Brasileiro cria sistema que supera padrões globais de pesquisa
Há mais de quatro anos, quando Guilherme Cunha iniciou sua jornada no Banco Mundial, ele não imaginava que construiria uma carreira que desafia a lógica linear das trajetórias tradicionais.
Formado em Ciências Políticas e com mestrado em Administração Pública, Guilherme Cunha atuou em áreas analíticas e diretamente conectadas à produção de conhecimento da instituição. A virada, porém, viria em um momento em que o avanço da inteligência artificial começava a pressionar grandes organizações a repensarem seus métodos de pesquisa, confiabilidade e eficiência.
“A maioria das pessoas que hoje trabalham com IA vem de carreiras técnicas. Eu percorri o caminho oposto”, revela ele. Sem formação em programação e com experiência apenas pontual em linguagens de código durante a universidade, ele migrou para o campo tecnológico a partir de uma necessidade real dentro do próprio Banco Mundial.
Seu time identificou que, mesmo com o avanço dos modelos de linguagem generativa, ferramentas comerciais como o GPT não podiam ser utilizadas institucionalmente por falta de transparência, rastreabilidade, rigor metodológico e confiança, pilares fundamentais para uma organização reconhecida globalmente por seu padrão de qualidade em pesquisa.
Foi a partir desse desafio que Guilherme Cunha assumiu, há pouco mais de um ano, a missão de explorar como aplicar inteligência artificial para acelerar processos de pesquisa sem comprometer a integridade técnica das análises. O que começou como um experimento se transformou em um dos projetos mais inovadores da instituição, a criação de um pipeline de IA capaz de produzir estudos complexos com confiabilidade superior às ferramentas comerciais mais avançadas do mercado.
O sistema desenvolvido por Guilherme Cunha tem como base a arquitetura RAG (Retrieval Augmented Generation), amplamente utilizada na área de IA. Mas ele foi além do convencional, acrescentando dois módulos inéditos, criados do zero, voltados para auditoria e correção automática das citações e afirmações geradas pelo modelo.
Em termos práticos, o sistema é capaz de processar centenas de documentos originais, incluindo artigos, relatórios e livros, gerar pesquisas robustas diretamente utilizáveis pelos especialistas do Banco Mundial e até mesmo verificar, rotular e corrigir cada citação, comparando-a com o texto-fonte para eliminar imprecisões e alucinações comuns em modelos generativos.
A inovação dos módulos adicionais é justamente sua capacidade de auditar o próprio modelo, garantindo fidelidade absoluta ao material original. Os resultados são expressivos. Em testes comparativos com as ferramentas Deep Research (GPT) e Elicit, o pipeline de Guilherme apresentou mais de 90% de acurácia, superando significativamente os dois sistemas, que ficaram na faixa de 70% e 80%, respectivamente.
Em apenas um ano, Guilherme Cunha não só conduziu o desenvolvimento como se tornou fluente em programação, utilizando modelos de IA como ferramenta de aprendizado intensivo. Hoje, sua rotina envolve escrever e revisar código com naturalidade, conduzindo um dos pipelines de IA mais rigorosos já implementados dentro de uma organização internacional.
A entrega final do projeto, que será apresentada ao Banco Mundial após mais de um ano de trabalho contínuo, representa a interseção rara entre competência analítica, domínio metodológico e capacidade de adaptação rápida a tecnologias emergentes.
“Consegui unir minha formação em políticas públicas com profundo conhecimento sobre regulação e produção de evidências ao universo da IA, criando um produto que interessa não apenas a instituições multilaterais, mas também a setores altamente regulados, como biofarmacêuticas, energia e empresas sujeitas a compliance federal rigoroso”, acredita ele.
Seu plano profissional contempla, inclusive, o desenvolvimento de uma versão customizada desse pipeline para o setor privado, focada em regulatory intelligence, permitindo que empresas interpretem complexos documentos regulatórios com precisão, agilidade e transparência.
Em um momento em que o mundo discute o impacto da IA na qualidade da informação, a trajetória de Guilherme mostra que tecnologia e rigor podem coexistir.
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