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Salários são maiores nas fábricas

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Rendimento real supera a média de todas as outras atividades em Minas, aponta o IBGE

A indústria é um setor fundamental para o mercado de trabalho em Minas Gerais. Segundo o Relatório Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho e Emprego, o setor industrial empregou formalmente 1.148.179 pessoas em 2020 ou 23,8% dos empregados formais da economia mineira – percentual abaixo apenas do setor de serviços, que oferece 51,6% das vagas.

Segundo a Rais, os industriários mineiros geraram uma massa salarial de cerca de R$ 36 bilhões, correspondendo a 23,6% do total que circulou no Estado. Em torno de 16% destes trabalhadores estão na indústria de alimentos, 9,9% na construção de edifícios, 9,6% em obras de infraestrutura, 6,9% em serviços para construção, 5,4% na metalurgia e 4,5% no segmento de vestuário e acessórios, percentual semelhante ao universo ocupado na indústria de veículos, que é de 4,3%.

Dados mais recentes e específicos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam a indústria como o terceiro grupamento de atividade que mais emprega no Estado. Tomando como base a última publicação do IBGE, referente ao primeiro trimestre de 2022, 13,98% de toda força de trabalho ocupada em Minas Gerais trabalhavam na indústria, o que representa 1,45 milhão de pessoas.

Acima da indústria, os grupamentos de atividade que mais empregavam em Minas eram o comércio (1,86 milhão) e administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde humana e serviços sociais (1,64 milhão). O percentual da força de trabalho ocupada na indústria em Minas Gerais era maior do que a média nacional (12,94%) no primeiro trimestre de 2022.

Tais discrepâncias devem-se, entre outros motivos, ao fato de que a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE, além de considerar grupamentos profissionais diferentes, também inclui em seus levantamentos os trabalhadores informais – e seus dados são pelo menos um ano mais novos que as da Rais.

O rendimento médio real do trabalho, segundo o IBGE, é mais alto na indústria do que na média estadual de todas as atividades. “Enquanto o rendimento médio das pessoas ocupadas na indústria era de R$ 2.326,00, o rendimento médio de todos os ocupados no Estado era de R$ 2.172,00 no primeiro trimestre de 2022, o que denota maior qualidade desses postos de trabalho”, informa o coordenador da Pnad em Minas, Alexandre de Lima Veloso.

A pesquisa também verificou que a atividade industrial em Minas Gerais já operava no primeiro trimestre de 2022 com nível de ocupação superior aos níveis pré-pandemia. “No primeiro trimestre de 2020 havia 1,37 milhões de pessoas no Estado ocupadas na indústria, número que chegou a 1,45 milhão no primeiro trimestre de 2022”, completa Veloso.

É importante ressaltar que a indústria exerce uma forte relação com os demais setores da economia, seja fornecendo máquinas e insumos para a agropecuária, seja demandando serviços como transportes e atividades de pesquisa e desenvolvimento. Dessa forma, a importância da indústria na geração de emprego e renda vai além dos 23%, observa o coordenador de Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), João Gabriel Pio.

“A indústria é relevante quando se considera o emprego formal, com a vantagem de que ela é multiplicadora, devido à sua forte interdependência com outros setores de uma longa cadeia produtiva. Por isso, se calcula que cada emprego na indústria gera outros quatro na economia, porque ela é muito conectada, tem muito fornecedor tanto de produtos quanto de serviços, que é o maior empregador. E é um setor extremamente dinâmico, que absorve e cria tecnologia e inovação”, destaca o especialista.

Qualificação

Mas a indústria tem vários desafios pela frente. Entre eles, a volta do crescimento econômico, fator fundamental para não só manter, como para gerar empregos. Outro desafio é a transformação dos processos no mercado de trabalho, que pede a utilização crescente de tecnologias, inclusive disruptivas, acentua Pio.

“Para isso, o Brasil tem que investir no aperfeiçoamento, na qualificação e na requalificação de sua força de trabalho durante toda a trajetória profissional. Quem não incorporar novos conhecimentos para acompanhar as mudanças tecnológicas, certamente será excluído do mercado de trabalho”, prevê.

Nesta tarefa, as empresas e os próprios profissionais contam com um importante parceiro: o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), que está fazendo exatos 80 anos em 2022. Hoje, o Senai, braço de formação profissional da Fiemg, é um dos cinco maiores complexos de educação profissional do mundo e o maior da América Latina.

Seu principal objetivo é apoiar 281 áreas industriais por meio da formação de recursos humanos e da prestação de serviços técnicos e tecnológicos. Os programas de capacitação profissional são oferecidos nas modalidades de aprendizagem, habilitação, qualificação, aperfeiçoamento, técnico, superior e pós-graduação.

Segundo João Gabriel Pio, o Senai contribui efetivamente para este processo, mais do que nunca necessário, de adaptação profissional, já que está sempre acompanhando o mercado de trabalho e oferecendo novos cursos de acordo com as novas necessidades.

Desburocratização

Para o presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, as iniciativas de simplificação e desburocratização das normas tributárias, atualmente em prática pelo governo do Estado, são outro fator importante para estimular a criação de empregos, à medida em que contribui para a melhoria do ambiente de negócios.

“Essa é a dinâmica essencial. A indústria mineira, que é fruto dessas simplificações, é aquela que teve um crescimento de 10% no ano passado, enquanto a média nacional foi de 3,9%. Um crescimento que se transforma em mais empregos, mais renda, enfim, em maior ganho social”, afirma.

Vagas abertas no setor industrial sobem 39%

O site Empregos.com.br registrou um aumento de 39% de vagas no setor da indústria no primeiro trimestre de 2022, comparado ao 1º trimestre de 2021. “O site Empregos.com.br oferece cerca de 3.400 vagas abertas para a indústria no País. O crescimento é impulsionado pelo reaquecimento da economia pós-pandemia. A expectativa é que o consumo continue crescendo e que estimule o aumento das vagas”, analisa o diretor de Marketing da plataforma, Leonardo Casartelli.

Nestas mais de 3 mil vagas, os cargos que mais se destacam são auxiliar de produção, motorista de caminhão, ajudante geral, operador de máquinas, mecânico de manutenção e logístico. “Podemos dizer que a demanda do setor deve incluir vagas que exigem menor qualificação até profissionais com ensino técnico e superior, mas vale ressaltar que mesmo os cargos já existentes exigem uma maior qualificação do que se exigia antes”, diz Casartelli.

De acordo com um estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o Mapa do Trabalho Industrial 2022-2025, o setor precisará de 2 milhões de trabalhadores qualificados em formação básica para repor mão de obra e preencher novas vagas até 2025.

O relatório mostra ainda que uma parcela de 7,6 milhões de pessoas que trabalham na indústria ou já têm formação vão precisar passar por novos aperfeiçoamentos profissionais para seguir atuando em seus postos de trabalho. Isso quer dizer que quase a totalidade dessa força profissional precisa se atualizar.

Mesmo neste mercado de trabalho com pouca capacitação, além de altos índices de desemprego e informalidade, os empresários relatam dificuldades com mão de obra. Esse quadro se aplica não só à falta de profissionais qualificados, mas também daqueles formados no chão da fábrica.

“O que os empregadores precisam avaliar é que, com inflação alta, o salário do trabalhador tem menor poder de compra, fazendo com que ele dê preferência a formatos de contratação que tenham menor impacto no valor líquido recebido, mesmo que seja informal”, observa Casartelli.

“Como alternativa para ser mais atrativo, além do reajuste de salário, o empregador pode oferecer benefícios complementares que gerem uma redução nos custos no dia a dia do trabalhador, como cesta básica mais completa, vale-alimentação para serem utilizados em mercados ou ainda convênio com estabelecimentos comerciais”, sugere.

