Gonet prega limites de atuação

Brasília – Empossado ontem como chefe da Procuradoria-Geral da República (PGR), Paulo Gonet afirmou que o momento é de “reviver na instituição os altos valores constitucionais” e que o órgão deve estar atento aos limites da sua atuação.
“Não podemos perder de vista que o equilíbrio tem que ser o nosso apanágio”, afirmou Gonet, em um discurso que defendeu que o Ministério Público Federal atue principalmente em nome das pessoas que não aparecem nos jornais e deve ser “inabalável aos ataques”.
“No nosso agir técnico, não buscamos palco nem holofote”, afirmou. O discurso vai em contraponto ao perfil dos procuradores-gerais que atuaram durante a Operação Lava Jato, que é refutada pelo governo Lula (PT), que indicou Gonet ao cargo.
“Nos limites de nossa atuação, devemos estar atentos, de modo especial, aos que sofrem e que não têm quem os acolha, aos que não acham espaço de proteção na política, nem no interesse jornalístico, nem nos cuidados da sociedade civil”, afirmou.
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Ele também se contrapôs, em seu discurso, ao antecessor no cargo, Augusto Aras, visto como omisso em relação às investigações relacionadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
“Não há respeito pleno da dignidade sem que também reconheçamos a responsabilidade de cada qual pelos atos que praticam e que omitem. A nós do Ministério Público espera-se que atuemos na cobrança dessas responsabilidades”, disse Gonet.
Segundo ele, o Ministério Público Federal “vive um tempo crucial”. “Temos um passado a resgatar, um presente a nos dedicar, e um futuro a preparar”, afirmou.
Gonet tomou posse em mesa ao lado do presidente Lula e dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin.
A cerimônia teve a presença de ministros do governo Lula, como Fernando Haddad (Fazenda) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), de integrantes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do STF.
Também estavam no local ex-procuradores-gerais da República como Augusto Aras, Rodrigo Janot, Roberto Gurgel, Raquel Dodge e Antonio Fernando.
Paulo Gonet é subprocurador-geral desde 2012, último grau de carreira no MPF. Nos últimos anos, atuou como diretor-geral da Escola Superior do Ministério Público da União e como vice-procurador-geral Eleitoral, designado pelo ex-procurador-geral Augusto Aras.
No último cargo, foi o responsável por apresentar os pedidos de inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em julgamentos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Apesar da posição contra o ex-presidente, ele tem apoio de parlamentares considerados conservadores e bolsonaristas. Foi aprovado pelo Senado por 65 votos a 11, reunindo apoio de governistas e oposicionistas.
Liberdade de expressão
Durante sabatina no Senado, Gonet afirmou que a liberdade de expressão não é absoluta e que ela pode ser modulada “de acordo com as circunstâncias”. Gonet foi questionado a respeito do tema pelo senador Rogério Marinho (PL-RN), líder da oposição.
As manifestações de Gonet contrapõem procuradores-gerais que vieram antes dele, no auge da Lava Jato, como Rodrigo Janot. O ex-procurador-geral é desafeto do ex-sócio de Gonet e padrinho da sua indicação, o ministro do STF Gilmar Mendes. Outro padrinho de Gonet ao cargo é o ministro Alexandre de Moraes, que é do STF e preside o TSE.
Lula defende compromisso com sociedade
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse ontem na posse do novo procurador-geral da República, Paulo Gonet, que ele não deve “se submeter à manchete de nenhum jornal e à manchete de nenhum canal de televisão” enquanto estiver no comando do Ministério Público.

O chefe do Executivo fez um discurso breve, mas cheio de recados à instituição que acusou-o à época da Operação Lava Jato.
Lula se disse emocionado de estar de volta à PGR, falou em acusações levianas, defendeu políticos e pediu a Gonet que não permita que denúncias sejam “publicizadas” antes de se provar a veracidade delas.
Gonet agora é o chefe do Ministério Público da União, que inclui os Ministérios Públicos Federal, Militar, do Trabalho e Distrito Federal e Territórios. Ele representa o MPF junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), e é o responsável por investigações e denúncias a políticos com foro especial, como o presidente da República, deputados federais e senadores, por exemplo.
Lula falou de improviso. “Eu, doutor Paulo, só queria lhe pedir uma coisa: o Ministério Público é uma instituição tão grande que nenhum procurador tem direito de brincar com ela”, disse.
Na primeira fileira, assistiram ao evento ex-procuradores que trabalharam na Lava Jato, como Rodrigo Janot. Por causa de condenações da Lava Jato, Lula permaneceu 580 dias preso na Polícia Federal em Curitiba em 2018 e 2019. As condenações acabaram todas anuladas depois, e o juiz responsável pelos casos, o hoje senador Sergio Moro, foi declarado pelo STF parcial nos julgamentos do petista.
Independência
“O Ministério Público é de tamanha relevância para a sociedade brasileira e para o processo democrático desse país que um procurador não pode se submeter a um presidente da Republica, não pode submeter ao presidente da Câmara, não pode submeter ao presidente do Senado, não pode se submeter aos presidentes dos outros poderes, mas também não pode se submeter a manchete de nenhum jornal, nem manchete de canal de TV”, ressaltou Lula.
O presidente pediu ainda que somente a verdade prevaleça sobre qualquer outro interesse e falou, no mesmo tom do discurso de Gonet, de se recuperar o papel constitucional da instituição.
“É importante que o Ministério Público recupere aquilo que foi a razão que os constituintes enaltecerem o Ministério Público. Garantir a liberdade, democracia, garantir a verdade. Não permitir que nenhuma denúncia seja publicizada antes de saber se é verdade. Senão pessoas serão condenadas previamente.
Muita gente não tem condições sequer de ser absolvidas. Eu prezo muito por isso”, disse Lula, sob aplausos da plateia.
Lula disse que “acusações levianas não fortalecem a democracia, as instituições” e defendeu a classe política, que esteve na mira do Ministério Público Federal durante os anos da Lava Jato. Gonet tem uma postura anti-Lava Jato e afirmou em seu discurso de posse que a PGR não busca palco nem holofote. Ele afirmou que o momento é de “reviver na instituição os altos valores constitucionais” e que o órgão deve estar atento aos limites da sua atuação. (Marianna Holanda, José Marques e Julia Chaib)
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