Legislação

Licença-prêmio do MPU custa R$ 439 mi

Levantamento da Transparência Brasil aponta ônus aos cofres públicos com a conversão de benefício em dinheiro
Licença-prêmio do MPU custa R$ 439 mi
Paulo Gonet recebeu pagamento em dinheiro de licença-prêmio por quatro anos seguidos | Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Brasília – Criada em 2017, a possibilidade de conversão em dinheiro da licença-prêmio no Ministério Público da União (MPU) custou aos cofres públicos ao menos R$ 439 milhões de 2019 a 2022, mostra levantamento inédito da Transparência Brasil.

O relatório da organização, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, mostra que o benefício – 90 dias de folga remunerada a cada cinco anos de trabalho – foi transformado em pagamento em dinheiro para 85% dos procuradores que compõem o MPU: Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Militar e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

O valor, que por ser de caráter indenizatório não se submete às regras do teto salarial do funcionalismo, dá uma média de R$ 184 mil para cada um dos mais de 2.000 procuradores que recorreram ao benefício em dinheiro e representa 9% da soma de todas as remunerações líquidas pagas no período. Um total de 499 procuradores recebeu cada um mais de R$ 300 mil nos quatro anos.

A possibilidade de conversão em dinheiro da licença foi autorizada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em agosto de 2017, no final da gestão de Rodrigo Janot na Procuradoria-Geral da República. O PGR também preside o CNMP.

A sucessora, Raquel Dodge, baixou em novembro daquele ano portaria regulamentando o pagamento a integrante da ativa mediante três condicionantes: “exame de conveniência e oportunidade pelo administrador”, “existência de interesse público prévia e devidamente fundamentado” e disponibilidade orçamentária.

Ápice

De acordo com o levantamento da Transparência Brasil, a concessão do benefício atingiu seu ápice (R$ 143 milhões) em 2021, na gestão de Augusto Aras. O atual chefe da PGR, Paulo Gonet, tomou posse do cargo na última segunda-feira (18).

De acordo com os dados levantados pela Folha de S.Paulo na plataforma DadosJusBr – plataforma da Transparência Brasil que reúne dados de remuneração dos órgãos do sistema de Justiça brasileiro -, Gonet e Raquel Dodge tiveram licenças-prêmio transformadas em pagamento em dinheiro nos quatro anos de 2019-2022. Aras, em 2019 e 2020. Janot se aposentou em 2019.

“O benefício se tornou o maior montante na folha de pagamento, atrás somente do subsídio, 13° salário e férias, que são rubricas de remunerações básicas do cargo efetivo”, diz o relatório. “É preciso que a atuação do conselho (CNMP])seja orientada inequivocamente pela estrita finalidade, razoabilidade e proporcionalidade na distribuição de recursos públicos sob a forma de benefícios, para evitar e combater a proliferação de regalias que sequer contribuem para o bom funcionamento da instituição.”

A licença-prêmio (que existia para os servidores federais, mas foi extinto em 1997) só era convertida em dinheiro em caso de morte. Em 2017, porém, o CNMP permitiu que qualquer procurador na ativa solicitasse o benefício em dinheiro.

Pagamento costuma ser feito no fim do ano

A Transparência Brasil destaca que a licença-prêmio é paga majoritariamente no último trimestre do ano, mediante disponibilidade financeira. “Isso incentiva um arrocho na elaboração e execução orçamentária de ações estratégicas do Ministério Público da União (MPU) para poder contemplar o maior número de membros com a conversão em pecúnia”, diz o relatório da organização, que recomenda ao novo procurador-geral da República, Paulo Gonet, a adoção der medidas para extinguir o pagamento das licenças em dinheiro.

Em relação aos dados de 2023, o relatório da Transparência afirma que há ainda há subnotificação e os dados de janeiro a setembro mostram que R$ 24,8 milhões já haviam sido pagos a título de licença-prêmio.

Em nota, a assessoria da PGR afirmou que a previsão de licença-prêmio e a possibilidade de conversão em pecúnia constam na lei e em resolução do CNMP e que os pagamentos dependem de diversos fatores, “como o aumento no volume de trabalho sem acréscimo da força de trabalho (em média o fluxo anual de processos aumentou em 1 milhão)”.

“Também consideram a disponibilidade orçamentária no fim dos exercícios fiscais, com o propósito de evitar acúmulo de passivo para a instituição.”

Não houve resposta sobre as razões que levaram Gonet a requerer a conversão do benefício em dinheiro nos últimos anos.

Como a Folha de S.Paulo mostrou no último dia 12, o CNMP aprovou em 28 de novembro uma resolução que fará com que pessoas que consultem na internet salários de procuradores e promotores sejam obrigadas a se identificar. A medida cria um obstáculo à transparência e um possível constrangimento a quem fizer a consulta. (Ranier Bragon)

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