Caminho para corte na Selic no 2º semestre

São Paulo – O Banco Central pode ter decepcionado agentes financeiros que esperavam uma sinalização clara de que o Comitê de Política Monetária (Copom) daria início ao ciclo de flexibilização da taxa básica em agosto, mas não necessariamente eliminou essa possibilidade, uma vez que atrelou as próximas decisões a dados, apontam economistas.
Ao manter a Selic em 13,75% ao ano na véspera, o Copom afirmou que a conjuntura demanda “paciência e serenidade” na condução da política monetária e citou que os passos futuros dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, expectativas de inflação e o hiato do produto, entre outros fatores. “A conjuntura atual, caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação desancoradas, segue demandando cautela e parcimônia”, afirmou a autoridade monetária.
O Copom ainda acrescentou que “conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas e avalia que a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado tem se mostrado adequada para assegurar a convergência da inflação”.
Para o economista-chefe da XP, Caio Megale, o Copom ter mencionado alguma melhora nas perspectivas de inflação “abre as portas para um possível corte na próxima reunião”. Em paralelo, acrescentou, a visão de que o cenário continua exigindo cautela e parcimônia significa que o primeiro corte não será agressivo.
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Ele ressaltou que o último parágrafo do comunicado é fundamental, com o BC sinalizando que cautela e parcimônia permanecem cruciais, mas afirmando que a estratégia de manter a Selic nos níveis atuais por um longo período “tem sido adequada”. A declaração anterior afirmava que o BC seguiria “avaliando se manutenção da taxa básica de juros por período prolongado será capaz de assegurar convergência da inflação”.
“É um sinal de que manter a taxa Selic estável à frente não é necessariamente o plano do comitê”, avalia Megale, citando ainda que o BC retirou menção a um cenário alternativo em que não hesitaria em retomar o ciclo de aperto caso o processo desinflacionário não ocorresse conforme o esperado.
Dovish – Para o chefe de economia para Brasil e de estratégia para América Latina do Bank of America, David Beker, o comunicado é mais um passo na comunicação da autoridade monetária rumo a uma postura mais dovish, embora não seja uma promessa de corte de juros na próxima reunião.
Entre os pontos que considerou como dovish ou potencialmente mais inclinados a uma redução de juros, ele destacou também a exclusão no comunicado pelo BC da promessa de não hesitar em retomar o ciclo de aperto e ainda a retirada do cenário alternativo em que a Selic é mantida em 13,75% no horizonte relevante.
Na visão de Beker – que manteve sua previsão de um primeiro corte da Selic em agosto, com uma redução de 0,50 ponto – , além da dependência dos dados, o Copom também aguarda a decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN) sobre a meta de inflação na próxima semana e novas melhorias nas expectativas de inflação antes de cortar as taxas.
“Ainda faltam sete semanas para essa decisão, e o CMN deve manter a meta de inflação em 3%, as impressões mensais da inflação devem continuar surpreendendo para baixo, e novas revisões nas expectativas de inflação de longo prazo devem acontecer até lá”, afirmou.
O CMN, formado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reúne-se no próximo dia 29 para definir a meta de inflação de 2026. As metas de 2024 e 2025 estão fixadas em 3%.
Economistas do Bradesco reiteraram previsão do início da flexibilização monetária em setembro, citando que, embora os dados de inflação tenham evoluído de maneira mais favorável desde a última reunião, o Copom trouxe poucos elementos que indiquem início iminente do ciclo de redução de juros. No entanto, afirmaram não descartar “um corte de juros em agosto, caso a evolução das variáveis destacadas pelo Copom continue favorável”.
Assim como os colegas do Bradesco, a equipe do Itaú BBA também avaliou que o comitê não indicou uma saída iminente da estratégia de manter a taxa de juros no patamar atual – ou seja, um corte em agosto).
“Ainda esperamos que o Copom inicie o ciclo de flexibilização na reunião de setembro”, afirmaram, reforçando a sinalização do BC de que os próximos passos dependerão da evolução da dinâmica inflacionária. “Aprenderemos mais sobre a visão das autoridades na próxima semana, com a divulgação da ata da reunião na terça-feira, 27 de junho”, finalizaram.
Comunicado veio “muito ruim”, diz Haddad

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse ontem que o último comunicado do Comitê de Política Monetária do Banco Central veio “muito ruim”, um dia depois de a autoridade monetária anunciar a manutenção da taxa Selic em 13,75% ao ano e não sinalizar com clareza a possibilidade de cortes de juros em agosto.
“O comunicado, como de hábito, o quarto comunicado muito ruim”, disse Haddad a repórteres em Paris, onde acompanha o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em viagem.
Na véspera, o Copom manteve um tom duro ao avaliar o processo de desinflação no Brasil, defendendo que é preciso ter “paciência” no controle dos preços. Boa parte dos mercados financeiros esperava algum tipo de aceno a um afrouxamento monetário em agosto.
Haddad – que há meses vem criticando o nível da Selic, assim como outros membros do governo – disse que muitas vezes o Banco Central “corrige” o tom de seu comunicado na ata da reunião, que é divulgada na terça-feira seguinte ao encontro, mas argumentou que isso não alivia o que chamou de “descompasso” entre a conjuntura macroeconômica do país e o nível da taxa de juros.
O ministro destacou o recente arrefecimento do dólar frente ao real, alívio na curva de juros e a resiliência da atividade econômica como pontos positivos. “É claro o sinal de que podíamos sinalizar um corte da taxa Selic”, defendeu o ministro, acrescentando que seu ministério está “muito preocupado” com o nível dos custos dos empréstimos, uma vez que isso tem impacto sobre a saúde fiscal do país.
“Essa decisão do Copom está contratando um problema. Contratando inflação futura e o aumento da carga tributária futura”, afirmou Haddad.
Conforme a reforma tributária passa a assumir os holofotes na reta final da tramitação do arcabouço fiscal no Congresso, Haddad disse que o Brasil está no “melhor momento” para aprová-la, afirmando que o país “não tem chance” sem a reorganização tributária. (Reuters)
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