Belo Horizonte”. 

Por fim, o especialista lembra que o Aeroporto da Pampulha foi concessionado para atender à aviação executiva, inclusive internacional e que nenhuma outra capital brasileira tem isso.

“É mais um diferencial a favor do desenvolvimento de um hub internacional no Estado. Mas voos internacionais precisam de voos nacionais. Por isso, a BH Airport tem investido tanto em conectividade. É algo planejado lá atrás, mas que depende de outras frentes como investimentos em acesso e atração de empresas para dar corpo e perenidade ao projeto que pode contribuir, de fato, para a entrada de Minas na nova economia”, finaliza.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas