Investidores seguem cautelosos quanto a aportes nas SAFs brasileiras

A Sociedade Anônima do Futebol (SAF) foi criada para facilitar a captação de recursos a fim de reduzir as dívidas dos clubes brasileiros. No entanto, quatro anos depois da promulgação da Lei nº 14.193/21, que criou esse modelo especial de constituição de empresas, fatores como a falta de segurança jurídica e a má gestão dos times ainda geram desconfiança entre os potenciais investidores.
Iniciativas como a elaboração do Projeto de Lei (PL) 2.978/2023, que prevê o aperfeiçoamento da governança dos times, e adaptações na tributação destas equipes buscam melhorar o ambiente e resguardar os investidores de qualquer risco envolvendo esse mercado. A criação de ligas também pode colaborar para a profissionalização do futebol.
O sócio e líder da RRA Consultores, Alexandre Rangel, relata que ainda há grande desconfiança dos investidores a respeito do modelo SAF adotado, principalmente, pelos clubes de maior expressão no Brasil. Para o especialista, uma das maiores preocupações dos investidores envolve a questão da segurança jurídica e proteção dos direitos dos acionistas majoritários.
Cenário de insegurança jurídica
O conflito envolvendo a 777 Partners e o Vasco da Gama ou a crise atual do Botafogo são alguns dos casos que têm gerado dúvidas entre os grandes investidores a respeito da segurança desse mercado. O dirigente avalia que esse cenário poderá causar uma retração no investimento e na participação de muitos players nas SAFs brasileiras ao longo dos próximos anos.
Ele ainda ressalta que a maioria dos investidores em clubes até o momento é de empresários que já possuem algum vínculo com o time e com capacidade de destinar recursos para a equipe. A participação de investidores internacionais no futebol brasileiro ainda é baixa. “Eu acredito que ainda vai demorar muito tempo para estabilizar esse ambiente de insegurança jurídica”, diz.
O sócio executivo da Exa Capital, Alexandre Cobra, avalia que o cenário atual é de grande otimismo quanto ao futuro do futebol brasileiro, com a construção de um ecossistema que envolve inúmeras frentes, incluindo a SAF. Outra ação que também tem colaborado é a criação das ligas que reúnem os grandes clubes a fim de alcançar objetivos em comum: Liga do Futebol Brasileiro (Libra) e Liga Forte União (LFU).
“Eu acredito que essas duas ligas irão se unificar em algum momento e através dessa união nós poderemos dar início a outras frentes que vão de encontro à profissionalização do futebol brasileiro”, diz.
O desenvolvimento de estádios em arenas de entretenimento é outro ponto necessário para o avanço desse mercado no País, segundo Cobra. Para ele, a liga de clubes também pode contribuir com suporte jurídico, oferecendo maior blindagem a respeito da regulamentação dos clubes.
“Todo esse ecossistema irá contribuir para a geração de confiança junto a investidores internacionais para que eles tenham maior apetite de investir no Brasil e nos ajudem nessa transformação”, afirma.
A importância de uma boa gestão nas SAFs

Rangel esclarece que a venda de um time de futebol não é tão diferente do que ocorre em qualquer outro ativo empresarial. O cenário atual no Brasil é de equipes que veem na transformação em clube-empresa uma salvação para a má gestão de dirigentes anteriores. Isso faz com que o clube arrecade um valor muito abaixo do que poderia obter se estivesse em uma situação mais vantajosa.
A SAF foi criada visando à captação de recursos para reduzir as dívidas dos clubes, no entanto, o sócio da RRA pontua que muitos times têm utilizado parte do valor obtido para fins competitivos. “Na verdade, considerando o tamanho dos investimentos e dos custos do futebol atual, os valores que estão sendo oferecidos servem apenas para ‘enxugar gelo’”, completa.
Já o executivo da Exa Capital explica que o empresário precisa contar com uma gestão eficiente e sustentável para que ele possa gerar mais lucros e reinvestir no clube, para proporcionar maior valorização do ativo. Segundo Cobra, a presença de um proprietário em um clube de futebol proporciona um ambiente mais favorável para o desenvolvimento de planejamentos a longo prazo.
“É possível identificar o perfil ideal de colaboradores para ter uma gestão eficiente e implementar o plano estratégico de médio a longo prazo e, consequentemente, resultados positivos para o negócio, com longevidade e a criação de um time forte capaz de obter títulos ao longo do tempo”, diz.
Pressão da torcida não é um problema
Quanto à cobrança dos torcedores por resultados, o especialista avalia que isso não seja um fator que possa espantar os investidores internacionais, já que eles estão acostumados com o modelo de negócio do futebol, que envolve muita paixão. Além disso, essa paixão também tem suas vantagens, ao fazer do torcedor um consumidor cativo.
“Eles não trocam de clube, mesmo que o resultado não seja muito interessante. É a paixão que gera a fidelidade da torcida pelo clube de futebol e influencia o resultado econômico”, diz.
Rangel ainda lembra que nem todos os times irão obter sucesso dentro dos campos, considerando a grande quantidade de equipes disputando um número reduzido de títulos ao longo do ano. Além disso, ele avalia que existe uma falha de comunicação de muitos clubes sobre quais os objetivos possíveis de serem alcançados, considerando o momento atual do time.
Para o dirigente, um clube bem gerido e financeiramente saudável terá mais condições de dar um salto de competitividade após uma injeção de capital, mas no longo prazo ele tende a manter o mesmo patamar. Essa realidade ainda precisa ser melhor comunicada, assim como ocorre no exterior, onde os investidores têm total noção da capacidade de seu time.
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