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Fantasma da crise hídrica perdura em Minas Gerais

Crédito: Vale/Divulgação

Sérgio Menin Teixeira de Souza e Patrícia Helena Gambogi Boson*

Notícias recentes e frequentes alertam sobre a possibilidade de desabastecimento de água em Belo Horizonte. O noticiário despertou na comunidade técnica a necessidade de, mais uma vez, chamar a atenção sobre a situação hidrológica crítica, não só para o abastecimento na Região Metropolitana de Belo Horizonte, como em todo o Estado de Minas Gerais.

Primeiramente, é necessário pontuar, como especialistas no campo da gestão de recursos hídricos e para que a solução correta sobre as mesas de diálogo e decisão possa ser posta, que a situação hidrológica do abastecimento de água na Região Metropolitana de Belo Horizonte, através de um sistema integrado, com captações nas bacias hidrográficas dos rios das Velhas e Paraopeba, é precária. Tanto em regime natural como em regime regularizado por grandes reservatórios.

Um desabastecimento drástico, naquele episódio mais crítico de 2015/2016, só pôde ser evitado por conta de um programa rigoroso de racionamento ao consumo e por um recurso improvisado de construção de outras captações provisórias. Ou seja, a captação suplementar no rio Paraopeba jamais foi posta como uma solução definitiva e hoje está, conforme informado, sob risco de não atender à demanda para a qual foi desenhada, limitada no tempo e no espaço, devido ao impacto advindo do rompimento da barragem de rejeitos de mineração em Brumadinho.

Para esse cenário, a Comissão Técnica de Recursos Hídricos da Sociedade Mineira de Engenheiros, desde agosto do ano passado, por meio de ofícios, notas técnicas e pareceres, vem informando a sociedade e as autoridades públicas para o atual estado de baixa acumulação nos reservatórios, assim como – e principalmente – para a circunstância de estarem as bacias hidrográficas dos rios das Velhas e Paraopeba bastante descarregadas. Tal condição permite supor a continuidade da situação crítica, indicando a possibilidade concreta, nos anos imediatos, da repetição de limitações forçadas ao consumo humano e econômico.

De fato, o que nós especialistas constatamos, é que, nos últimos cinco anos, Minas Gerais foi submetido a oscilações muito adversas nos fenômenos hidrometeorológicos. Se, compatíveis com a variabilidade estatística presumível para esses processos naturais, resultam em situações muito desfavoráveis, tal como a grande diminuição dos armazenamentos hídricos (perceptível nos reservatórios ou nos lagos naturais e menos visível, mas igualmente presente, nas reservas subterrâneas).

Na prática, a situação geral tecnicamente observada em maior ou menor grau, em quase todo o território estadual, pode ser resumida na seguinte constatação: as bacias hidrográficas estão fortemente descarregadas, em quantidade muito mais significativa do que a visível diminuição do volume existente nos reservatórios de abastecimento. Recarregar essas bacias, mesmo admitida a incerta recuperação do regime normal de precipitações, ou por meio da discutível instalação de infraestrutura verde, demandará muito tempo. Em termos mais simples – a menos que um fenômeno oposto e de maior intensidade ocorra imediata e generalizadamente – é de se esperar a persistência de estiagens críticas no horizonte dos próximos anos.

Diante desse cenário, alerta a Comissão da SME que as disponibilidades hídricas efetivas nessas circunstâncias precisam ser muito bem administradas pelo sistema público de gestão das águas, focando, principalmente, a emissão ou revisão racional dos processos de alocação para os diversos usos dos recursos hídricos. Entretanto, desafortunadamente e em que pese o esforço da atual equipe, o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos apresenta, hoje, uma estruturação funcional bastante inadequada e uma capacidade operacional limitadíssima, o que impossibilita uma atuação adequada na importante tarefa de administrar nossas coleções hídricas.

A relativa fartura das disponibilidades hídricas e a razoável regularidade sazonal do regime hidrológico em Minas deveriam fazer com que a água não viesse a se transformar em fator limitante para o desenvolvimento econômico e social, conforme já se verifica no período recente, projetando um quadro ainda mais desfavorável para o futuro imediato: risco de impacto sobre algumas instalações industriais estratégicas e empreendimentos de agricultura irrigada e de afastamento de investimentos importantes para a retomada de crescimento econômico.

Fato é, todas essas questões resultaram ou ainda ocorrerão, principalmente, por conta da inexistência atual de um sistema estruturado e competente para a gestão de recursos hídricos no Estado de Minas Gerais.

*Sérgio Menin é presidente e Patrícia Boson é secretária-executiva da Comissão Técnica de Recursos Hídricos da SME

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