Finanças

Copom mantém a Selic em 13,75% ao ano

Apesar da pressão por parte do governo federal, autoridade monetária nem mesmo sinalizou aliviar o aperto monetário
Copom mantém a Selic em 13,75% ao ano
Com 2024 na mira, o Copom volta a se reunir em maio para recalibrar o patamar da taxa básica | Foto: Raphael Ribeiro/BCB

Brasília – O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central não cedeu à pressão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para redução dos juros e manteve, ontem, a taxa básica (Selic) em 13,75% ao ano.

Essa é a quinta vez consecutiva a segunda desde que Lula tomou posse que os juros são mantidos no atual patamar, o maior desde 2016.

A decisão do comitê veio em linha com a projeção consensual do mercado financeiro de que os juros ficariam inalterados novamente. Levantamento feito pela Bloomberg mostrou que essa era a expectativa unânime entre os analistas consultados.

Desde o último encontro, os temores com uma crise de crédito se intensificaram diante de turbulências provocadas no ambiente internacional pela falência do Silicon Valley Bank (SVB), nos EUA, e pela crise do Credit Suisse, na Europa, em um cenário de desaceleração da economia doméstica com uma política de juros altos.

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O desenho da nova regra fiscal que substituirá o teto de gastos mecanismo que limita o crescimento das despesas públicas à inflação registrada no ano anterior, é outro assunto que continua em aberto. Na terça-feira (21), Lula afirmou que o anúncio do marco fiscal ficará para abril, quando voltar de viagem à China.

Diante de incertezas fiscais e de ruídos gerados por falas de Lula e do primeiro escalão do governo incomodados com o alto patamar da Selic e seus efeitos sobre o crescimento da economia brasileira, as expectativas de inflação de analistas do mercado financeiro para prazos mais longos pioraram.

Segundo o boletim Focus, divulgado pelo BC na última segunda-feira (20), a projeção para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2024 avançou de 4,02% para 4,11% já distante do centro da meta (3%).

Para 2025, a estimativa dos economistas saiu de 3,80% para 3,90% e, para 2026, saltou de 3,79% para 4,00%.

Com 2024 na mira, o colegiado do BC volta a se reunir nos dias 2 e 3 de maio para recalibrar o patamar da taxa básica.

O ciclo de alta de juros foi interrompido em setembro de 2022 pelo Copom depois de aplicar o mais agressivo choque desde a adoção do sistema de metas para inflação, em 1999.

Foram 12 aumentos consecutivos entre março de 2021 e agosto do ano passado, com elevação de 11,75 pontos percentuais. A taxa básica saiu de seu piso histórico (2%) até atingir o nível atual de juros.

Liderança

O Brasil manteve em março a liderança no ranking mundial de juros reais, mas a taxa recuou em relação à reunião do Copom realizada em janeiro.

O levantamento do Portal MoneYou e da Infinity Asset Management também mostra que, nas últimas quatro semanas, 55% desses países elevaram suas taxas, 42,5% mantiveram e 2,5% cortaram.

Ontem, o juro real estava em 6,94% ao ano. Na reunião do comitê de janeiro, era de 7,38%. Em dezembro, atingiu 8,16%.

Os cálculos consideram o juro real “ex-ante”. Ou seja, a diferença entre a taxa do investimento no contrato Depósito Interbancário (DI) de um ano nesta data, descontada a inflação projetada para os 12 meses à frente — coletada na pesquisa Focus do BC, com cerca de 100 economistas.

Em relação a janeiro, houve queda nos juros futuros do patamar de 13,6% para cerca de 13%. As projeções de inflação recuaram de 5,75% para 5,56%.

A taxa real “ex-ante” (taxa esperada) é a mais relevante para a política monetária, pois influencia decisões futuras de investimento e consumo. Já a taxa “ex-post”, com base nos juros e inflação verificados nos últimos 12 meses, serve para avaliar o retorno de um investimento já realizado.

Em março, a aposta em relação a uma possível antecipação no início do corte de juros pelo BC ganhou força.

Em termos nominais, a taxa básica no Brasil só está atrás dos juros de 78% ao ano na Argentina, país que tem uma inflação que supera 100%.

