Economia

Negociações para autoprodução de energia no Brasil paralisam por insegurança jurídica

Essa interrupção acontece enquanto o Congresso discute uma medida provisória
Negociações para autoprodução de energia no Brasil paralisam por insegurança jurídica
O aumento no consumo exige ampliação no escoamento de energia | Foto: Toby Melville / Reuters

Após dezenas de acordos em apenas dois meses antes de uma possível mudança na legislação, incertezas jurídicas relacionadas à autoprodução de energia agora paralisam negociações entre empresas, que preferem aguardar uma definição para o futuro desse modelo de negócios, segundo especialistas.

Essa interrupção acontece enquanto o Congresso discute uma medida provisória enviada pelo governo, segundo levantamento feito pelo Lefosse Advogados, importante assessor jurídico dessas operações.

A autoprodução de energia, que ajudou a expandir o parque elétrico brasileiro, é uma modalidade de contratação muito utilizada por grandes consumidores.

No caso, as empresas também entram como sócias nos empreendimentos de geração, o que lhes garante benefícios tarifários e custos mais competitivos na energia consumida.

O governo decidiu alterar regras e restringir a autoprodução na medida provisória 1.300, em medida que visava reduzir os impactos para os demais consumidores de energia dos incentivos tarifários à modalidade, mas o texto acabou sendo aprovado sem tratar do tema. Essa discussão contra subsídios será incorporada à medida provisória 1.304, conforme já anunciado por seu relator.

Enquanto a MP 1.300 esteve vigente, as mudanças nas regras da autoprodução se tornaram válidas, de forma que investidores correram para assinar negócios e aproveitar o período de 60 dias para transição de regimes.

O Lefosse assessorou 25 projetos de autoprodução de energia nesses 60 dias, totalizando mais de 1 gigawatt (GW), cujos investimentos superariam bilhões de reais, conforme os valores demandados para projetos com essa potência. São negócios de geradores com usinas já em operação comercial, com parte da energia descontratada, ou com novos parques em desenvolvimento.

Os números são expressivos considerando que, nos últimos nove anos, o escritório havia estruturado outros 72 projetos, que somam 3,7 GW.

Agora, as operações entraram em compasso de espera, afirmou Raphael Gomes, sócio de energia do escritório de advocacia Lefosse.

“A pergunta que a gente mais recebe dos investidores brasileiros, dos estrangeiros, da indústria, do gerador, é ‘o que eu faço?’… São investimentos parados no país, esperando até novembro para saber o que vai acontecer”, disse ele, se referindo à data que a MP 1.304 perderá vigência se não for aprovada pelo Congresso.

Ele observa que são altas as chances de o assunto sequer ser endereçado na MP 1.304, que também tratará de outros temas complexos do setor elétrico, como os cortes de geração. Há dúvidas ainda sobre quais são as potenciais mudanças, se seriam mantidas, por exemplo, as alterações sugeridas pelo governo, com aumento do volume de energia para qualificação na modalidade e imposição de que o consumidor tenha maior participação no equity no projeto.

“Se tudo ficar como está, a gente perde três meses de inatividade, de negócios, por conta de insegurança jurídica.”

A autoprodução foi a responsável por viabilizar a expansão do parque gerador de energia brasileiro nos últimos anos, em meio à falta de leilões de energia do governo. A modalidade sustentou a contratação de energia eólica e solar no ano passado, representando 30 dos 31 contratos assinados e monitorados pela Clean Energy Latin America (CELA).

“Sem dúvida tem caso de consumidores que estão ‘on hold’ desde o anúncio da MP”, disse Camila Ramos, CEO da CELA.

A executiva apontou que a consultoria, que também assessora negócios de autoprodução, tem conduzido negociações entre geradores e consumidores de energia, contando com a possibilidade de aprovação de novas regras.

Gomes, do Lefosse Advogados, aponta ainda que a autoprodução foi expressamente citada na medida provisória para estimular a instalação de data centers, sendo uma alternativa importante para viabilizar esses projetos que são grandes consumidores de energia.

“É fato que o data center não se viabiliza no Brasil só com benefício tributário. Ele precisa da autoprodução para poder viabilizar o custo de energia.”

Conteúdo distribuído por Reuters

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