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Conheça os desafios do ambiente corporativo

Gestão de conflitos, inteligência emocional, práticas abusivas e grupos de diversidade são temas em voga no mercado de trabalho
Conheça os desafios do ambiente corporativo
Daniel Secches e Camila Linhares: conflitos têm várias facetas | Crédito: Divulgação / Dani Bastos

Conviver com conflitos não costuma compor a lista das coisas mais desejáveis de alguém. Mas desenvolver estratégias de gestão para superá-los é algo que as empresas estão descobrindo, e que vem trazendo resultados positivos para a manutenção de um ambiente saudável na organização.

Antes de tudo, porque dentro de uma empresa há diferentes relações. Além dos sócios, também há um convívio que envolve os colaboradores, prestadores de serviço, fornecedores de produtos e os clientes. Esses níveis de relacionamento criam cenários variados, com vínculos que podem ser de amizade ou até a partir de laços familiares. Ainda assim, os conflitos fazem parte da rotina.

Em 2021, a pesquisa Gestão dos Conflitos Organizacionais, elaborada pela Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), mostrou que 92% dos entrevistados afirmaram que os conflitos estão presentes no dia a dia das empresas. Os outros 8%, por sua vez, disseram que a frequência com que os atritos ocorrem não é significativa.

Um artigo intitulado “Os desafios da gestão de conflitos nas relações de trabalho” e publicado no ano passado na “Revista de Gestão e Secretariado” apontou que as principais causas e origens dos conflitos no ambiente laboral são as diferenças de personalidade e o estilo de trabalho, a comunicação inadequada e sem clareza, diferenças de faixa etária e interesses conflitantes, falta de produtividade e comprometimento e rivalidade e falta de empatia entre colegas.

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“Esses vínculos prévios não impedem a existência dos problemas. É importante repensar a alteração da cláusula de solução de conflitos “tradicional”, em que se elege o poder judiciário convencional, para incluir no contrato social da empresa a eleição de instrumentos como mediação e arbitragem”, recomenda Daniel Secches, da Unniversa Soluções de Conflitos.

Segundo Daniel Secches, o problema não é apenas a resolução em si, mas a incorporação de outros fatores que envolvem a necessidade de uma relação madura. “Há questões que são chave na resolução desses conflitos, como o sigilo, devido ao segredo dos negócios. Um contrato social adequado pode cuidar da preservação das relações pessoais e institucionais, e também fazer com que o foco do problema não prejudique a saúde do empreendimento”, orienta.

Já Camila Linhares, também da Unniversa, concorda. Ela lembra que uma empresa, ainda que tenha uma natureza de pessoa jurídica, é composta necessariamente por pessoas físicas. “Isto significa dizer que a empresa tem um objeto social, mas as pessoas que compõem esta sociedade possuem interesses pessoais, por vezes distintos, e, se estes não foram atingidos, consequentemente geram prejuízo para a relação empresarial”, alerta.

“Como as deliberações de uma sociedade passam por diversas formas de negociações, neste cenário o melhor caminho é uma política de ganha-ganha, em que seja definida a melhor escolha para o empreendimento e o interesse dos sócios, sem excluir a necessidade dos colaboradores”, sugere Camila Linhares. “Neste sentido, por exemplo, o uso da arbitragem no Brasil no contexto empresarial tem como vantagens a celeridade, a especialidade do julgador, a autonomia da vontade das partes, o sigilo, dentre outros benefícios”, enumera.

Daniel Secches conclui que, assim como são variados os tipos de conflitos vivenciados no contexto empresarial, também são muitos os métodos para solucionar cada tipo de caso. “Por isso, é importante diagnosticar cada litígio e identificar os desejos dos envolvidos para se encontrar a técnica mais ajustada de resolução. Há casos em que é necessário até se desenhar uma técnica, como no caso do Design de Solução de Disputas, em uma relação de adequação. Daí a importância de ter uma equipe especializada por trás”, finaliza.

Inteligência emocional é curinga nas relações

A concorrência no mundo dos negócios é diariamente uma arena onde a racionalidade e a tomada de decisões estratégicas são imperativas para o sucesso. Justamente por isso, o descontrole das emoções pode representar uma ameaça significativa, minando o potencial de crescimento e colocando em risco a estabilidade financeira dos seus negócios.

Segundo a terapeuta e especialista em comportamento empresarial, Simone Resende, desde pequenas startups até grandes corporações, os efeitos do descontrole emocional podem ser devastadores. “O descontrole emocional muitas vezes leva a decisões precipitadas e impulsivas. Em um ambiente empresarial, isso pode resultar em investimentos arriscados, parcerias mal concebidas e até mesmo na alienação de clientes. Quando as emoções dominam a razão, a capacidade de avaliar cuidadosamente os riscos e benefícios de uma decisão é comprometida, levando a consequências financeiras negativas”, afirma Simone Resende.

