Plano Real completa 30 anos e ainda impacta economia

O Plano Real completa 30 anos. Antes dele, o Brasil chegou a conviver com a hiperinflação e colecionava vários planos econômicos na tentativa de contê-la. Foram quatro moedas e seis planos implementados no período de 1986 a 1994. Um ano antes do plano, que trouxe a estabilização da economia, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é a inflação oficial do País, chegou a 2.477% em 1993, bem diferente do cenário atual, com alta de 3,93% no acumulado dos últimos 12 meses finalizados em maio, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Entidades e economistas ouvidos pelo Diário do Comércio avaliaram de forma positiva o plano e seus impactos em diferentes setores da atividade produtiva. Eles destacaram que a estabilidade da economia contribuiu para dar mais previsibilidade aos negócios e, logo, permitiu o desenvolvimento de estratégias de longo prazo, e os consumidores se livraram da remarcação diária dos preços e ganharam poder de compra.

O presidente do Sistema Faemg Senar, Antônio de Salvo, ressalta que uma economia mais estável, com previsibilidade das taxas inflacionárias favorece a classe produtora. “Dessa forma, podemos produzir com mais tranquilidade”, diz. Ele destaca que o Plano Real ajudou a reduzir a especulação e contribuiu para aumentar a produção brasileira nos mais diversos setores.
O dirigente acrescenta que, apesar dos diversos pontos positivos trazidos pelo Plano Real, ajustes na economia são fundamentais, já que o cenário muda com o passar dos anos e devem levar em consideração períodos de seca, intempéries climáticas e épocas de guerra e paz. “Esses ajustes precisam ser bem feitos para que a gente possa continuar crescendo”, observa.
Ele ressalta que o País melhorou muito desde a implantação do Plano Real para os dias atuais, já que a inflação corroía a renda de boa parte da população. “A implantação do Real foi muito importante e fez com que o Brasil crescesse”, diz.
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, observa que, com o passar dos anos, hoje muitas pessoas não lembram ou não têm a dimensão da época da hiperinflação no País. “O Plano Real acabou com o ciclo inflacionário no Brasil e trouxe uma perspectiva de estabilidade com relação a preços para as pessoas”, destaca. O dirigente acrescenta que o plano foi fundamental para que a economia brasileira pudesse crescer e o País se tornasse competitivo em relação aos pares internacionais.
Para o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), Marcelo de Souza e Silva, o Plano Real mudou o cenário econômico no Estado, assim como no País, com reflexos sentidos até hoje, entre eles, maior previsibilidade econômica. “É inegável que o Plano Real foi o alicerce da economia brasileira desde 1994”, frisa.
“Apesar de atualmente enfrentarmos uma desvalorização de nossa moeda frente ao dólar e ao euro, ainda temos competitividade internacional, temos a economia mais forte da América do Sul, graças ao Plano Real. Além disso, o plano nos permite controlar com mais facilidade cenários internos de inflação. A avaliação desses 30 anos é bastante positiva”, acrescenta.
Plano Real tem aval dos economistas
O principal mérito do Plano Real foi ter domado a inflação, diferente das estratégias anteriores, como os congelamentos dos preços feitos na década de 80, avalia a presidente do Conselho Regional de Economia de Minas Gerais (Corecon-MG), Valquíria Aparecida Assis.
“O Plano Real se mostrou um verdadeiro divisor de águas na história econômica do Brasil nos últimos 30 anos, sua contribuição para a estabilização de preços foi notável, acabando com a inflação que minava a confiança no País”, destaca.
Ela ressalta os impactos sociais do plano, que contribuiu para a retomada do poder de compra dos assalariados, em especial dos mais pobres, que eram corroídos pelas elevadas taxas de inflação, num cenário de remarcações constantes dos preços.
Apesar dos avanços no processo de controle de preços e no desenvolvimento econômico do País, a presidente do Corecon-MG ressalta que o Brasil ainda possui grandes desafios, como por exemplo, a necessidade de aumentar o nível de produtividade. “Outra questão é a taxa de juros, que ainda está muito alta”, diz. Ela lembra que os juros elevados acabam sendo consequências do Plano Real.
O atual professor da Fundação Dom Cabral (FDC) e ex-ministro do Trabalho e do Planejamento e Orçamento no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), de 1995-1999, Paulo Paiva, afirma que o Plano Real foi o mais bem sucedido programa de estabilização da história do Brasil. “Os números falam por si, já são 30 anos de inflação bem comportada, um recorde histórico. Seus objetivos foram plenamente atingidos”, analisa.

Ele observa que os efeitos do Plano Real são claros, como a redução da inflação por 30 anos, que é um bem público, melhorando a vida das pessoas e das empresas. “A inflação é um mal que desestabiliza a democracia e paralisa a economia. Para garantir o bem-estar coletivo é necessário buscar sempre garantir o poder de compra da moeda”, diz. Para Paiva, manter a estabilidade monetária deve ser um objetivo da nação.
Ele destaca que o Plano Real eliminou a hiperinflação, trouxe previsibilidade para as decisões econômicas e financeiras. O ex-ministro de FHC lembra que, no primeiro ano do Real (julho de 1995), foram feitos vários ajustes para garantir sua implementação. “Cito a desindexação dos salários (1995), a responsabilidade fiscal (LRF) (2000) e a autonomia do Banco Central (2021)”, observa.
Paiva explica que o sucesso do Plano Real baseou-se na aliança entre conhecimento técnico com liderança política. Ele observa que a equipe econômica trazia experiências fracassadas, como o Plano Cruzado, e conhecia os diferentes planos executados mundo afora, com seus acertos e erros, e acrescenta que a ideia da criação da Unidade Real de Valor (URV) foi fundamental para o sucesso do plano.
Ele ressalta a importância da liderança política do então presidente Itamar Franco, que depois de vários ministros da Fazenda, entregou a tarefa ao então senador Fernando Henrique Cardoso, que agregou o que de melhor havia no País de economistas para sua equipe econômica.
“Ele usou sua competência política para negociar com o Congresso a aprovação das medidas legais necessárias e explicar para o País o que seria feito e porquê. E Itamar Franco colocou sua autoridade de chefe de Estado e do Governo para garantir a execução do Plano Real, em ambiente de instabilidade política e de consolidação da democracia”, observa.

Paulo Paiva observa que medidas complementares ao Plano Real trouxeram condições de alívio para a gestão financeira de Minas Gerais, como a reestruturação do sistema financeiro público, privatizando os bancos comerciais estatais e a reestruturação da dívida pública do Estado que, “lamentavelmente, voltou a crescer neste século”.
Apesar de bem avaliado por boa parte dos economistas, o Plano Real não é unanimidade. Antes do lançamento da nova moeda, a economista Maria da Conceição Tavares, falecida neste ano, chegou a qualificar o plano de “maquiavélico”, tecnicamente “imelhorável” e “Cruzado dos ricos”, por impedir que os pobres e a classe média soubessem, sequer, a perda que teriam em seus salários.
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