XP revisa projeção do PIB após tarifa dos EUA, mas vê pouco impacto na economia brasileira

A XP Investimentos reduziu a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro para 2,2% ante os 2,5% previstos anteriormente, o que representa uma queda de 0,3 ponto percentual. A revisão ocorre após o presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, anunciar a tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros.
Para o ano que vem, a redução prevista é de 0,5 ponto percentual, caindo de 1,7% para 1,2%. Apesar disso, os especialistas acreditam que a economia brasileira não sentirá o impacto das tarifas de forma significativa.
Na avaliação do economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale, os efeitos da taxação devem afetar, principalmente, as exportações de bens manufaturados. O Brasil exporta cerca de 12% do total das exportações para os EUA, sendo metade em produtos básicos e metade em manufaturados.
Para o especialista, direcionar produtos básicos para outros mercados é mais fácil. “Se você não exportar suco de laranja para os EUA, por exemplo, pode enviá-lo para outro lugar ou consumir internamente. Há a possibilidade de uma realocação mais fácil”, diz.
Entretanto, produtos como vestuário, móveis, acessórios, entre outros, podem ser substituídos. “O norte-americano vai comprar esses itens de outro lugar e não vai pagar 50% a mais para os brasileiros, por mais que o produto seja bom”, avalia.
Dessa forma, a previsão é que as exportações caiam e que os bens manufaturados sejam fortemente impactados.
Além dos impactos diretos nas negociações internacionais, há também impactos indiretos. “Já vimos o câmbio depreciar, os juros longos subirem e um aperto das condições de crédito, sem falar no aumento da incerteza política e econômica”, observa Megale.
Para ele, o ambiente instável e as medidas repentinas de Trump tendem a estagnar os investimentos e restringir o consumo: “As empresas e os empresários ficam mais receosos, todo mundo põe o pé no freio, por isso a revisão nas projeções do PIB deste ano e de 2026″.
Impactos da retaliação
Outro ponto levantado pelo especialista é a possibilidade de retaliação por parte do governo brasileiro, o que já está sendo sinalizado. Para Megale, se o Brasil adotar tarifas sobre produtos importados dos EUA, isso pode atenuar o problema, já que parte dos produtos importados é direcionada à demanda da produção interna.
“É o oposto do que ocorre com a exportação. Se você exporta menos, o PIB cai. Se você importa menos, o PIB sobe, porque a demanda é direcionada para o consumo interno, mas não necessariamente toda essa demanda será absorvida”, explica. Nesse caso, os produtos locais acabam aumentando de preço internamente e pressionam a inflação, ainda que em escala menor.
É o mesmo caso para produtos como remédios, insumos químicos, plásticos, embalagens e combustíveis (querosene de avião). Havendo retaliação por parte do governo brasileiro, esses itens podem ter um impacto inflacionário, mesmo que pequeno.
Impactos na economia brasileira serão poucos
Apesar de considerar a sobretaxa forte e agressiva, e entender que ela deve impactar alguns setores de forma importante, o especialista acredita que os impactos na macroeconomia brasileira serão limitados. Isso porque, dos cerca de 18% do comércio exterior brasileiro, pouco mais de 10% têm os EUA como destino ou origem.
“Somos muito pulverizados, exportamos bastante para China, Argentina, Europa. Então, é algo pontual com os EUA, ainda que seja um país enorme e importante. Mas do ponto de vista macro, as previsões não mudam muito. Tendemos a ter alguns dramas microeconômicos, e impactos políticos, mas isso precisamos ver ao longo do tempo”, afirma.
Conforme as estimativas da XP, o impacto deve ser de 0% a 0,5% no PIB brasileiro. Isso porque o aço, principal produto de exportação para os EUA, já havia sido taxado anteriormente e os reflexos não foram relevantes. “A taxa de 50% sobre aço já tinha sido colocada e isso não afetou muito a perspectiva macroeconômica brasileira. Pelo contrário, continuamos exportando aço no mesmo ritmo das remessas anteriores”, ressalta.
Outro ponto destacado por Megale é que o Brasil é um país, em geral, de economia fechada, ou seja, apenas cerca de 18% do PIB vem das negociações comerciais internacionais, um percentual considerado baixo. “Uma economia aberta como a do México ou o Canadá, exporta quase 50% do PIB”, detalha.
XP espera taxa Selic a 12,5% em 2026
Nesse cenário, Caio Megale acredita que o Banco Central deva ficar mais conservador e mantém a expectativa de que o ciclo de cortes da taxa Selic comece em janeiro do ano que vem.
“A tarifa de 50% me deixa mais confortável com janeiro. Antes, com a inflação melhorando, havia até a possibilidade de o Comitê de Política Monetária (Copom) antecipar os cortes para dezembro ou novembro. Agora, o ambiente favorece uma abordagem mais cautelosa”, diz.
Com relação às bolsas de valores, a XP avalia que o Brasil deve continuar em ambiente favorável no segundo semestre, com o Ibovespa, principal índice de ações, chegando a 150 mil pontos até o final do ano.
Já do ponto de vista dos juros, a perspectiva é que o País entre em um regime mais favorável, com expectativa de queda. “Nossa previsão é que os juros no Brasil comecem a cair em algum momento nos próximos nove ou doze meses, e isso traz um upside adicional para essa previsão do Ibovespa”, afirmou Megale. A expectativa da XP é que a taxa Selic chegue a 12,5% em 2026.
Embraer será uma das empresas mais afetadas
Segundo o estrategista-chefe e head de Research da XP, Fernando Ferreira, a Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer) é uma das empresas que devem sofrer impactos mais relevantes. Isso porque 24% das receitas da empresa vêm de exportações para os Estados Unidos.
“Aqui é importante a gente olhar empresas que possuem exportações do Brasil para os EUA, e não aquelas que têm percentual da receita alta nos EUA, como é o caso da JBS, Gerdau e outras companhias, porque nesses casos não há incidência de tarifas”, explica Ferreira.
Ainda assim, ele enfatiza os impactos modestos e cita que, até agora, o Ibovespa caiu 1,1%; o dólar, que abriu o dia mais depreciado, voltou para R$ 5,59; e o preço do minério de ferro subiu 3% na China, o que deve ajudar a segurar o impacto no índice.
A dúvida, agora, segundo Ferreira, é se essas tarifas vão perdurar ou não. “Desde o início, o governo norte-americano anuncia as tarifas e depois senta para negociar. Então, é nisso que o mercado está atento, além de qual vai ser a retaliação do Brasil e quais serão os impactos indiretos dessa história. Bastante coisa para monitorarmos nos próximos meses”, conclui.
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