Economia

Mudança de comportamento na Quaresma paralisa venda de pescados em Minas

Tradição de consumir peixes no período que vai da Quarta-feira de Cinzas até a Sexta-feira Santa está menos popular, apontam comerciantes
Mudança de comportamento na Quaresma paralisa venda de pescados em Minas
Foto: Adobe Stock/DiegoM.

A tradição católica de substituir o consumo de carne vermelha por pescados na Quarta-feira de Cinzas e nas sextas-feiras da Quaresma não tem sido mais motivo de boa expectativa de vendas para as peixarias. Comerciantes do setor em várias cidades mineiras foram ouvidos pelo DIÁRIO DO COMÉRCIO. Para eles, este costume já deixou de representar um período sazonal com oportunidade para lucrar mais.

“Ter um bom movimento na peixaria em plena Quaresma é uma cena que a gente já não vê há um bom tempo. Hoje, os tempos são outros e as pessoas já não buscam cumprir o preceito. Quem ainda respeita a tradição vai consumir peixe em bar ou restaurante, mas a dona de casa não compra mais neste período, somente na Semana Santa“, diz a responsável da Cia do Camarão, Silviana Aguiar. Ela está à frente da peixaria que existe há 25 anos no Bonfim, bairro da região Leste de Belo Horizonte com forte comércio de pescados.

Apesar das vendas fracas na Quaresma, o estabelecimento tem uma projeção um pouco melhor para a Semana Santa, quando o incremento pode chegar a 40% frente ao mesmo período do ano passado.

Realidade completamente diferente para o Aquários, estabelecimento que é peixaria e também restaurante especializado em pescados e localizado em Sete Lagoas, na região Central do Estado. Por lá, as expectativas para as vendas na Semana Santa não são nada satisfatórias.

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De acordo com o proprietário Anderson de Paula, a queda será de 20% no balanço de caixa na comparação com o mesmo período do ano passado.

“Já fiz as contas e vi que as vendas serão bem abaixo que as da Semana Santa de 2023. Essa tradição já caiu por terra. As pessoas não estão mais preocupadas em consumir peixes nas quartas e sextas. Só o pessoal mais velho que segue esse costume. Aqui, por exemplo, o movimento está fraco, mas aos finais de semana o público pede um peixe frito para petiscar”, diz o empresário.

Aumento tímido deve acontecer somente na Semana Santa

No caso da Peixaria do Nei, em Janaúba, no Norte de Minas Gerais, na Quaresma as vendas não devem ter variações e seguirão como ocorrem nos outros meses do ano. “As nossas vendas não devem ter um aumento bom como ocorria antigamente. As pessoas já têm esse costume de comer peixe ao longo do ano, o que deve ser mantido. Agora, a logística já facilitou muito a distribuição e a comercialização para as famílias. Antigamente, peixe era algo muito mais caro e difícil de se encontrar no comércio”, comenta o proprietário Luiz Moreira.

Por lá, o estabelecimento também opera como restaurante, oferecendo pratos fritos e moquecas. Segundo Moreira, na Semana Santa pode até ser que as vendas cheguem a aumentar 10% no restaurante comparado a um fim de semana comum. “Já nas vendas de peixe cru, a tilápia e a pescada amarela, que é o que tem mais saído, podem ser mais procurados”, espera.

Já para Silvania Aguiar, da Cia do Camarão, as vendas podem ser impulsionadas pela procura de surubim, filé de salmão, sardinha e tilápia na Semana Santa.

Para a peixaria Abrolhos Pescados, em Governador Valadares, no Vale do Aço, a expectativa de vendas é pequena, cerca de 5% a mais que na Semana Santa de 2023.

Na Cia do Peixe, em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), o estabelecimento não quis informar uma projeção, mas adiantou que as vendas devem se concentrar mais entre tilápias e surubins. Porém, o estabelecimento também tem presenciado uma redução no movimento de público.

Entidade do setor defende estratégia para aumentar as vendas

O presidente da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR), Francisco Medeiros, acredita que ainda exista uma preferência por peixes durante a Quaresma e que ela deve ser acompanhada por estratégias de marketing e promoções por parte de varejistas para aquecer as vendas no período. Afinal, garante, peixe é o que não vai faltar.

Ao contrário da demanda relatada pelos comerciantes, a oferta, pelo menos, está em alta. “A produção de peixes em Minas Gerais continua crescendo neste ano, com índices percentuais similares ao principal estado produtor que é o Paraná. Com isso, a expectativa de produção de peixe de cultivo vai garantir um melhor preço de mercado“, conta Medeiros.

Ele também lembra que Minas é o segundo maior produtor de tilápias no país, um dos peixes mais procurados pelos consumidores.

A tilápia aparece como boa opção de consumo por causa do fornecimento perene e pelo preço mais acessível. Minas Gerais, inclusive, tem o segundo maior cultivo da espécie no País | Crédito: Aquarios Sete Lagoas/Divulgação

A entidade projeta, para a Quaresma e Semana Santa, um aumento de 30% nas vendas de peixes no atacado, ou seja, na distribuição para os comerciantes. A comparação se refere ao mesmo período do ano passado.

Medeiros lembra que o abastecimento de pescados no último ano foi atípico, já que o mercado nacional de peixes enfrentou a falta de filé de merluza e de tilápia em plena Quaresma e Semana Santa por conta de uma menor produção e de uma maior procura. Justamente o contrário do que ocorre este ano.

Para 2024, entretanto, o presidente da entidade garante: “Estamos com o mercado bastante abastecido, sem problemas por falta de oferta, principalmente com relação à tilápia nas gôndolas do supermercado e no prato do consumidor”, conclui.

Nadando contra a corrente

Em meio a um “mar” de estabelecimentos com expectativas não muito otimistas para a Quaresma, uma peixaria em BH vai contra a corrente. No Mercado Central há 34 anos, a Peixaria Modelo é um dos estabelecimentos mais procurados na hora de comprar um peixe fresco.

O comerciante Alfredo Suarez afirma que vende os pescados sem gelo, o que garante fidelidade ao consumidor e preço mais baixo. “Aqui o cliente não compra água, ele compra peixe. E pode ter certeza que eu não coloco gelo em peixe. Por isso, temos preferência da classe baixa à classe alta por conta do preço e do bom atendimento“, diz.

Segundo Suarez, antes mesmo da Quaresma começar, o negócio já vinha recebendo uma boa procura da clientela. “Estamos na contramão de outras peixarias que estão com baixa nas vendas. A gente, aqui, vende bem e tem sido muito bom esse momento”, diz. Tenho tido um aumento nas vendas de tilápia que estão há um ano com o mesmo preço (R$ 54,90/Kg), assim como da piratinga, que é um peixe mais barato (R$32,90/Kg), gostoso e faz uma moqueca muito boa”, afirma o proprietário.

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