Cine Brasil comemora dez anos da reinauguração e agita centro da Capital

Impávido, ele ruma ao futuro ostentando suas linhas art déco no coração da cidade. Ele atravessou os anos resistindo às mudanças culturais, à pandemia de Covid-19, ao fim dos cinemas de rua, ao declínio do centro da cidade como a região mais importante da Capital e aos 14 anos de fechamento – entre 1999 e 2013 – e às incertezas sobre o seu destino durante esse período.
O Cine Theatro Brasil Vallourec – para os belo-horizontinos, simplesmente Cine Brasil – segue sendo um agitador da cultura e da economia de Belo Horizonte, especialmente no entorno da Praça Sete.
Em 2023, o Cine Brasil comemora os dez anos da sua reinauguração. Em uma iniciativa da Fundação Vallourec, mantida pelo grupo Vallourec, o prédio foi adquirido em 2006, quando teve início um intenso processo de restauração que durou até 2013.
Somente na reforma foram investidos aproximadamente R$ 55 milhões, sendo 40% empenhados via Lei Federal de Incentivo à Cultura, com patrocínio da Vallourec. Os outros 60% dos recursos foram aportados diretamente pela siderúrgica.
O prédio é tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Estadual e Municipal e apresentou muitos desafios durante a reforma. Um dos principais foi reconhecer a estrutura do imóvel, pois as plantas originais se perderam com o tempo. A fachada principal, por exemplo, foi reconstituída seguindo o projeto inicial, com revestimento em pó-de-pedra, três grandes vitrais com desenhos geométricos e quatro grandes lanternas em metal e vidro.
As tradicionais portas pantográficas também foram reconstruídas e possibilitam ao público admirar, mesmo da calçada, o hall de entrada, assim como acontecia na década de 1930. Para esse minucioso trabalho, a equipe contou com a ajuda de empresas locais e do exterior, como Estados Unidos e Panamá.
De acordo com a gerente da Fundação Vallourec, Sheila Santos, embora o termo ESG fosse praticamente desconhecido no Brasil naquela época, a decisão de comprar e devolver o espaço remodelado à população da Capital fazia parte de uma mentalidade que já se preocupava com responsabilidade social e ambiental.
“Hoje, as questões de ESG estão muito à tona, mas sempre vi a Vallourec com essa mentalidade de cuidado com as pessoas e o meio ambiente integrado à sociedade. Na época, a gente falava de ações culturais. Sempre tivemos uma preocupação e um cuidado social. Hoje, o Cine é viável porque é, ainda, mantido pela Vallourec e pelo Instituto Unimed, via Lei Rouanet”, explica Sheila Santos.

O complexo conta com 8,3 mil metros quadrados de área construída, divididos em sete pavimentos. São dois teatros, um com mil lugares e outro com 200; dois andares de galerias para exposições de artes visuais; área de eventos para até 500 pessoas, além de um restaurante, loja e áreas de convivência. Todos os ambientes possuem isolamento acústico e contam com ar condicionado central.
Projetado pelo arquiteto Alberto Murgel, foi inaugurado na Praça Sete em 14 de julho de 1932, e o prédio já nasceu diverso, abrigando manifestações artísticas como óperas, teatro, música e cinema.
O espaço faz parte da memória afetiva da Capital e dos moradores do interior que faziam questão de visitar o lugar entre as décadas de 1970 e 1990 para assistir os “blockbusters” da época, especialmente os filmes dos Trapalhões. Durante as exibições do filme “ET – O Extraterrestre”, pouco antes do Natal de 1982, o Cine Brasil registrou os maiores públicos da história das salas de cinema do Brasil, reunindo mais de duas mil pessoas em uma só sessão.
Desde a sua criação, o Cine Theatro Brasil Vallourec carrega consigo memória, cultura e ajuda a movimentar a economia da cidade, principalmente do hipercentro.
“É uma gestão bem ajustada. A manutenção do prédio custa, em média, R$ 5 milhões por ano, viabilizados por nós e pelo Instituto Unimed-BH. Conseguimos oferecer grandes espetáculos a preços populares, oferecemos também o programa educativo. Utilizamos as galerias e a área de eventos para atividades corporativas e sociais. O restaurante, a loja e área de convivência compõem outro diferencial. Abrimos esses espaços para parceiros e movimentamos toda a região central. Teremos uma programação de comemoração intensa – entre os dias 22 e 24 de setembro -, com mais de 50 atrações abertas ao público. O nosso desejo sempre é expandir a experiência artística para a Praça 7. Teremos palcos externos e vamos contemplar também os artistas locais, inclusive artistas de rua que já se apresentam na Praça 7 “, comemora a gerente da Fundação Vallourec.

