Economia mineira perdeu ritmo de crescimento no início deste ano

O ritmo da economia mineira perdeu força e tem oscilado em números maiores nos primeiros meses deste ano, ainda que o desempenho anual de alguns setores esteja positivo. O quadro, conforme especialistas ouvidos pelo Diário do Comércio, reflete uma economia que avança, mas com pouca tração, em um cenário nacional de juros altos, demanda contida e incertezas fiscais.
Em 2025, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a economia de Minas Gerais tem mostrado sinais de desaceleração no curto prazo, especialmente se considerados os resultados mais recentes da indústria e do comércio, ambos com desempenho negativo em abril. A indústria mineira recuou 0,3% no mês e o comércio varejista, 1,7%, o primeiro recuo no ano após uma trajetória positiva, conforme os dados do IBGE. Por outro lado, o setor de serviços apresentou leve alta de 0,6%, sugerindo resiliência de atividades menos dependentes da produção física ou da demanda de bens duráveis.
Na análise da economista do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Diana Chaib, a tendência é de crescimento moderado e desigual entre os setores.

De acordo com a economista, a indústria mostra fôlego em atividades específicas, como bebidas (+10,4%) e veículos automotores (+10%), mas sofre com retrações fortes em ramos como celulose (-68,6%) e máquinas elétricas (-16,6%). “Isso revela uma estrutura produtiva heterogênea, em que poucos segmentos sustentam o crescimento”, diz.
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No comércio, o desempenho também é misto: enquanto livros e papelaria (+17,4%) e artigos de uso pessoal (+8,1%) crescem, setores como móveis e eletrodomésticos (-7,7%) e informática (-47%) recuam fortemente. Diana Chaib avalia que o setor de serviços deve seguir com crescimentos leves, puxados por informação e comunicação, e aluguéis não imobiliários, que vêm sustentando o volume total.
Segundo ela, os serviços, apesar da instabilidade, vêm demonstrando maior resiliência. “Isso se deve, em parte, à diversificação interna: enquanto atividades como ‘outros serviços’ recuam, segmentos como informação e comunicação (+2,3%) e aluguéis não imobiliários continuam avançando”, comenta.
Além disso, ela ressalta que o setor de serviços costuma responder de forma mais lenta aos ciclos econômicos e se beneficia do crescimento urbano e da digitalização, fatores mais estruturais que conjunturais. “O transporte rodoviário de cargas, por exemplo, também foi um dos motores positivos em abril, o que sugere algum dinamismo logístico associado à retomada parcial de setores industriais e do agronegócio.”
Para o economista-chefe do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), Izak Silva, é a heterogeneidade da economia mineira que faz dela o termômetro do Brasil e os mineiros perceberem uma retração maior no Estado do que no Brasil. “Quando crescemos, crescemos mais que a média nacional. Quando retraímos, também retraímos mais que o País”, afirma.
Segundo ele, a participação de setores que ditam a economia, como a indústria e o serviço, é maior em Minas do que no País. “Dessa forma, quando a atividade econômica desacelera, Minas Gerais sofre de forma mais intensa”, explica.
De acordo com Izak Silva, enquanto a participação da indústria mineira representa 22% da indústria nacional, em Minas ela representa 27,5%. Da mesma forma, o setor de serviço compõe 66% do PIB do Brasil, enquanto em Minas, ele compõe 68%.
A mesma situação é percebida no agronegócio, porém em direção oposta. Apesar de Minas Gerais ter um desempenho forte e relevante, na composição do PIB ele ainda tem uma participação inferior, sendo 10% dentro de Minas Gerais e 13,5% no Brasil. “O efeito de amortecimento que o agro proporciona para o Brasil é menos observado no Estado”, completa.
O economista do BDMG comenta ainda que a desaceleração econômica mineira era esperada desde o ano passado, mas só está sendo percebida agora. Segundo ele, o ciclo de juros real elevado ficou mais longo em função dos gastos não previstos pelo governo federal, que injetou verba na economia acima do esperado. “É um cabo de guerra, um conflito entre a política fiscal e a monetária do governo federal”, avalia.
Segundo ele, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da transição e o aumento dos gastos públicos federais custaram não só ao Estado, mas a todo o País, cerca de oito pontos percentuais de juros. “Nós estamos pagando a conta agora. No mundo ideal, a gente já teria um juros a 7% ou 8%, e uma inflação próxima de 3%, mas nós fizemos uma escolha de turbinar a atividade econômica e o crescimento a curto prazo, e isso tem um preço”, diz.
Indústria de transformação e setor de serviços devem continuar desempenhando bem
A médio prazo, na avaliação da economista da UFMG, tanto serviços como parte da indústria de transformação devem seguir se destacando, sobretudo aqueles menos dependentes do mercado externo e com maior integração urbana e tecnológica.
E os motivos para a economia mineira desempenhar nesse formato estão relacionados, na visão dela, a três fatores primordiais. O primeiro deles seria a política monetária, que ela ainda considera contracionista. “A taxa de juros elevada continua desestimulando o consumo e o investimento produtivo, afetando particularmente o comércio e a indústria.”
A inflação controlada, mas ainda pressionada por alguns grupos, seria outro fator. “O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) subiu 0,17% em maio, puxado por energia elétrica e alimentação, o que compromete o poder de compra das famílias, principalmente as de baixa renda.”
Por último, ela atribui os resultados apresentados à desigualdade setorial. “Enquanto segmentos com maior sofisticação tecnológica ou voltados ao mercado externo têm apresentado crescimento, setores ligados ao consumo de massa seguem mais voláteis.”
Para Izak Silva, o cenário econômico daqui para frente é prospectivo. Na avaliação dele, as ações do governo federal sinalizam continuidade com a agenda de ampliação de gastos públicos e estímulo à economia, com aumento de carga tributária. Nesse sentido, ele prospecta que o Congresso não deve aceitar o aumento de tributos e o País deve sofrer ainda mais a redução de incentivos fiscais. “Isso fará com que a gente observe uma desaceleração marginal da atividade econômica”, pontua.
Nesse cenário, ele espera que a taxa Selic se mantenha a 14,75% até o final do ano, com inflação um pouco menor do que a antecipada anteriormente, marcando próximo de 5,4%. Já o PIB, ele aposta em um crescimento menor que o esperado, sendo 2,4% de crescimento para o Brasil e 2,2% para Minas Gerais.
“Nesse crescimento o agro pesa bastante, mas como em Minas o agro tem menor participação e nós temos menos culturas e menos oferta, naturalmente teríamos um PIB um pouco menor por conta desse desempenho aquém aqui do Estado. Além de um desempenho marginalmente inferior em algumas atividades econômicas, conforme têm indicado os dados antecedentes”, conclui.
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