Negócios

Avanços e desafios rumo à sustentabilidade no varejo

Redução dos níveis de CO2 na atmosfera é fundamental | Crédito: Adobe Stock
Com esmagadora maioria de MPEs, estruturação de planos e ações é complexa

Cinquenta e dois anos depois de escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Dia Mundial do Meio Ambiente, o 5 de junho segue marcado como uma data de luta, conscientização e uma modesta comemoração.

É certo que a discussão sobre responsabilidade ambiental avançou e se sofisticou em todas as esferas da sociedade. Governos e iniciativa privada têm dividido responsabilidades empurrados pelas duas pontas do processo: financiadores e consumidores, ambos cada vez mais interessados em saber o caminho percorrido por produtos e serviços da sua idealização até o descarte final.

Um dos setores com maior dificuldade para implantar e mensurar os resultados das ações tomadas é o varejo. A pulverização dos players e a esmagadora maioria de micro e pequenos negócios dificulta a sistematização das ações e estruturação de planos.

Pesquisa realizada pelo Núcleo de Inteligência e Pesquisa da Fecomércio MG mostra que, entre a preocupação com o meio ambiente e a estruturação de um plano de ação, ainda existe um longo caminho a ser percorrido. O ponto positivo, porém, é que a escolha de fornecedores e outros parceiros já é impactada pela mentalidade ESG – Environmental, Social and Governance (Sustentabilidade Ambiental, Social e de Governança Corporativa).

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O estudo revelou que os empresários do varejo mineiro se preocupam muito com os problemas ambientais, sendo que 62,7% classificam o tema “sustentabilidade” como muito importante. Mesmo que a maioria (56%) diga que não tem interesse em se aprofundar no assunto, no centro da questão está o consumidor que influencia os rumos dos negócios na medida em que 57,7% das empresas admitem optar por fornecedores com práticas sustentáveis. Esse percentual sobe para 67,6% entre 37,1% das varejistas que admitem necessidade de se aprofundar nas práticas ESG.

Para a economista da Fecomércio MG, Gabriela Martins, era esperado que a distância entre a preocupação e a prática fosse menor. A lenta recuperação econômica no pós-pandemia ajuda a explicar as dificuldades do setor, que passa por uma série de transformações simultâneas, como a digitalização e a falta de mão de obra.

“A preocupação com o tema ESG é um bom passo. É uma mudança de comportamento dos empresários e consumidores. E devemos pensar que todo empresário é, também, consumidor. Quase todos tomam medidas no dia a dia, porém sistematizar um plano de ação é ainda algo difícil por falta de capacitação no tema, orçamento e braços para a execução”, explica Gabriela Martins.

Tempo de adesão das práticas ESG – Para 53,2% das empresas ouvidas na pesquisa, a adoção de práticas sustentáveis já dura entre quatro e 10 anos. Outros 22,1% delas as adotam há mais de 10 anos e 16% executam esse tipo de medida entre um e três anos. Um diferencial captado pela pesquisa é que mais da metade das empresas com tempo de existência entre 21 e 50 anos adota medidas sustentáveis há mais de cinco anos.

Entre as empresas que disseram ter algum projeto próprio de sustentabilidade, foram mencionados, entre outros, o descarte ecológico, a economia de copos descartáveis e consumo de energia reduzido, o estímulo ao uso da bicicleta como meio de transporte para os funcionários, a doação dos retalhos de tecido para criação de peças para casa e usina solar.

“Quase todos tomam medidas no dia a dia, mas quando a gente lembra que o varejo mineiro é composto, principalmente, por pequenos negócios, por mais que adotem medidas no dia a dia, o custo de um projeto é inviável para muitos deles. Depois desse período de crise em 2020 e 2021, o setor vem em recuperação, mas ainda tem muitas contas a pagar”, pontua a economista da Fecomércio MG.

Descarbonização demanda grandes esforços

A descarbonização da economia com vistas à mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e em prol de um modelo de produção e consumo mais equilibrado e que gere justiça social, demanda esforços de todas as esferas da sociedade – governos, empresas e cidadãos. Novas tecnologias e inovações incrementais estão sendo geradas e testadas em todo o mundo com este fim.

A redução dos níveis de gás carbônico (CO2) na atmosfera é fundamental para que esse objetivo seja alcançado e há duas frentes de ação nesse caso: a diminuição das emissões e a retirada desse gás da atmosfera.

Apesar de não ser exatamente uma nova tecnologia, a injeção de CO2 a grandes profundidades é uma nova esperança: são as chamadas tecnologias de Captura e Armazenamento de Carbono (CCS).
O processo de CCS (Carbon Capture and Storage, na sigla em inglês) é uma cadeia de atividades composta por múltiplas tecnologias que visam armazenar de forma permanente grandes quantidades de CO2 produzido por atividades humanas, evitando sua liberação para a atmosfera.

Além dos ganhos ambientais, o CCS promete inaugurar uma nova cadeia produtiva em torno da indústria de injeção de gás carbônico no subsolo e integrar o mercado de carbono regulado. Desse modo, o impacto seria múltiplo, dando às indústrias uma oportunidade de melhorar sua performance nos quesitos ESG e, ainda, vender créditos de carbono.

