Investida de Trump é sinal de relevância do Brics, mas protecionismo ameaça MG

Especialistas apontam que as últimas investidas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brics são um sinal da relevância que o bloco ganhou ao longo dos anos e pode até mesmo fortalecer o grupo. Eles afirmam que o recente encontro no Rio de Janeiro reforçou a proximidade das relações comerciais do Brics e a busca de seus integrantes por uma diversificação econômica para uma menor dependência da economia dos Estados Unidos.
A investida trumpista, avaliam, tem como pano de fundo a disputa de poder entre as duas maiores economias do mundo, e tem sido feita em cima de mais protecionismo comercial, a reboque das tarifas impostas pelo mandatário norte-americano, o que deve ser prejudicial para a economia mineira em um primeiro momento.
A professora de relações internacionais (RI) da Faculdade de Ciências Econômicas (Face) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Fernanda Cimini, destaca que a agenda do Brics já está colocada há mais de uma década e envolve, entre outras medidas, a desdolarização das relações comerciais e financiamento sem depender dos recursos dos países do chamado Norte Global, temas que afetam diretamente o poder de influência dos EUA.
Fernanda Cimini afirma que a reação do presidente norte-americano era esperada e até mesmo desejada pelos países do Brics, já que as movimentações deverão engatilhar alguma mudança no Norte Global e até mesmo fortalecer o grupo de países do qual o Brasil faz parte.
“Quando o Trump reage a uma reunião do Brics, mostra que, de fato, ele está ‘mordendo a isca’, está entendendo que o Brics tem alguma relevância, que tem algum jogo acontecendo”, disse. “Ou seja, se antes não havia um jogo sendo jogado, se antes era um jogo apenas do lado do Sul Global, agora os Estados Unidos vão validar a existência desse jogo”, analisa.
A aproximação entre os países do Brics, reforçada no Rio, é, justamente, uma “união de esforços” para ter uma menor dependência dos EUA e da União Europeia, explica o professor dos cursos de gestão e RI, do UniBH, Fernando Sette. Ele aponta que a aproximação não eliminará a dependência do dólar, já que a força das moedas do Brics – e de uma futura moeda do grupo – dependerá também da força da moeda norte-americana, mas deve diminuir.
“As reservas internacionais brasileiras são lastreadas em dólar. Qualquer coisa que afete o dólar ou qualquer comportamento da política americana, do ponto de vista econômico, vai afetar as reservas brasileiras”, avalia Sette. “Se começa a diversificar – e esse movimento demora alguns bons anos – as reservas internacionais através dessas transações bilaterais, em moeda que não seja o dólar, têm uma menor dependência a médio e longo prazo”, completa.
A professora da UFMG pontua ainda que, com China e Rússia já têm relações já estremecidas com os Estados Unidos, o Brasil e a Índia surgem como os países mais moderados do Brics na relação com a maior economia do mundo, mas que essa dinâmica dependerá de cada caso da agenda econômica entre as nações brasileira, indiana e norte-americana.
Protecionismo com disputa entre EUA e China prejudica Minas
O pesquisador da Fundação João Pinheiro (FJP), Lúcio Barbosa, destaca o peso extremamente relevante do principal integrante do Brics, a China, na economia mineira, responsável, sozinha, por praticamente um terço das importações do Estado e um terço das exportações de Minas.
Ele também destaca que, a bem da verdade, Rússia e Índia contam com participações na economia de Minas bem menores que a chinesa, mas ainda são representativas quando postas em comparação entre todos os países.
Ainda assim, Barbosa considera o Brics mais como um espaço de governança do que econômico, que tenta se contrapor ao poder dos Estados Unidos, e que é visto por Trump como um polo em uma disputa que leva a mais protecionismo. “A ‘concorrência’ que está sendo posta agora está sendo mediada por tarifas. O momento atual, com esses polos de poder disputando, principalmente China e EUA, é pior para a economia mineira”, analisa.
Ele ressalta que, por ser atualmente o principal parceiro comercial de Minas Gerais e do Brasil, o Estado e o País não conseguiriam agir com indiferença com os chineses. “Estar próximo da China, possivelmente, é mais relevante do que estar próximo dos Estados Unidos, nesse momento”, argumenta.
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