Por que ainda são poucas as empresas mineiras de capital aberto no mercado

Minas Gerais possui 30 empresas de capital aberto e a maioria está listada na B3, a bolsa de valores brasileira. Este número poderia ser ainda maior, não fosse por fatores como o ambiente macroeconômico do País, com a alta taxa Selic, e o perfil do empresariado mineiro, que, em muitos casos, adotam outras ferramentas para obter recursos no mercado. Entre as estratégias, destaca-se a emissão de títulos de dívida.
O diretor-executivo da Excelia Consultoria, Eduardo Campos, lembra que já faz quatro anos que nenhuma empresa abre capital no País, independentemente do estado de origem. Isso porque a conjuntura macroeconômica dos últimos anos tem se mostrado desfavorável para a listagem na bolsa de valores.
Segundo ele, quando a taxa Selic sobe para patamares muito elevados, ocorre uma migração dos recursos dos investidores do mercado de capitais. Os investimentos saem da renda variável e seguem para a renda fixa. Com a Selic próxima de 15% ao ano (a.a.), há pouco incentivo para os investidores optarem pelo mercado de ações.
“Porque as empresas irão trazer retornos de até 25% a.a., mas com uma série de riscos operacionais e macroeconômicos. Se o mercado de dívida está pagando 15% a.a., pouquíssimas empresas conseguem atrair a atenção para justificar a migração do investidor da renda fixa para a variável.”, esclarece.
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Portanto, a alta da Selic acaba drenando recursos que antes estavam na bolsa de valores. Inclusive, o especialista lembra que a última grande onda de ofertas públicas iniciais (IPOs, sigla em inglês) no Brasil ocorreu há quatro anos, em período em que a taxa de juros estava na casa dos 2% a.a..
O especialista ainda lembra que essa última onda de IPOs chegou a registrar um recorde no número de novas companhias listadas e de captações, com a entrada de algumas empresas mineiras nesse mercado, como a Méliuz e a rede Mater Dei.
“Nas últimas duas décadas – apesar de ainda ser pouco expressivo, considerando a importância econômica do Estado – houve um leve incremento na participação das empresas mineiras utilizando esses recursos do mercado de capitais”, relata.
B3 não tem previsões de ofertas públicas de companhias mineiras
De acordo com informações da B3, não há previsões de novas ofertas públicas de ações envolvendo companhias mineiras. Inclusive, o vice-presidente executivo da Emccamp, André Campos, já deu declarações descartando a possibilidade da incorporadora mineira abrir capital neste ano.
Campos avalia que o baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) também pode explicar o fato de que poucas empresas estão conseguindo avançar em uma velocidade satisfatória. “Um crescimento pífio da economia brasileira, aliado a uma taxa de juros muito alta, faz com que todos optem pela segurança da renda fixa e que os IPOs fiquem engavetados, aguardando uma nova janela”, completa.
Cultura empresarial e falta de incentivo para entrada no mercado de ações

Outro grande impeditivo para a entrada de novas empresas com sede em Minas no mercado de capitais, segundo o diretor-executivo da Excelia, é a questão cultural envolvendo os executivos, já que muitos empresários alimentam uma perspectiva de sucessão nas famílias empresariais brasileiras, de forma geral.
Campos destaca exemplos no varejo supermercadista e farmacêutico, além das grandes distribuidoras presentes em Minas Gerais, que registram faturamentos multibilionários e conseguem se financiar sem precisar entrar no mercado de capitais.
“As famílias, donas dessas empresas, se organizaram e há pouco incentivo para abrir capital. Existe um grau de exigência do investidor de bolsa de valores muito alto por transparência, divulgação de informações, governança corporativa e ESG e essas empresas não precisam desses recursos”, explica.
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Para Eduardo Campos, a grande questão é que muitos grupos empresariais mineiros conseguem acessar grandes volumes de investimentos a longo prazo para alavancar o crescimento sem a necessidade de contar com o mercado de capitais. “Por isso, não há muitos incentivos para abrir capital”, completa.
Um bom exemplo desse tipo de empresa é a rede Drogaria Araujo. Em nota enviada ao Diário do Comércio, a varejista mineira afirma que não tem planos para abertura de capital. De acordo com a rede farmacêutica, o foco da Araujo segue o de ampliar a presença regional, sem a necessidade de recorrer ao mercado de capitais.
“A empresa mantém sua estratégia de crescimento baseada na solidez de um modelo de negócio consolidado e no compromisso com a expansão sustentável dentro de Minas Gerais”, afirma.
Além disso, existem algumas empresas que estão listadas na bolsa de valores, mas não possui ações negociadas no mercado, como é o caso da Companhia Industrial Cataguases e Prática Produtos. Isso porque os papeis estão nas mãos de familiares donos da empresa, por meio de sociedades de participação, e demais sócios no negócio.
O Estado também conta com exemplos como o da Cedro Textil, que é uma das empresas mais antigas de Minas Gerais, com 150 anos de atuação no mercado, e uma das companhias de capital aberto mais duradouras do Brasil. Segundo o CEO da Cedro, Fábio Mascarenhas Alves, a empresa está listada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) há mais de 50 anos.
“Dentre as empresas privadas que estão no pregão da bolsa de valores, somos a mais longeva e com um desempenho consolidado nas unidades de negócio em que atuamos – Jeanswear e Workwear”, declara.
Empresas mineiras apostam na emissão de títulos de dívida como alternativa

Campos relata que muitas empresas de Minas têm apostado em outros meios para obter recursos no mercado de capitais, via emissão de títulos de dívida. Dentre as ferramentas adotadas estão as debêntures, notas comerciais e a securitização, como os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs).
Para o especialista, esse movimento é motivado pela possibilidade de propor condições de pagamento, carências e prazos de pagamento. Enquanto no mercado bancário é necessário oferecer uma série de garantias para obter uma linha de crédito com até cinco anos de prazo, o mercado de capitais proporciona estruturas mais alongadas, com prazos de pagamentos maiores e estruturas de garantias diferentes.
O executivo avalia que a entrada das empresas no mercado de dívida pode significar um prenúncio de que em um momento com taxa de juros em patamares inferiores algumas dessas companhias poderão realizar uma abertura de capital. Isso porque todas as exigências regulatórias do segmento de dívidas estão preparando a empresa para enfrentar as exigências de um possível IPO.
“Até porque já existe um pipeline de empresas mineiras que estavam prontas lá em 2020 e 2021, que não fizeram abertura, mas que certamente, em uma nova janela, estarão muito bem posicionadas para serem listadas na B3”, acrescenta.
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