Investir com IA: oportunidades, riscos e cuidados no mercado brasileiro

A inteligência artificial (IA) não é mais futuro: é realidade. Com ela, é possível automatizar tarefas repetitivas, atender e orientar clientes, organizar agendas, criar textos e imagens e realizar diversas outras atividades, tudo com rapidez e facilidade. Porém, quando o assunto envolve dinheiro, você teria coragem de definir seus investimentos a partir de recomendações financeiras automatizadas, feitas por robôs?
A situação, já possível com IAs, deve crescer — e muito — nos próximos anos, segundo estimativas da empresa de análise de dados Research and Markets. A expectativa é que o mercado global de consultoria robótica salte de US$ 61,75 bilhões, em 2024, para US$ 470,91 bilhões em 2029.
Veja o que é possível fazer em uma consultoria robótica:
- avaliar o perfil de tolerância ao risco do investidor;
- sugerir investimentos com base em algoritmos que analisam o histórico dos ativos;
- monitorar continuamente o desempenho de ações;
- ajudar na divisão periódica dos investimentos de uma carteira;
- projetar cenários de mercado para novos investimentos;
- gerar relatórios sobre aplicações.
E no Brasil?
A palestrante, professora e vice-presidente de Comunicação e Marketing da Associação Brasileira de Inteligência Artificial (Abria), Elaine Coimbra, afirma que o uso está em alta. “Hoje, qualquer pessoa consegue acessar plataformas de investimento com inteligência artificial. O ChatGPT deu força a esse movimento, ao mostrar que análises rápidas não precisam mais estar apenas nas mãos de bancos ou corretoras. Mas é importante entender: no Brasil, o avanço ainda está no começo. Quem mais utiliza são jovens e investidores com perfil digital, que testam os robôs sem abrir mão da corretora tradicional”, pontuou a especialista.
O uso, porém, não é tão disseminado quanto no exterior, analisa o professor de Economia do Ibmec Minas Gerais, Gustavo Andrade. “Tem acontecido bastante no Brasil, mas é muito mais focado em operadores externos, em fundos estrangeiros quantitativos, que têm utilizado toda essa facilidade da IA para operar mercados globalmente. Ainda estamos em um estágio bem anterior ao dos mercados desenvolvidos nessa questão operacional”, afirmou.
Segundo ele, o grande mérito da IA é acumular uma grande quantidade de informações em um curto espaço de tempo, justamente para o processo decisório. Andrade acredita que, apesar disso, a consultoria robótica ainda não atingiu seu pico de capacidade. De toda forma, a situação impõe riscos a quem busca IAs para se orientar sobre ações e investimentos.
A especialista em investimentos, trader e diretora da MIDE Mesa Proprietária, Milene Dellatore, também analisa por que o uso no Brasil ainda não é tão difundido como no exterior: “O mercado brasileiro tem suas particularidades: impostos, custos operacionais, volatilidade e até liquidez diferentes. Por isso, aqui a IA funciona muito mais como uma ferramenta de apoio do que como protagonista, pelo menos por enquanto”.
Riscos envolvem alucinação e erros como se fossem verdade
“Os grandes riscos estão principalmente ligados ao foco excessivo em tendências e modelagens específicas de parâmetros, o que pode gerar problemas como alucinações da IA ou uso inadequado de informações no processo decisório. Operar de forma mais ‘fria’ tem aspectos positivos, mas também negativos, pois a IA não considera fundamentos ou outros elementos além da parte quantitativa”, alertou o professor de Economia do Ibmec Minas Gerais, Gustavo Andrade.
No contexto da IA, o termo “alucinação” refere-se à geração de informações erradas, imprecisas ou inventadas, apresentadas como se fossem verdadeiras. “O maior cuidado deve ser com o consumo de informação: a inteligência artificial ainda ‘alucina’ bastante, seja na análise de elementos específicos, seja em áreas em que ainda está sendo treinada. Portanto, existem limitações claras e não sabemos exatamente até que ponto podemos confiar plenamente na IA”, disse Andrade.
Por essa razão, a vice-presidente de Comunicação e Marketing da Associação Brasileira de Inteligência Artificial (Abria), Elaine Coimbra, alerta que o maior problema ocorre quando o usuário acredita que a IA resolve tudo sozinha. “Ela identifica padrões, cruza dados e aponta cenários. Só que o mercado não é só estatística: há política, crises globais, comportamento humano. Se a pessoa confia apenas no que o robô sugere, acaba tomando decisões precipitadas. A tecnologia ajuda, mas não substitui o bom senso nem a experiência”, pontuou.
Outra análise feita pela diretora da MIDE Mesa Proprietária, Milene Dellatore, é que, enquanto os seres humanos estão atentos aos fatos, a IA trabalha com padrões. “A inteligência artificial utiliza dados do passado e padrões, mas o mercado é vivo: é emoção, política, guerra, economia. A IA não sente isso, ela apenas processa números”, alertou.
Como investir dinheiro com segurança usando a IA
Elaine Coimbra sugere que o ideal é utilizar a IA como fonte de aprendizado. “Faça simulações antes de investir de verdade, compare as sugestões com relatórios de corretoras e opiniões de analistas, diversifique a carteira e acompanhe os resultados com frequência. A IA pode ensinar muito, mas quem precisa manter o controle é o investidor”, declarou.
Veja mais dicas:
- use a IA como apoio e aceleradora do processo de aprendizado;
- utilize-a para monitorar ações em tempo real, disparar alertas e comparar ativos;
- lembre-se de que a decisão final precisa do olhar humano, principalmente em investimentos de médio e longo prazo.
Milene Dellatore completa que o usuário precisa estar de olho no robô o tempo todo. “Não adianta ligar o robô e virar as costas. O mercado muda, a IA precisa ser ajustada, e é você quem tem que manter o volante nas mãos. Então, use sim a tecnologia como apoio, mas nunca como substituto do estudo e do próprio discernimento. No fim das contas, a decisão é sua — e o dinheiro também”.
Orientações para investir dinheiro escolhendo uma corretora
Em primeiro lugar, a corretora precisa estar registrada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e vinculada à B3. “É importante que seja transparente nas taxas e ofereça suporte humano de qualidade. Também vale observar a reputação em rankings e órgãos de defesa do consumidor. A melhor escolha é sempre a corretora que combina solidez com tecnologia, oferecendo autonomia sem abrir mão da segurança”, afirmou Elaine Coimbra.
Já Milene Dellatore defende que a corretora é a “ponte com o mercado”, o que exige que ela seja confiável. Depois de checar se é regulada e registrada nos órgãos competentes, há outro ponto: a transparência. “É preciso saber exatamente quais são as taxas, como funciona o saque e se existe algum custo escondido”, explicou.
“Outro ponto é o suporte. É preciso ter alguém de verdade para falar com você quando surgir um problema — não apenas um robô de atendimento. E mais: esse ‘alguém’ não pode ser remunerado por fundos de investimento, porque, caso contrário, ele poderá indicar o que é bom para o bolso dele, e não para o seu”, completou.
Por fim, a trader destaca que é essencial entender como a corretora administra o dinheiro do seu investimento. “Taxas administrativas, spreads, custódia — tudo isso precisa estar no radar. Quanto mais claro for o contrato, maior será a sua segurança. No fim, corretora séria é aquela que está ao seu lado para conectá-lo ao mercado, e não para ganhar em cima de você de forma escondida”, encerrou.
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