Economia

STF mantém obrigação de empresas informarem benefícios à Receita, e lista vai aumentar

Decisão unânime garante obrigatoriedade de empresas informarem benefícios à Receita Federal; lista deve ser ampliada
STF mantém obrigação de empresas informarem benefícios à Receita, e lista vai aumentar
Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de manter a obrigatoriedade de empresas informarem, por meio eletrônico, os benefícios fiscais que recebem do governo vai abrir caminho para a Receita Federal fortalecer os controles de fraude e a identificação do uso ineficiente de incentivos tributários.

De acordo com auditores ouvidos pela Folha, a ideia é ampliar a lista, que hoje alcança 88 benefícios analisados. A decisão também reforça um movimento de auditores estaduais para expandir esse instrumento nos estados.

A decisão dos ministros foi unânime no julgamento da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), apresentada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) contra a Dirbi, nova declaração da Receita que obriga as empresas beneficiadas por incentivos, renúncias fiscais e imunidade tributária a informar todos os valores de tributos que deixaram de pagar.

A CNI alegou no recurso ao STF que a declaração aumenta a burocracia, pois as informações exigidas já estão à disposição da Receita. Também sustentou que a obrigação poderia pesar mais sobre micro e pequenas empresas, que teriam custos extras para se adaptar às regras. A Dirbi foi criada em 2024.

O julgamento virtual foi encerrado no dia 17 de outubro e representou uma vitória para o Ministério da Fazenda. A equipe do ministro Fernando Haddad e o secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, não atendeu ao pedido da Folha para comentar a decisão do Supremo, em meio às negociações de medidas de aumento de receitas no Congresso.

Para auditores fiscais da Receita ouvidos pela reportagem na condição de anonimato, a decisão do STF estabelece a Dirbi como um instrumento poderoso de transparência para auxiliar o trabalho de fiscalização e de combate a políticas ineficazes de desoneração, que tiram bilhões dos cofres do governo.
Eles citam como exemplo o Perse, benefício criado na pandemia para socorrer o setor de eventos, que abriu uma porteira para fraudes e foi prorrogado, mesmo num cenário de recuperação econômica. Técnicos temem que o Congresso viabilize um retrocesso na medida.

O presidente da Febrafite (Associação Nacional de Fiscais de Tributos Estaduais), Rodrigo Spada, defende a expansão do modelo da Dirbi para os governos estaduais. “É dinheiro público, e o princípio que deve imperar é o da publicidade e transparência. Se para tributar é necessário lei no sentido estrito, e publicidade, para isentar deveria ser a mesma lógica”, diz.

Em sua avaliação, os benefícios fiscais distorcem a concorrência entre as empresas e reduzem os recursos disponíveis no Orçamento. “Dinheiro que poderia ir para educação, saúde, segurança e investimentos.”
Os dados da Dirbi são publicados na página da Receita na internet num modelo considerado simples e de fácil cruzamento por período de apuração, estado, tributo, benefício, Cnae (Classificação Nacional de Atividades Econômicas), nome empresarial e CNPJ. As informações disponíveis até o momento são de 27 de maio de 2025. A Receita não informou quando pretende atualizar os dados.

Para o ex-auditor Adriano Pereira Subirá, a Dirbi deve ser ampliada pontualmente. “Eu acredito que ela já cobre hoje boa parte [dos incentivos], mas ainda assim temos um volume de meio trilhão de reais de benefícios fiscais”, diz Subirá, presidente do Comitê Tributário Brasileiro, entidade sem fins lucrativos.
Segundo Subirá, só PIS e Cofins têm cerca de 200 regimes diferentes, que vão desaparecer com a entrada em vigor da reforma tributária a partir de 2027.

O professor do Insper Breno Vasconcelos destaca a importância de garantir mais transparência às informações sobre benefícios fiscais. “[Hoje] tem um problema de transparência, de capacidade de identificação do quanto poderia ter sido arrecadado em razão daquele benefício que foi concedido”, diz. “A parte que seria devida pelo agente beneficiado é dividida entre os demais”, diz.

Vasconcelos elogia a Dirbi porque os beneficiários são obrigados a declarar quanto têm deixado de pagar em decorrência do incentivo.

Ele diz que vê com ressalvas a criação de novas obrigações acessórias (declarações) aos contribuintes devido ao custo alto, mas ponderou que a Dirbi é muito positiva para a transparência. Para ele, a má alocação de benefício fiscal é um dos fatores para a baixa produtividade das economias no mundo.

No julgamento, o relator do processo, ministro Dias Toffoli, apontou que a Dirbi não viola a Constituição e busca dar eficiência e transparência à cobrança e aplicação dos impostos. Segundo ele, a previsão de multas por descumprimento das obrigações não prejudica as micro e pequenas empresas.

Ele afirmou que o tratamento diferenciado para esses negócios também se aplica às obrigações acessórias, mas não dispensa o cumprimento de todas as exigências da legislação.

O ministro lembrou que a lei complementar 123/2006 já prevê casos em que micro e pequenas empresas devem seguir as mesmas regras tributárias das outras companhias. No caso da Dirbi, cabe à Receita atentar ao estatuto que rege esses tipos de negócio.

Procurada, a CNI disse em nota que respeita a decisão, mas ressalta que o debate sobre simplicidade tributária não se encerra.

“A criação de novas obrigações acessórias, que elevam custos de conformidade inclusive para micro e pequenas empresas, desafia os contornos do princípio constitucional consagrado pela reforma tributária”, diz a nota. Para a entidade, subestimar o impacto prático dessas exigências significa perpetuar a complexidade de um ambiente de negócios que compromete a competitividade da indústria brasileira.

A discussão de corte de benefícios e de novas regras para a concessão desses incentivos está em evidência na Câmara, onde tramitam três projetos sobre o tema. Um deles foi apresentado pelo senador Esperidião Amin (PP-SC) e outro pelo deputado Mauro Benevides (PDT-CE). Um terceiro é de autoria do governo, que prevê corte de 10% em uma série de benefícios fiscais concedidos a empresas e setores.

A proposta deve ampliar a arrecadação federal em R$ 19,76 bilhões no ano que vem, e seu envio foi necessário para fechar as contas do Orçamento de 2026, encaminhado em agosto passado. Formalmente, o texto foi protocolado pelo líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE).

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas