Economia

Setor calçadista mineiro teme impactos indiretos das tarifas de Trump

Fábricas instaladas em Minas não deverão ser afetadas num primeiro momento, mas podem ser prejudicadas pelo acirramento da concorrência no mercado interno, por parte do polo gaúcho
Setor calçadista mineiro teme impactos indiretos das tarifas de Trump
Em 2024, o Rio Grande do Sul respondeu por 49,7% das exportações e Minas Gerais participou com 4% do total embarcado | Foto: Reprodução Adobe Stock

Responsável por 4% das exportações de calçados de todo o País no ano passado, o setor calçadista de Minas Gerais, a princípio, não deve sofrer impactos bruscos pelas tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos Donald Trump. Ao assinar o decreto na quinta-feira (30), Trump não isentou os calçados brasileiros e, a partir de 6 de agosto, se não houver mais alterações, os produtos serão taxados em 50%.

O presidente do Sindicato das Indústrias de Calçados, Bolsas e Cintos de Minas Gerais (Sindicalçados), Luiz Barcelos, alega que, num primeiro momento, o impacto será pequeno porque as empresas que estão na base do sindicato exportam pouco para os Estados Unidos. Entretanto, não nega que o setor, assim como toda a indústria, não só mineira como brasileira, será afetado. “Só na minha empresa, dois pedidos de clientes americanos que acumulavam um montante de US$ 100 mil foram cancelados”, exemplifica. 

Segundo Barcelos, o Rio Grande do Sul é responsável pela maior parte da produção dos calçados brasileiros. De acordo com dados da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), a indústria calçadista gaúcha é responsável por cerca de 50% das exportações dos calçados no País. “Para eles o impacto será direto e maior. No Rio Grande do Sul há fábricas que exportam 100% dos seus produtos e são mais dependentes do mercado americano”, pontua o dirigente. 

Em 2024, enquanto o Rio Grande do Sul exportou US$ 485 milhões, tendo uma participação de 49,7% do mercado nacional, Minas Gerais respondeu por US$ 40 milhões, participando em 4% das exportações totais do País no setor. 

Desta forma, a preocupação do mercado calçadista mineiro, conforme ressalta o presidente do Sindicalçados, é com o aumento da concorrência interna. “Caso a indústria gaúcha realmente não consiga inserir sua produção nos EUA, ela vai precisar colocar os produtos dela em algum lugar e podem passar a vender para nossos clientes”, diz.

A Alpargatas, responsável pela produção das sandálias Havaianas, que possui unidade fabril em Montes Claros, no Norte de Minas, alega que, a curto prazo, não será impactada. Conforme informações da empresa, apesar de 10% dos produtos que exportam ir para os EUA, os calçados produzidos para o segundo semestre já foram entregues. Por isso, nada será alterado nesse primeiro momento. Entretanto, não avaliam ainda como serão as negociações para 2026. 

No Centro-Oeste do Estado, a região de Nova Serrana, importante polo calçadista, com 1,2 mil fábricas instaladas nas 13 cidades que compõem o polo industrial, o presidente do Sindicato Intermunicipal das Indústrias de Calçados de Nova Serrana (Sindinova), Rodrigo Martins, comenta que a taxação preocupa os empresários, mas que os impactos devem vir de forma indireta. 

Martins explica que desde o anúncio das novas tarifas, o sindicato têm feito mapeamento de mercado, identificando possíveis riscos e impactos. Entretanto, ele alega que polo não possui uma exportação significativa para o país norte-americano. “Hoje, a maior parte do que exportamos, mais de 80%, vai para a América Latina, em especial para a Argentina”, conta.

Assim, o presidente do Sindinova acredita que os impactos serão indiretos. Segundo ele, em consonância com o presidente do Sindicalçados, as empresas que até então exportavam para os EUA, perderão competitividade devido às taxas e precisarão escoar a mercadoria para outros mercados como o interno. 

“Teremos um cenário desafiador que, junto à situação econômica, às altas taxas de juros que prejudicam o varejo, ao endividamento das famílias e ao aumento da concorrência, tornará tudo ainda mais difícil”, lamenta.

O que Rodrigo Martins teme é que, sem estrutura comercial, no “desespero” as empresas acabem baixando o preço de mercadorias, às vezes até abaixo do custo, desestabilizando o mercado. “Aí sim, poderá haver impactos significativos nas indústrias, tanto do nosso polo como do setor nacional”.

Expectativa do setor é a perda de 8 mil postos de trabalho

Outra preocupação do setor calçadista é a forma como o tarifaço dos EUA pode impactar os postos de trabalho. Em todo o País, as 5.203 fábricas de calçados existentes, (997 em Minas), geram 282 mil empregos, sendo 10,3% deles (29 mil empregos) no Estado. 

Na última quinta-feira (30), o presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira, declarou que estima uma perda de 8 mil empregos diretos no setor com a taxação de Trump. E defendeu que medidas governamentais são cruciais para mitigar os efeitos nas indústrias. “Agora, o poder público terá um papel fundamental para a preservação das empresas e dos milhares de empregos gerados por ela”, pontuou.

Fábrica de calçados
Empresas que vendem para os EUA perderão competitividade e precisarão buscar outros mercados, inclusive no próprio Brasil | Foto: Reprodução Site Abicalçados

Como medidas de solução, o presidente da Abicalçados defendeu também a implantação de linhas para cobrir o Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC) em dólar com juros do mercado externo, a ampliação do Reintegra para exportadores, a liberação imediata de créditos acumulados do ICMS nos estados e a reedição do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, que foi oferecido em 2020, como medidas trabalhistas para enfrentamento do coronavírus.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas