Gastronomia

Alimentação fora do lar impulsiona economia em pequenas cidades, como Teófilo Otoni

Estabelecimentos do setor localizados no município do Vale do Mucuri participam de programa de qualificação do Sebrae para melhorar serviço e, assim, vender mais
Alimentação fora do lar impulsiona economia em pequenas cidades, como Teófilo Otoni
Banca 76 é um prato do Café Jurema: focaccia de pesto com pernil de porco, queijo meia cura e molhos de tomate agridoce e fresco de creme de queijo com iogurte e cebolinha. | Foto: Sebrae/ Divulgação

A alimentação fora do lar é um motor essencial para o crescimento da economia, e essa expansão se intensifica quando o empreendimento investe em qualificação. A afirmação é unânime entre especialistas, empreendedores do setor, fornecedores e consumidores de Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, uma das 117 cidades mineiras participantes do Prepara Gastronomia, programa de fortalecimento de pequenos negócios desse segmento, executado pelo Sebrae Minas.

O Diário do Comércio visitou alguns lojistas de alimentação fora do lar em Teófilo Otoni. Por lá, 30 estabelecimentos participam da segunda edição do projeto e expõem suas criações gastronômicas em um concurso cuja votação se encerra no dia 6 de setembro. No dia 13 do mesmo mês, será realizado um festival com os pratos vencedores.

De acordo com os entrevistados, qualificar um empreendimento de alimentação fora do lar significa, entre outras coisas, implantar ou aprimorar práticas de negócio, como gestão, treinamento de equipes de produção e atendimento, aplicação de técnicas de segurança alimentar, investimento em inovação e sustentabilidade, além de estratégias de marketing.

E como tudo isso contribui para movimentar a economia?

O Prepara em Teófilo Otoni tem impulsionado o setor de alimentação fora do lar, segundo o gerente regional do Sebrae, Rogério Fernandes. Ele apresentou dados da Receita Federal que mostram que, entre a primeira edição do programa, em 2022, e a atual, 41 novos pequenos negócios foram criados, representando uma alta de 17%.

“À medida que o empreendedor passa a receber bem o cliente, isso traz retorno, pois o estabelecimento fica mais cheio. O resultado é o aumento nas vendas e uma economia mais aquecida — desde o agricultor, que fornece os produtos para o mercado local, até os estabelecimentos e seus fornecedores, que mantêm relação com o segmento de alimentação fora do lar. É uma cadeia grande e muito poderosa, que injeta dinheiro na economia local”, declara Fernandes.

A cadeia da alimentação fora do lar envolve, entre outros, os seguintes atores:

  • Alimentação: bares e restaurantes, lanchonetes, padarias, entrega em casa (delivery), comida de rua (food truck).
  • Trabalhadores diretos e indiretos: cozinheiros, auxiliares de cozinha, garçons, entregadores, transportadores.
  • Fornecedores: agricultores de frutas e verduras, frigoríficos e laticínios, fábricas de embalagens.
  • Impostos: arrecadação tributária gerada pelo consumo.

Bar vai além do básico e gera 15 empregos

O empresário e músico Miguel Grapiuna é dono do Graps, um bar de calçada no bairro Marajoara que tem um pé na tradição e outro na novidade. O carro-chefe do local é inspirado na tradicional carne de sol com mandioca de Teófilo, mas preparado com filé-mignon de sol, acompanhado de mandioca na crosta de parmesão e vinagrete de feijão-fradinho.

O empresário e músico Miguel Grapiuna é dono do Graps, um bar de calçada no bairro Marajoara. | Foto: Anderson Rocha/ Diário do Comércio
O empresário e músico Miguel Grapiuna é dono do Graps, um bar de calçada no bairro Marajoara. | Foto: Diário do Comércio/ Anderson Rocha

“A gente tem essa pegada de boteco, mas em uma releitura mais sofisticada, com foco no bom atendimento, tira-gostos bem feitos e drinques diferentes. Montamos um cardápio elaborado por uma chef e todo funcionário aqui é treinado ao ser contratado”, conta. Tudo isso, segundo ele, é para oferecer um ótimo serviço ao cliente que, satisfeito, retorna, fazendo o estabelecimento crescer e movimentando a economia.

“Trabalhamos com sete pessoas diretas e oito indiretas (freelancers de fim de semana). Ao todo, são 15 pessoas. Todo esse maquinário gira em torno da gastronomia e da coquetelaria, que movimentam a economia, pagam salários e sustentam as famílias envolvidas. Já tive funcionário que comprou moto nova e outro que trocou de carro. É vendendo comida e bebida que conseguimos sustentar todo esse pessoal”, completa.

Cadeia da alimentação fora do lar valoriza pares locais

O analista de negócios do Sebrae em Teófilo Otoni, Jeferson Batalha, explica que a alimentação fora do lar pode ser ainda mais efetiva em ganhos econômicos quando estabelece vínculos com seus pares locais.

Mercado Municipal de Teófilo Otoni vai completar 100 anos em 2025. | Foto: Anderson Rocha/ Diário do Comércio
Mercado Municipal de Teófilo Otoni vai completar 100 anos em 2025 | Foto: Diário do Comércio/ Anderson Rocha

“A partir do momento em que os estabelecimentos valorizam e compram insumos do pequeno produtor, forma-se uma cadeia fechada que envolve o fornecedor, o agricultor familiar, o comerciante do Mercado Municipal, o estabelecimento, o garçom e o entregador de aplicativo. Isso fecha o ciclo”, pontua Batalha.

Segundo ele, esses vínculos foram ainda mais estimulados por duas regras obrigatórias do concurso gastronômico do Prepara: as receitas participantes precisavam incluir, ao menos, um item adquirido no Mercado Central e ter relação com um dos quatro pilares das origens da cidade: as gastronomias mineira, baiana, libanesa e alemã.

Fornecedor mantém tradição de qualidade há 67 anos

O empresário Giovani Marx Scopel, de 56 anos, está há três décadas à frente da banca Scopel Cereais, que vende grãos, farinhas, temperos, aguardentes e outros produtos para clientes e restaurantes, no Mercado Municipal de Teófilo Otoni, onde funciona desde 1958. “É um negócio familiar, iniciado pelo meu pai e passado para mim”, conta.

O empresário Giovani Marx Scopel, de 56 anos, está há três décadas no comando da banca Scopel Cereais. | Foto: Anderson Rocha/ Diário do Comércio
O empresário Giovani Marx Scopel, de 56 anos, está há três décadas no comando da banca Scopel Cereais | Foto: Diário do Comércio / Anderson Rocha

Para ele, a alimentação fora do lar dá um importante impulso ao desenvolvimento econômico local, mas é preciso ter um diferencial. “Nós não concorremos com grandes supermercados, mas, em termos de qualidade, somos mais dedicados. Assim, um produto nosso usado em restaurantes acaba sendo divulgado de boca em boca e atrai mais clientes para comprar conosco”, observa.

Cliente recomenda locais para comer bem e com bom atendimento

A orientadora social Glycia Mendes Fernandes, de 62 anos, provava um pedaço de requeijão na Banca da Paula, no Mercado Municipal, quando foi abordada pela reportagem.

A alimentação fora do lar é um hábito que ela adota, sobretudo nos fins de semana, em dois locais principais: no Mercado Municipal, onde são vendidas diversas comidas prontas, como porções de carne e batata, ao som de MPB, rock e blues; e na Feira Coberta do Bairro Bela Vista, em um restaurante que serve a tradicional carne de sol com mandioca.

A orientadora social Glycia Mendes Fernandes, de 62 anos, é frequentadora de estabelecimentos de alimentação fora do lar, sobretudo nos fins de semana. | Foto: Anderson Rocha/ Diário do Comércio
A orientadora social Glycia Mendes Fernandes, de 62 anos, é frequentadora de estabelecimentos de alimentação fora do lar, sobretudo nos fins de semana | Foto: Diário do Comércio/ Anderson Rocha

“Esses passeios são muito agradáveis. E, claro, o atendimento faz toda a diferença. Somos muito bem atendidos, bem tratados e comemos coisas gostosas e de qualidade. Quem vier a Teófilo Otoni precisa conhecer esses lugares, que são verdadeiros pontos de gastronomia”, sugere.

Prepara Gastronomia impulsiona negócios do setor

Desde 2022, o Sebrae realiza o Prepara Gastronomia, programa que oferece consultorias personalizadas, cursos, oficinas e eventos. A iniciativa é voltada para aprimorar a gestão dos empreendimentos, introduzir inovações tecnológicas e valorizar as identidades gastronômicas regionais, fortalecendo os pequenos negócios do setor de alimentação fora do lar em Minas Gerais.

Até 2024, a iniciativa já havia impactado mais de três mil empreendedores em 117 cidades mineiras, gerado mais de R$ 9 milhões em negócios e criado cerca de 500 pratos gastronômicos.

Teófilo Otoni tinha 1.792 pequenos negócios de alimentação, sendo 533 micro e pequenas empresas (MPEs) em 2024. | Foto: Sebrae/ Divulgação
Em 2024, Teófilo Otoni possuía 1.792 pequenos negócios de alimentação, dos quais 533 eram micro e pequenas empresas (MPEs). Na foto, o estabelecimento Apetite Lanches | Foto: Sebrae/ Divulgação

Em Teófilo Otoni, o programa Prepara Gastronomia começou em 2022, com um mapeamento do segmento de alimentação fora do lar na cidade. “Identificamos fortemente as culturas mineira, baiana, alemã e libanesa. A partir disso, apresentamos aos empresários desses estabelecimentos a proposta do programa, que foi validada por eles”, explica o gerente regional do Sebrae, Rogério Fernandes.

Segundo Fernandes, a partir daí foram identificadas as “dores” (problemas) do setor que precisavam de aprimoramento. Com base nisso, o Sebrae desenvolveu estratégias para auxiliar micro e pequenas empresas nas áreas de gestão financeira, operacional e comercial.

Festival de delícias movimenta Teófilo Otoni

Ao longo deste mês e até o dia 6 de setembro, 30 estabelecimentos de alimentação que participaram do Prepara Gastronomia em Teófilo Otoni apresentam pratos e drinques autorais no Concurso Gastronomia em Foco. No dia 13 de setembro, será realizada uma festa de encerramento, aberta ao público e gratuita.

Dados gerais de Teófilo Otoni:

  • População (Censo 2022): 137.418 habitantes;
  • PIB per capita (2021): R$ 20.893,97;
  • Escolarização de 6 a 14 anos (2022): 98,53%.

Setor de serviços e alimentação em Teófilo Otoni em 2024, conforme dados da Receita Federal:

  • 1.792 pequenos negócios de alimentação, sendo 533 micro e pequenas empresas (MPEs);
  • R$ 4,8 milhões de faturamento bruto anual.

* O repórter viajou a convite do Sebrae.

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