BC avalia efeitos do aperto monetário

Brasília – O Banco Central avaliou que uma elevação adicional da taxa Selic na semana passada teria reforçado postura de vigilância e refletiria uma atividade econômica mais forte do que esperada, mas a decisão final de manter a taxa em 13,75% considerou cautela e necessidade de avaliar os impactos do aperto feito até agora nos juros, conforme ata do Comitê de Política Monetária (Copom) publicada ontem.
O BC também realizou um exercício alternativo e estimou que a inflação em 2023 e 2024 poderá ficar mais alta do que suas projeções atuais se o nível de ociosidade da economia brasileira estiver menor do que o estimado agora pela autarquia.
De acordo com o documento, as opções de deixar a Selic no mesmo nível e de elevá-la em 0,25 ponto percentual foram “amplamente debatidas”. A decisão de manter a taxa, segundo a ata, foi tomada diante dos dados divulgados, projeções, expectativas de inflação, balanço de riscos e defasagens dos efeitos da política monetária.
A decisão do Copom da semana passada foi a primeira tomada de forma não unâmime pelo colegiado em seis anos em meio, com dois diretores votando por uma elevação residual de 0,25 ponto percentual da taxa básica de juros.
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“Esses membros argumentaram que a alta adicional fortaleceria a mensagem de comprometimento do Comitê com sua estratégia, diante da elevação das expectativas de inflação e da projeção no cenário de referência para o ano de 2024, em ambiente de incerteza sobre o nível do hiato do produto e a dinâmica da atividade”, disse a ata.
Segundo o documento, os membros divergentes (Fernanda Guardado e Renato Gomes) avaliaram que os riscos de alta da inflação podem ter impactos mais duradouros caso se materializem.
Na semana passada, o BC manteve a Selic em 13,75% ao ano, interrompendo seu agressivo ciclo de aperto monetário para controlar a inflação, mas ponderou que segue vigilante e não hesitará em retomar as altas nos juros se a redução dos preços não transcorrer como o esperado.
Economia aquecida
Diante do risco de alta da inflação gerado por um eventual hiato do produto mais estreito do que o utilizado em seu cenário –uma indicação de que a economia poderia estar aquecida a ponto de pressionar a inflação–, o BC fez um exercício para avaliar o tema, embora cite incerteza sobre essa medição.
Pressupondo um cenário alternativo em que o hiato atingiria no terceiro trimestre deste ano o nível zero (quando o desempenho da atividade econômica alcança seu patamar potencial), a autarquia apontou que as projeções de inflação seriam de 4,9% em 2023 e de 3,0% em 2024. No cenário de referência usado atualmente, as expectativas do BC para o IPCA estão mais baixas, em 4,6% para 2023 e 2,8% para 2024.
O BC destacou que o mercado de trabalho seguiu em expansão no país, ainda que sem reversão completa da queda real dos salários dos últimos trimestres, e reforçou que grande parte do efeito do aperto monetário feito até o momento ainda não ocorreu.
A autarquia disse que a opção recente de dar ênfase ao período de seis trimestres à frente para o foco da política monetária está condicionada ao caráter temporário dos cortes de impostos implementados pelo governo. E antecipou que, se a desoneração de combustíveis for mantida ano que vem, voltará a enfatizar horizontes que incluam o primeiro trimestre de 2023.
Para o BC, porém, esse quesito não trará impacto relevante sobre a política monetária porque os efeitos primários dessa redução tributária já estão sendo desconsiderados em seus cenários.
A autarquia disse ainda que não houve mudança substancial nos canais de transmissão de política monetária e que o repasse da alta da Selic para taxas finais de crédito tem ocorrido conforme o esperado, ainda que as concessões para empresas sigam mais robustas que o previsto.
Ao avaliar que a mediana das expectativas de mercado para o IPCA em 2024 tem subido, a ata apontou que todos os membros do Copom concordam que é papel primordial do BC “a condução de uma política monetária compatível com a ancoragem das expectativas em prazos mais longos, fortalecendo continuamente a sua credibilidade e reduzindo o custo desinflacionário futuro.”
Risco fiscal
No documento, o BC voltou a questionar o quadro fiscal do País, em meio a promessas de candidatos à eleição de manter repasses sociais turbinados e corrigir a tabela do Imposto de Renda no ano que vem, sem detalhar fontes de custeio das medidas.
Para o Copom, um aumento de gasto permanente e a incerteza sobre a trajetória das despesas a partir de 2023 podem elevar os prêmios de risco do País e as expectativas de inflação.
“Há vários canais pelos quais a política fiscal pode afetar a inflação, incluindo seu efeito sobre a atividade, preços de ativos, grau de incerteza na economia e expectativas de inflação”, disse.
Em relação ao cenário externo, o BC avaliou que o mercado de trabalho em economias avançadas segue aquecido, mas disse que há perspectiva de desaceleração global nos próximos trimestres, com a reversão de gastos temporários em diversos países, guerra na Ucrânia e política de combate à Covid-19 na China.
Com a “normalização incipiente” nas cadeias de suprimentos e acomodação de preços de commodities, o Copom avaliou que deve haver uma moderação na pressão inflacionária global ligada a bens, mas afirmou que a baixa ociosidade no mercado de trabalho indica que a pressão sobre serviços pode demorar a dissipar.
Para o Copom, com a política monetária caminhando para o campo restritivo em países avançados, há impacto sobre as expectativas de crescimento e uma elevação do risco de “movimentos abruptos de reprecificação de mercados”.
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