De acordo com os responsáveis pelo ranking, o movimento global de políticas de aperto monetário ganhou força desde janeiro, com o aumento expressivo no número de bancos centrais que sinalizaram preocupação com a inflação, mesmo com a queda do preço de commodities. Ainda há pressões, no entanto, nos preços de alimentos e serviços.

Considerando um grupo maior, de 156 países, 61,5% mantiveram os juros, 32,7% elevaram e 5,8% cortaram.

Também nesta quarta, o Federal Reserve, banco central dos EUA, aumentou os juros em 0,25 ponto percentual e colocou a taxa de referência do país na faixa de 4,75% a 5%. (Nathalia Garcia e Eduardo Cucolo)

Setor produtivo faz avaliação negativa

Em nota, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), apontou que “enxerga com preocupação a manutenção da taxa de juros em patamar elevado, considerando que a atividade econômica brasileira vem mostrando claros sinais de desaceleração. Entende-se como necessário o debate sobre as elevadas taxas de juros no Brasil, uma vez que esta medida pode dificultar o acesso das empresas a crédito e investimentos, prejudicando o desenvolvimento do país e o bem-estar da população”.

Nesse sentido, a entidade afirma que considera relevante a promoção de reformas estruturantes e a apresentação de uma nova âncora fiscal que fomentem o aumento da eficiência dos gastos do governo, a sustentabilidade das contas públicas e o incremento da produtividade. “Somente assim a redução das taxas de juros e o crescimento econômico sustentável e duradouro do País serão alcançados”, conclui.

Para a Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH), este ciclo de aperto monetário vem comprometendo o desempenho da economia real, que corresponde às atividades ligadas à geração de riquezas, emprego e renda, e colocando em risco a recuperação do País.

“É a quinta vez que a taxa se mantém neste índice. Compreendemos que é uma estratégia do Banco Central para manter o controle da inflação. Contudo, essa longa estagnação nos expõe a problemas financeiros que podem ser evitados, caso haja o corte dos juros”, afirma o presidente da CDL/BH, Marcelo de Souza e Silva, em nota. Segundo o dirigente, a alta taxa de juros pode trazer problemas como crédito mais caro para os lojistas, elevação da inadimplência, impacto negativo na expectativa de empresários e consumidores, e dificuldade na geração de emprego e renda.

“O setor de comércio e serviços espera o fim deste aperto monetário. Há alguns meses falamos que é muito importante que o Banco Central adote um sistema de controle da inflação mais moderno, que leve em consideração o fato de que o Brasil está em desenvolvimento, se recuperando dos efeitos da pandemia. Isso demanda investimentos públicos em infraestrutura, saúde, educação e crédito. Ainda que a intenção do aperto monetário seja conter a inflação, a longo prazo poderá comprometer o crescimento da atividade econômica”, finaliza  o presidente da CDL/BH.

A Associação Comercial e Empresarial de Minas (ACMinas) destacou que “a visão de que a taxa Selic está excessivamente alta não é apenas do presidente Lula. Empresários brasileiros e até economistas de renome mundial, como Joseph Stiglitz e Jeffrey Sachs, também sugerem que a política atual de juros precisa mudar. Temos a maior taxa de juros real do mundo (em torno de 8%), e estamos em um momento de grande preocupação com a atividade econômica no Brasil e no mundo”, aponta comunicado dos economistas da entidade.

No Brasil, a crise das Lojas Americanas trouxe à reboque uma série de pedidos de recuperação judicial. O setor varejista brasileiro está mais vulnerável do que nunca. No âmbito externo.   “E esse cenário não combina com o nível atual de taxa Selic que temos no País” aponta.

De acordo com os economistas da ACMinas, no Brasil, o que também temos é a evidente perda do dinamismo da atividade econômica brasileira e o enfraquecimento do crédito. “Não seria a hora de começarmos a reduzir a Selic, em virtude do empenho do governo em criar uma nova âncora fiscal? Espero que essa resposta não demore a ponto de aprofundar, ainda mais, o baixo crescimento do PIB brasileiro”, conclui.

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