Finanças

Brasil deve registrar deflação neste mês

Medidas do governo devem conter os preços no curto prazo, porém, em um cenário mais amplo, os efeitos são uma incógnita
Brasil deve registrar deflação neste mês
Paulo Henrique Duarte estima que a inflação neste ano deve ficar abaixo de dois dígitos após a limitação da alíquota do ICMS | Crédito: Rafael Tomaz

Se por um lado os esforços do governo para conter a inflação prometem alívio nos preços no curto prazo, por outro representam uma incógnita quanto às consequências num período mais longo. Especialistas preveem um contexto de arrocho financeiro estendido por uma série de fatores, incluindo as incertezas quanto às eleições presidenciais e as pressões internacionais causadas pela Guerra na Ucrânia e os lockdowns realizados na China em combate a novos casos de Covid-19.

A definição de teto da alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Kamikaze, que prevê ajudas financeiras à população e a determinadas classes profissionais, são alguns exemplos de medidas que já deverão trazer algum efeito neste e no próximo mês. A avaliação é do economista da Valor Investimentos, Paulo Henrique Duarte.

Segundo ele, é possível que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fique negativo em julho e agosto. Para o ano, a expectativa do economista é que a inflação se encerre entre 7% e 7,5%. As estimativas vão ao encontro das previsões do Ministério da Economia, que atualizou na quinta-feira (14) as projeções de estatísticas macroeconômicas para o exercício. Dentre as revisões, a pasta projeta agora que a inflação vá terminar 2022 em 7,2%. A projeção foi reduzida em relação à anterior, de 7,9%.

“A grande questão é que a inflação atual não é um problema isolado do Brasil. Os Estados Unidos, por exemplo, estão enfrentando o pior cenário desde a Crise do Petróleo na década de 1980. Trata-se de um cenário que os bancos centrais modernos não estavam acostumados a lidar. Os contextos até então enfrentados foram resolvidos apenas com a injeção de dinheiro. O de agora pede mais articulação e maior envolvimento. Como o que o nosso Banco Central (BC) iniciou no ano passado, com a elevação das taxas de juros e que agora vem sendo realizado por instituições financeiras do mundo inteiro”, explica.

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Elevação da Selic é caminho para controle da inflação mas traz consequências

Sobre a Selic, Duarte acredita em uma nova elevação por parte do BC, encerrando o ano em 13,75%. Patamar que, em sua avaliação, deverá ser mantido até meados de 2023. Entretanto, o especialista alerta que, justamente pela atual curva da inflação conter reflexos de questões mundiais, até mesmo o aumento dos juros acaba com poder restrito de conter a alta dos preços. E, ainda assim, poderá trazer consigo, a recessão.

Neste sentido, ele explica que os preços deverão se acomodar, como já ocorre, por exemplo, com o minério de ferro, cuja cotação bateu a casa dos US$ 220 a tonelada em meados do ano passado e agora se encontra abaixo dos US$ 100. O efeito ao consumidor, porém, perdurará por mais tempo, devido aos impactos na cadeia e ao longo do tempo.

“É isso que causa o desequilíbrio entre a oferta e a demanda. E dentro desta dinâmica, os preços continuam subindo, a economia desacelera, o desemprego aumenta e o salário também é puxado para baixo”, avalia.

As medidas governistas sob os olhos do mercado

Dessa maneira, a visão do mercado quanto às medidas que vêm sendo adotadas é de um bom efeito no curto prazo, mas causando uma “ressaca” no médio, causando efeitos nos próximos dois anos. Conforme Duarte, não é possível dizer que os investidores foram pegos de surpresa, porque “o governo Bolsonaro já vem abandonando as principais bandeiras econômicas há algum tempo”. E também não dá para desassociar as ações da proximidade das eleições. O economista diz que esse é um movimento histórico e global.

“Ano de eleição é sinônimo de comprometimento da responsabilidade fiscal. Esta é uma dinâmica que acontece há anos e se confirma agora com as movimentações do atual governo. O que é inédito desta vez, em relação à PEC, é que teve um apoio irrestrito até mesmo da suposta oposição, em virtude do cenário turbulento que vivemos. Em termos econômicos, a proposta traz efeitos desconfortáveis. Não que não deveria ser feita, mas precisava seguir a Lei de Diretrizes Orçamentárias e especificar de onde os recursos irão sair”, afirma.

Por fim, em relação ao desempenho da economia brasileira como um todo, o especialista fala em crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na casa de 1,5%. O Ministério da Economia, por sua vez, decidiu elevar de 1,5% para 2% a projeção para este exercício. Ele lembra que o Brasil, ao contrário do restante do mundo, já entrou na pandemia em uma situação desfavorável, saindo de uma crise anterior.

“Alguns já falam em uma segunda década perdida”, diz em alusão à década de 1980 no Brasil, que ficou conhecida assim em função de uma série de impactos econômicos, inclusive o descontrole inflacionário como o que ocorre nos dias atuais.

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