Vizinhos reverenciam Cine Brasil
Sempre atenta aos movimentos econômicos e comportamentais da cidade, a Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH) identifica no Cine Theatro Brasil Vallourec um equipamento que ajuda na requalificação da região de Praça Sete e de todo o hipercentro.
“A reinauguração do Cine Theatro Brasil Vallourec, há 10 anos, trouxe um novo olhar dos empresários e empreendedores para o hipercentro da cidade, incentivando outras edificações vizinhas a recuperarem suas histórias. A Praça Sete e seu entorno são caracterizados pelos diversos estabelecimentos comerciais e prestadores de serviço. A história do comércio de Belo Horizonte tem como berço a Praça Sete e o Cine Theatro é uma das grandes joias da cultura e da arquitetura de nossa cidade. Mais que uma edificação e ponto de localização geográfica, são referências de nossa história e estão contribuindo para a evolução da economia criativa na capital”, avalia o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH), Marcelo de Souza e Silva.
Vizinha, a unidade da rede de lanchonetes norte-americana Mc Donald’s, chegou pouco antes do Cine Brasil ser fechado e comemorou a retomada do lugar como espaço de cultura de Minas Gerais.
“Costumo dizer que o McDonald’s da Praça Sete é também um restaurante cultural, pois o fato de ser vizinho ao teatro tornou normal a presença frequente de diretores, atores, atrizes, escritores, influenciadores digitais e jornalistas, não só mineiros, mas também famosos em âmbito nacional, que sempre passam por lá para comer e tomar um café após os espetáculos”, observa o gerente da loja, Célio José da Silva.

Do lado oposto, está o P7 Criativo – hub de inovação e economia criativa -, inaugurado em abril de 2022, ocupa um edifício projetado por Oscar Niemeyer em 1953, revitalizado com investimentos de R$ 56,2 milhões. Para a gerente do P7 Criativo, Márcia Andrade Carmo de Azevedo, ter o Cine Brasil como vizinho traz vários benefícios para o hub.
“É uma honra ter esse equipamento restaurado maravilhoso que embeleza nossa cidade ao nosso lado. Eles possuem uma boa programação de eventos e um café de qualidade no centro da cidade, isto é importante para enriquecer a cultura local, através da arte e do entretenimento. Promovem encontros, atraem turistas, impulsionam a economia, estimulando a vinda de pessoas ao centro, além de fortalecerem a identidade cultural da região”, afirma Márcia Azevedo.
Um pouco mais distante, mas ainda se sentindo integrante do raio de influência do Cine Brasil, está o Shopping Cidade. O empreendimento tem 21.214,53 m² de área bruta locável, seis andares de lojas e mais de 170 lojas e quiosques.
“A importância do Cine Brasil para o Centro e para o nosso mercado é enorme. Ele sempre foi um cinema super’importante, que marcou gerações. Hoje é um teatro que traz eventos, shows e musicais muito importantes, levando entretenimento para a área central. Então, para o Shopping Cidade, que também trabalha com entretenimento e diversão, é extremamente importante ter o Cine Brasil como um vizinho e um ícone tão importante para BH. Desejo toda felicidade e estamos juntos aqui para fazer grandes coisas e efetivamente participar desse momento tão importante para o Centro de Belo Horizonte”, afirma a superintendente do Shopping Cidade, Luciane Starling.
Mais do que vizinha, Paula Bodan é parte do Cine Theatro Brasil Vallourec. Ela comanda o café do Cine há poucos meses. O espaço, que é concedido pela administração do Cine Brasil, hoje é mais uma unidade do tradicional Frau Bodan em Belo Horizonte.
“A Praça 7 é o coração pulsante da cidade. Você pode chegar de manhã e ter alguém tocando sax, aquilo me leva a outros lugares do mundo. Eu acho que estar ali, naquele prédio com tanta história, na frente do Pirulito, é poesia. Até ir trabalhar no Cine Brasil, não imaginava que tinha tanta gente morando e passando pelo centro. São pessoas muito interessantes. O Cine Brasil também é muito diverso, todo mundo passa na porta. E todo mundo que entra é bem recebido e aprendemos com cada um. Agora fazemos o cattering para os eventos do Cine e para escritórios e empresas do entorno. Vamos lançar um carrinho que vai andar pela região”, completa Paula Bodan.
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