Ganhos econômicos

Dados do 1º Relatório Anual de CCS no Brasil, realizado pela ONG CCS Brasil, revelam que projetos de captura e armazenamento de CO2 no País podem, em um cenário conservador, gerar receitas próximas a US$ 14 bilhões por ano, considerando o valor de US$ 70 por tonelada de CO2 como preço do crédito. Os cálculos são feitos com base no potencial de captura que o Brasil pode ter anualmente de 200 milhões de toneladas de CO2 observado em diversos setores produtivos brasileiros.

Segundo a engenheira e cofundadora da CCS Brasil, Nathalia Weber, em um cenário um pouco mais otimista, em que o preço do crédito de carbono pode chegar a US$ 100 por tonelada de CO2, as receitas podem alcançar um valor próximo de US$ 20 bilhões anuais.

Além disso, em relação aos projetos de CCS vinculados à produção de bioenergia (BECCS), o potencial está entre US$ 2,7 bilhões e US$ 3,8 bilhões por ano. Esses valores não consideram o potencial para emissões líquidas negativas, resultantes da aplicação de tecnologias de CDR (Remoção de Dióxido de Carbono, na sigla em inglês), que inclui BECCS.

Sobre Minas Gerais, o estudo conclui que o Estado tem um potencial de captura maior que 19 milhões de toneladas de CO2 por ano, sendo 21% desse valor para aplicação de CCS à Bioenergia (BECCS). Desse potencial, são estimadas receitas por projetos de CCS entre US$ 1,33 bilhão e US$ 1,95 bilhão por ano, o que corresponderia a cerca de 10% do total previsto para o Brasil.

“Esse conjunto de tecnologia já existe há muito tempo e foi reembalado em uma cadeia de processos tecnológicos para ser mais eficiente: o CCS. Nós capturamos o CO2 emitido por meio de filtros ainda nas chaminés das indústrias e termelétricas. Depois ele é separado dos outros gases e transportado por gasodutos (carbodutos) até onde será injetado em grandes profundidades. É bastante correlato com a indústria de óleo e gás, que já faz para aumentar a eficiência nos processos de extração, porém eles não têm demanda para o volume de CO2 emitido, então procuramos uma forma de fazer o armazenamento geológico permanente do dióxido de carbono”, explica Nathalia Weber.

Para que isso seja possível, é feita uma análise geológica criteriosa. A área de rochas sedimentares deve estar a mais de mil metros de profundidade, não apresentar instabilidades sísmicas e ter na camada da superfície uma rocha impermeável capaz de selar o ambiente, impedindo a passagem de volta do gás.
A rocha sedimentar apropriada apresenta microcavidades que formam uma rede capaz de ser preenchida pelo CO2. A profundidade leva ao aumento de pressão e temperatura, tornando o gás mais denso, o que dificulta que ele volte a subir e facilita com que solubilize e reaja com os minerais presentes, gerando um composto sólido em muitas ocasiões.

No Brasil, algumas condições ainda emperram o uso da tecnologia. O principal é que não existe uma legislação que regule a atividade. No Senado, o Projeto de Lei 1425, de 2022, que está na comissão de Serviços de Infraestrutura, “disciplina a exploração da atividade de armazenamento permanente de dióxido de carbono de interesse público, em reservatórios geológicos ou temporários, e seu posterior reaproveitamento”, com relatoria do senador Jayme Campos (União Brasil/MT). Não há prazo para a tramitação e, depois do Senado, o projeto ainda passa pela Câmara dos Deputados e sanção presidencial.

“No processo, embora não pareça, a fase mais cara é a captura porque precisa de muita energia para separar os gases. O mais importante é garantir que o local de injeção é seguro e que vai continuar sendo seguro, apresentando capacidade e profundidade. O Brasil tem muitas bacias sedimentares e para emplacar o CCS precisamos de regulação, fiscalização e fomento. Aqui o debate ainda é lento e de soluções baseadas na natureza – florestamento e reflorestamento – são dominantes e devem ser. O CCS é uma tecnologia complementar. Temos potencial para fazer CCS na bioenergia e exportar a tecnologia”, pontua.

Noruega, Reino Unido, Canadá e Estados Unidos lideram em número de projetos e oferecem incentivos para o uso da tecnologia. Os EUA, por exemplo, pagam US$ 85 por tonelada de CO2 armazenado.
No Brasil existem projetos-piloto parados à espera da regulação em Santa Catarina e Mato Grosso. A Petrobras desenvolve um dos maiores projetos do mundo de injeção de CO2, porém como aplicação para a extração de petróleo.

“A principal forma de monetização do CO2 seria a venda de créditos de carbono. Aí entram os esforços da criação de um mercado de carbono regulado e tornar os projetos de CCS elegíveis. Assim, eles passariam a ser uma fonte de receita para as indústrias. Esse mercado nascente vai precisar de novas empresas e profissionais mais qualificados, desde técnicos de instalação e engenheiros, a consultores e advogados. Minas Gerais entra em boas condições nesta competição pela estrutura da sua economia forte em indústrias de base como a siderurgia”, completa a cofundadora da CCS Brasil.

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