Uma realidade para a qual o presidente do Sindicato da Indústria da Panificação (SIP-MG), Winicius Segantine Dantas, está atento. “Num país de desempregados, estamos tendo dificuldades de contratação e os pedidos de demissão já vêm crescendo dentro das empresas”, afirma.

Envolvimento

Segundo ele, a questão vai além do salário. “Estamos percebendo que o jovem quer mais liberdade e precisa ser estimulado a se envolver com a empresa, se sentir produtivo e necessário. Muitos deles querem trabalhar em home office, mas na nossa atividade, a panificação, a mão de obra quase toda tem trato direto com a produção ou o cliente”, ressalta.

Neste contexto, o empresário está trabalhando com profissionais da área de recursos humanos e fazendo entrevistas dentro da empresa para detectar o que seria interessante para estimular seu pessoal. “Já pensamos em oferecer um almoço, por exemplo, que pode ser um diferencial tanto para quem sai muito cedo de casa para o primeiro turno quanto para quem vem no segundo e chega mais tarde em casa. Mas sabemos que o mais importante é criar um vínculo do funcionário com a empresa, levar até ele o conhecimento e as possibilidades de crescimento interno”, ressalta.

Formação profissional é grande desafio

A professora de pós-graduação em gestão de pessoas na PUC Minas e business partner na Pasa, empresa do Grupo Vale, Silvia Loyola Vieira da Silva, avalia que a indústria ainda completa a formação escolar. Mas isso não deve continuar assim por muito tempo. “O que deve vir no futuro é o aprender a aprender. Com a disponibilidade de informações, compartilhamento de conhecimentos, cursos, cada vez mais a pessoa deve ser a protagonista do seu próprio desenvolvimento”, indica a professora.

Para ela, vai contar menos a formação técnica/acadêmica e mais a disponibilidade da pessoa em buscar conhecimento e habilidades, da forma que for melhor para ela. “Como a academia está sempre um passo atrás nas questões que envolvem tecnologia aplicada, torna-se difícil para elas fornecer as bases pragmáticas que caracterizam a indústria. Dessa forma, as empresas precisam formar multiplicadores internos e definir procedimentos operacionais padrão para operar, manter e prevenir danos às máquinas e equipamentos”, explica.

Há um fenômeno recente no mercado de trabalho e que se nota com maior evidência nos EUA. Great Resignation – algo como “Grande Demissão” ou “Grande Renúncia” – é o nome dado ao grande volume de pessoas que pediram demissão de seus trabalhos nos últimos meses de 2021. Uma pesquisa da MIT Sloan – importante publicação americana sobre o mercado de trabalho – identificou cinco grandes fatores que ativaram esse processo:

Por que as pessoas pedem demissão?

1. Cultura corporativa tóxica, que não valoriza o individual e sem foco em ESG.
2. Insegurança no trabalho, com escopo reduzido de trabalho, redução de contingente, pouco cuidado com os empregados e trabalho em excesso.
3. Alto nível de inovação, gerando a percepção no profissional de não conseguir acompanhar o ritmo de inovação.
4. Falta de reconhecimento das conquistas e realizações
5. Forma como a empresa lidou com a Covid 19

Para Silvia Loyola, neste contexto, algumas reflexões são necessárias. Para começar, o futuro nos guarda um mundo diferente, com profissões que ainda não conhecemos. “O trabalhador da indústria poderá estar em qualquer país operando uma máquina. A força braçal será substituída por atividades em que o humano não é substituível”, prevê.

O trabalhador do futuro, segundo a professora, terá mais autonomia nas decisões. “Será um profissional mais polivalente, que exerce todas as suas competências para um bem maior e não só para aquele pequeno espaço na linha de produção. O compartilhamento de conhecimento, acompanhado do aumento da confiança entre empregado e empresa, fará com que a hierarquia se torne cada vez mais irrelevante na soma das responsabilidades, que se sustentarão na entrega de resultados”, finaliza a professora.

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