Política fiscal do governo é fator de preocupações no mercado

São Paulo – O diretor de Organização do Sistema Financeiro do Banco Central (BC), Renato Gomes, listou na sexta-feira (25) uma série de fatores que suscitam preocupações com a política fiscal do governo, argumentando que ingredientes recentes nessa área assustaram o mercado.
Em evento do Bank of America em Washington, às margens das reuniões do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, no qual enfatizou que o tema fiscal importa para a política monetária, Gomes também disse que a atuação do BC nos juros segue focada em levar a inflação exatamente à meta de 3%, mas com uma calibragem que leve em conta as incertezas do cenário.
“Há alguns ingredientes (fiscais) recentes que, em minha opinião, assustaram os participantes do mercado”, disse o diretor.
Entre os fatores, o diretor citou a previsão de aumento do déficit de empresas estatais por meio da aceleração de investimentos dessas companhias por fora do arcabouço fiscal, apontando também que o mercado está inquieto com a possibilidade de o governo não atingir a meta fiscal de déficit zero de 2025.
Além disso, ele mencionou o uso de fundos para financiar políticas públicas por fora do Orçamento e uma preocupação de agentes privados com um crescimento das emissões de Letra de Crédito do Desenvolvimento (LCD) pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que conta com subsídio implícito.

“Se juntarmos tudo isso, talvez possamos entender um pouco melhor o prêmio que vemos em diferentes faixas da curva (de juros)”, afirmou, argumentando também que o País tem um déficit nominal que gera preocupações com a capacidade de melhora na trajetória da dívida pública.
Gomes acrescentou que gastos obrigatórios do governo comprimem o Orçamento, o que pode inviabilizar o cumprimento do limite de despesas do arcabouço fiscal, e ecoou opiniões de que são necessárias reformas estruturais para que o regramento se sustente.
O diretor apontou que a previsão de desaceleração fiscal neste semestre não deve impactar as expectativas de inflação e que o país precisa de um choque nas contas públicas para que as previsões de mercado para os preços à frente se movam substancialmente.
A equipe econômica tem afirmado que apresentará a partir de novembro propostas de contenção de gastos públicos para que o arcabouço se sustente e a dívida pública se estabilize abaixo de 80% do Produto Interno Bruto (PIB), em meio à desconfiança do mercado sobre a capacidade do governo de alcançar a meta de déficit primário zero.
Para o diretor, o tema fiscal importa para a política monetária porque impacta demanda, condições financeiras e expectativas de inflação.
Juros
Na apresentação, Gomes afirmou que o BC vai manter sua atuação nos juros, analisando atividade, ociosidade da economia, inflação, “especialmente a parte mais afetada pela política monetária”, mercado de trabalho e condições financeiras. “Em seguida, faremos nossas projeções, qualificaremos as projeções com o balanço de riscos e seguiremos em frente”, disse.
“A principal filosofia, de certa forma, é que faremos o que for preciso para colocar a inflação exatamente na meta, que é de 3%, mas calibrando o ritmo, refletindo a incerteza em cada ponto do caminho.”
Após o BC elevar a taxa Selic em 0,25 ponto percentual em setembro, a 10,75% ao ano, Gomes afirmou que o início do ciclo de alta nos juros foi gradual e que parte da justificativa para essa decisão ainda está presente, citando incertezas e a necessidade de aguardar o efeito da política monetária.
Gomes, que normalmente costumava se ater a temas da sua diretoria em falas públicas, já havia abordado a política monetária e fiscal na última quinta-feira (234). Em outro evento em Washington, ele chamou a atenção para o impacto das preocupações fiscais sobre os prêmios de risco do país e afirmou que o BC está comprometido em cumprir a meta de inflação de 3%.
Reportagem distribuída pela Reuters
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