Cenário é de incerteza para o câmbio por conta do tarifaço; entenda

Desde o anúncio das tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, a diversos países, incluindo o Brasil, atrelado a uma série de fatores políticos e econômicos da conjuntura mundial e nacional, o câmbio tem se comportado de forma bastante volátil. O momento é de instabilidade. Se antes havia uma valorização do real, a situação se inverteu com o tarifaço de Trump, e o mundo assiste a uma pequena retomada da valorização do dólar frente às demais moedas.
Especialistas são unânimes ao afirmar que o atual cenário é incerto e tudo pode mudar a qualquer momento até que as questões relacionadas às tarifas estejam definidas. No Brasil, onde a moeda americana opera atualmente na faixa de R$ 5,50 a R$ 5,60, analistas chegaram a projetar a cotação em cerca de R$ 5,20. Porém, as indefinições em torno do tarifaço, na análise da economista-chefe do Ouribank, Cristiane Quartoli, trouxeram ao mercado uma aversão ao risco, o que pressionou a taxa de câmbio e fez o dólar voltar a subir. “Embora definidas, elas não foram implementadas totalmente, e o mercado entende que mudanças ainda podem ocorrer no caminho. Isso tende a afetar ativos e gerar volatilidade no câmbio”, afirma.
O economista-chefe da Monte Bravo, Luciano Costa, avalia que foi a partir do anúncio das tarifas de 50% para as exportações brasileiras, especificamente, que o real voltou a se desvalorizar. Antes disso, especialistas apostavam na continuidade da valorização da moeda brasileira, já que o País, até então, era pouco afetado pelas decisões do presidente dos EUA. E, de fato, esse movimento estava em curso. Para se ter uma ideia, no primeiro semestre, o dólar chegou a acumular queda de 10% frente a uma cesta de moedas globais, a pior performance desde a década de 1970. “Uma tendência que vai depender bastante do que vem pela frente”, observa.
Costa acredita que, enquanto as questões das tarifas de Trump estiverem em aberto, nada estará definido quanto ao câmbio. “Ainda haverá uma nova rodada de tarifas — Trump já está anunciando —, principalmente para a Índia, por causa de sanções relacionadas ao comércio com a Rússia. O Brasil também corre esse risco, já que temos relações comerciais com o país. Então, isso, de alguma maneira, continua tensionando o mercado.”
O especialista em câmbio da WIT Exchange, Lucas Tavares, também defende que tudo dependerá, principalmente, das decisões quanto às tarifas impostas pelos Estados Unidos ao Brasil. “E todo o efeito dependerá da reação global. Parte do impacto pode ser diluída se o Brasil conseguir redirecionar exportações para outros mercados. No entanto, também pode haver menor demanda por produtos de empresas exportadoras brasileiras e, com isso, menos entrada de dólares no País, pressionando ainda mais o real”, avalia.
Apesar do cenário incerto, o especialista em investimentos da Nomad, Bruno Shahini, avalia que, diante de tantos acontecimentos, a taxa de câmbio se comportou “relativamente bem”. Ele recorda que, além das tarifas de Trump, o mercado foi surpreendido pela divulgação dos dados do IPCA e por atritos no campo geopolítico entre os governos americano e brasileiro. Também houve as definições das taxas de juros do Fed e do Copom, além de uma recuperação parcial do índice DXY — que mede a força do dólar em relação a uma cesta de moedas de países desenvolvidos.
Entretanto, Shahini não ignora que o câmbio tenha absorvido de forma razoável os choques externos e as incertezas globais neste ano. “Todo o cenário fez com que os ativos de risco globais sofressem forte retração, e o ambiente se tornasse bastante volátil. Porém, de lá para cá, a tendência do dólar foi de baixa, coincidindo com a recuperação das bolsas globais e o aumento do apetite por ativos de risco de maneira geral. Isso ocorreu quando os riscos ligados às políticas comerciais de Trump passaram a ser vistos como menos incertos para o mundo”, argumenta.
Ele afirma ainda que, no momento, a moeda americana trabalha em um intervalo mais estreito, sem grande definição. “A política monetária e o compromisso do Banco Central têm ajudado a ancorar o valor do dólar neste ano; por outro lado, as incertezas e os riscos geopolíticos atuam na direção contrária. Dessa combinação resulta a estabilidade recente da taxa de câmbio, na faixa de R$ 5,55”, diz.
No curto prazo, Shahini acredita que a simples expectativa de tarifas mais elevadas tende a aumentar a volatilidade e a pressão sobre o real, especialmente se houver percepção de risco de queda no fluxo comercial e de capitais.
Impacto das tarifas no dólar no médio prazo dependerá de negociação
No médio prazo, entretanto, o impacto dependerá diretamente do desfecho das negociações: “Caso haja flexibilização significativa das tarifas, o efeito sobre o câmbio tende a ser limitado; por outro lado, se as tarifas forem mantidas nos patamares anunciados, o real poderá sofrer desvalorização adicional devido à deterioração das perspectivas de exportação e crescimento”, avalia.
A longo prazo, o economista-chefe da Monte Bravo acredita em um dólar, no fim do ano, na faixa de R$ 5,80. Segundo ele, o grande movimento de perda de força da moeda americana já aconteceu ao longo deste ano. “Agora, ela deve se manter mais estável”, afirma.
Com o dólar mais estável, a tendência, segundo Costa, é que o real fique mais exposto a fatores internos, como eleições e questões econômicas. “Mais para o fim do ano, as discussões sobre eleições, meta fiscal e o movimento natural de maior saída de investimentos estrangeiros podem pesar sobre o câmbio”, projeta.
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