Juros devem ser mantidos com as expectativas inflacionárias, dizem analistas

São Paulo – Um cenário externo incerto, com o desfecho imprevisível das eleições nos Estados Unidos, e um sinal vermelho nas expectativas de inflação para o segundo semestre levaram a um tom mais duro na manutenção dos juros no patamar atual, segundo economistas ouvidos pela reportagem. Eles não veem, no entanto, grandes chances de os juros voltarem a subir num futuro próximo.
Em decisão unânime, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) conservou na quarta-feira (31) os juros básicos em 10,5% ao ano. Esta é a segunda reunião consecutiva sem alteração no patamar dos juros.
A posição, porém, também é alvo de críticas de parte dos analistas, que avaliam que havia espaço para o corte de juros e ligam a decisão a uma pressão do mercado.
É um texto mais duro do que o anterior, que traz uma mudança na sistemática de projeção da inflação, incorporando seis trimestres à frente, avalia Lívio Ribeiro, sócio da BRCG e pesquisador associado do FGV Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas.
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“É um comunicado que, mantendo os juros a 10,5%, enxerga no primeiro trimestre de 2026 a inflação a 3,2% e enxerga essa inflação a 3,4% no final de 2025”, ressalta.
Ele complementa que será preciso aguardar a divulgação da ata da reunião, mas que o BC não parece referendar o mercado, que espera uma elevação de juros em setembro.
“Com o que está escrito hoje e com a estrutura da comunicação oficial, tem mais risco. O Copom está mais preocupado, mas isso não significa começar a subir juros na próxima reunião”, observa.
Na visão da economista Juliana Inhasz, do Insper, a decisão do Copom é adequada e alinhada com o contexto da economia brasileira. “Temos vários riscos, o fiscal é um problema sério, apesar do contingenciamento de gastos divulgado recentemente. É agora no segundo semestre que os gastos deixarão de ser feitos e precisamos entender como isso se reverte no resultado fiscal”, pondera.
A especialista não vê a Selic voltando a subir até o fim de 2024. “A provável redução da taxa americana junto com o contingenciamento (de gastos no Brasil) reduziram a pressão. Mas o governo tem de fazer a lição de casa no fiscal”, alerta.
Estabilidade
Para o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, a manutenção do patamar de juros já era algo amplamente esperado e deve perdurar. “É um cenário em que, provavelmente, os riscos no segundo semestre, especialmente por conta de câmbio e resiliência da inflação de serviços, vão continuar mantendo a expectativa de inflação elevada, não só para 2024, mas também para 2025”, diz. Segundo ele, a inflação está caminhando para ficar neste ano e no próximo ano entre 4,4% e 4,5%.
“É uma Selic que ao longo de todo o governo Lula não vai conseguir sair muito desse patamar de 10%, muito por obra do governo, por conta da questão fiscal”, assinala. Ele afirma, no entanto, que o cenário também depende do patamar do câmbio, que pode afetar a expectativa da inflação para 2025 e 2026. (Douglas Gavras)
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