Finanças

Crise do Banco Master não afasta investidores, mas aumenta a cautela no mercado

Especialistas afirmam que pequenos investidores devem ser ressarcidos pelo FGC, mas episódio expõe riscos, pressiona instituições a reforçar controles e acende alerta para grandes aplicadores
Crise do Banco Master não afasta investidores, mas aumenta a cautela no mercado
Foto: Divulgação Banco Master

Depois da liquidação extrajudicial do Banco Master, decretada pelo Banco Central nessa terça-feira (18), o Diário do Comércio ouviu especialistas para entender se o episódio pode afastar investidores do mercado ou gerar uma crise de confiança no sistema financeiro brasileiro. O processo foi motivado por “grave crise de liquidez” e “graves violações” às normas do sistema financeiro, segundo o Banco Central.

Para o advogado especializado na defesa de investidores vítimas de fraudes e sócio do escritório Calazans e Vieira Dias Advogados, Jorge Calazans, o caso expõe a vulnerabilidade de milhares de investidores e credores que acreditaram estar em terreno seguro. “Muitos desses investidores estão descobrindo, na prática, onde termina a proteção do sistema e onde começa o risco assumido individualmente”, afirma.

Calazans explica que o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) não é um cofre “infinito”, tampouco um seguro geral para qualquer investimento. “Ele protege depósitos e aplicações elegíveis até o limite de R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, por instituição, respeitando um teto global por período”, esclarece.

Portanto, quem está dentro desse limite, em produtos cobertos, deve ser ressarcido diretamente pelo FGC, em um procedimento administrativo relativamente padronizado. Sobre esse processo, o especialista e sócio da Valor Investimentos, Daniel Teles, comenta que, até o momento, os clientes estão tendo uma boa experiência ao solicitar o recurso.

Para Calazans, o problema começa justamente onde o FGC termina. “Grandes aplicadores, empresas que concentraram caixa no Banco Master, investidores profissionais e credores comerciais do grupo foram lançados em um cenário muito mais incerto”, diz.

Para a parcela que excede o limite do FGC, o investidor passa a depender da liquidação do banco, da qualidade dos ativos remanescentes, da ordem legal de preferência e da capacidade do liquidante de transformar patrimônio em recursos para pagar a fila de credores.

Com isso, o caso do Banco Master deixa três lições “incômodas”. A primeira, para o investidor, é que rentabilidade acima da média quase sempre significa risco acima da média, “ainda que isso não seja dito de forma explícita no momento da oferta”, explica Calazans.

A segunda lição é para o sistema financeiro. “A atuação coordenada de Banco Central, FGC, órgãos de controle e Justiça precisa ser rápida e transparente para evitar que a perda de confiança em um caso específico se transforme em medo generalizado”, defende.

A terceira é para os credores de maior porte: “Em cenários como este, não há espaço para imobilismo. Quem se organiza, habilita seu crédito com técnica, questiona decisões, busca responsabilização dos verdadeiros responsáveis e acompanha de perto a evolução da liquidação tende a sofrer menos do que quem espera, silenciosamente, que o sistema resolva”.

Caso do Banco Master não deve afastar investidores

Daniel Teles, da Valor Investimentos, acredita que o caso não vai afastar investidores do mercado, mas que tanto investidores individuais quanto profissionais ficarão mais criteriosos. “O investidor vai passar a procurar saber um pouco mais sobre a saúde do banco em que está comprando um CDB, por exemplo”, comenta.

Segundo Teles, mesmo com o mecanismo de segurança, as pessoas não vão querer — e nem devem — acionar o FGC o tempo todo. “Se for para comprar CDB assim, o Fundo Garantidor perde o sentido, porque ele serve para uma intervenção quando ocorre algum problema e não como um mecanismo para ser acionado continuamente”, diz.

O matemático e especialista em finanças, e também fundador da T2 Educação, plataforma educacional para o mercado financeiro, Tiago Feitosa, concorda que o episódio do Banco Master não deve afastar o investidor do mercado, embora deva gerar mais cautela. “Defendo essa tese porque, na prática, o pequeno investidor deve receber o valor aportado em títulos do Banco Master pelo FGC”, comenta.

Por outro lado, Feitosa acredita que o episódio tende a abrir discussões sobre a concentração de risco por parte de investidores institucionais. “O caso do Master trouxe à tona a exposição que alguns fundos de pensão tinham na instituição, e isso pode comprometer a aposentadoria de servidores públicos que confiam suas respectivas aposentadorias nesses fundos”, pontua.

Além disso, outra discussão que deve ganhar força, na visão de Feitosa, é o uso publicitário do FGC: “O FGC é um mecanismo de proteção ao investidor e ao sistema financeiro como um todo e não deveria ser utilizado como destaque na publicidade de produtos de investimento”.

Presidente da OAB-MG diz que confiança no sistema pode ser reforçada

O presidente da Comissão de Direito Empresarial da OAB-MG, Marcelo Marçal, acredita que a crise do Banco Master pode ser uma oportunidade para o sistema financeiro brasileiro reforçar a confiança dos investidores, caso as autoridades conduzam bem a solução.

“Se o mercado demonstrar capacidade de resolver a situação de forma transparente e eficaz, pagando credores pelo fundo garantidor, liquidando os ativos e punindo os responsáveis, isso pode reforçar a confiança no longo prazo porque mostra que o sistema funciona. Porém, se houver falhas ou surpresas adicionais, aí sim o impacto pode ser maior”, afirmou.

Na avaliação de Marçal, tudo dependerá de como as instituições reguladoras e o mercado reagirem: “O fato de um banco intermediário passar por uma ocorrência tão dramática — com prisão e liquidação extrajudicial — pode levar investidores a questionarem a transparência e a governança desses bancos médios”.

Segundo o especialista, se muitos investidores começarem a duvidar da solidez desse tipo de instituição, que oferece produtos de alto rendimento, pode haver uma migração para bancos maiores, ativos garantidos ou outros investimentos menos arriscados.

Por outro lado, Marçal afirma que a liquidação está sendo conduzida de forma organizada. “A liquidação extrajudicial determinada pelo Banco Central teve a nomeação de um liquidante para apurar ativos e passivos. Isso reduz a chance de um colapso desordenado”, diz.

Conforme pontua Marçal, o caso pode levar outras instituições financeiras a enxergarem o episódio como um alerta para reforçar controles e adotar práticas mais conservadoras. “Paradoxalmente, isso pode até fortalecer a confiança, no médio prazo, em bancos regulamentados”, conclui.

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