Mulher preocupada
Sobrecarga emocional pode levar a problemas de saúde mental | Crédito: Divulgação / Simone Resende

Relações interpessoais são fundamentais para o funcionamento eficaz de qualquer organização. “No entanto, o descontrole pode alimentar conflitos entre colegas, líderes e equipes, minando a colaboração e a coesão dentro da empresa. Disputas emocionais podem levar a um ambiente de trabalho tóxico, onde a comunicação é prejudicada e o moral da equipe é prejudicado, resultando em baixa produtividade e alto índice de rotatividade de funcionários”, acrescenta.

Além disso, o estresse e a ansiedade causados pelo descontrole não afetam apenas o desempenho no trabalho, mas também têm sérias implicações para a saúde mental dos colaboradores. A sobrecarga emocional pode levar a problemas de saúde mental, como depressão e burnout, reduzindo ainda mais a produtividade e aumentando os custos com licenças médicas e tratamento.

Com o mercado cada vez mais conectado, a reputação e a imagem corporativa são ativos valiosos. Oscilações emocionais graves podem resultar em comportamentos inadequados por parte dos líderes empresariais, como explosões de raiva em público ou declarações imprudentes em redes sociais. Essas ações ainda podem prejudicar a reputação da empresa, afastar investidores e clientes, e até mesmo atrair a atenção da mídia negativa, causando danos irreparáveis à marca.

Simone Resende acredita que para lidar com os efeitos negativos da instabilidade emocional nos negócios, é importante promover uma cultura organizacional que valorize a inteligência emocional e a comunicação eficaz. “Isso pode incluir programas de treinamento em habilidades de liderança, workshops sobre gestão de estresse e apoio psicológico para funcionários que enfrentam dificuldades emocionais.

Além disso, é essencial que os líderes empresariais atuem como modelos de comportamento emocionalmente inteligente, demonstrando calma e resiliência diante de desafios”, pondera a especialista.

Ao reconhecer e abordar esses desafios, as organizações podem cultivar um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo, capacitando seus funcionários a enfrentar os desafios profissionais com confiança e resiliência emocional.

Líderes são os mais denunciados por práticas abusivas

A tradicional pesquisa sobre denúncias corporativas na América Latina, realizada anualmente pela Aliant, empresa especializada em soluções completas para Ética, Compliance e ESG, apresentou um aumento de 23,65% nos registros em 2023, saltando de 152 mil em 2022 para 188 mil relatos qualificados neste último ano.

O crescimento é o resultado da maior conscientização do público em relação a comportamentos que não são mais aceitos; a multiplicação de canais nas empresas, seja por iniciativa própria ou por novas legislações; e a ampliação da confiança na eficácia dos canais.

A pesquisa foi baseada em 710 grupos empresariais de diferentes portes e segmentos. Em relação aos dados históricos, a Aliant registrou de 2019 a 2023 o volume de 665 mil relatos qualificáveis para a pesquisa.

Na edição deste ano, as lideranças e os gestores estão no centro das atenções, algo esperado, considerando o funcionamento e o objetivo dos canais de denúncias. Além de representar 64% das denúncias, ou seja, 120 mil relatos, os líderes também revelam um percentual expressivo em relação ao principal motivo pelo qual são denunciados: o relacionamento interpessoal.

Na pesquisa, as denúncias de relacionamento interpessoal representam 48%, ou seja, 90 mil registros. Desse total, 58%, ou seja, 52,2 mil relatos são somente contra o líder. Dentro desta tipologia, as práticas abusivas, ou seja, aquelas que envolvem assédio moral e agressão física, representam 44% das denúncias (39,6 mil). Desse número, 72% são somente contra o líder, ou seja, 28,4 mil registros.

“Esses dados demonstram a prevalência de problemas em relação às práticas abusivas no contexto das lideranças, destacando a necessidade de abordagens mais eficazes para prevenir e resolver tais questões no ambiente de trabalho”, explica Fernando Fleider, CEO da ICTS, controladora da Aliant.

Apesar da proporção de uma em cada três denúncias sobre líderes ser procedente, o que levanta questões sobre a qualidade da liderança e das relações interpessoais no ambiente de trabalho, a tendência de aplicação de feedbacks e orientação ocorre em 41% dos casos, enquanto a rescisão contratual é aplicada em 0,31% das situações. “Há uma tendência das empresas em preferir essas abordagens construtivas ao invés de medidas punitivas diretas, como a demissão, mas esta tendência pode vir a ser pressionada por novas gerações, que exigem posturas mais combativas contra o assediador”, esclarece Fleider.

Ainda considerando a relação líder e liderado, o relato anônimo neste caso também apresenta forte indicativo de preocupações com privacidade e retaliação. Quando analisados os números de denúncias do líder, o anonimato ocorre em 72,18% dos registros, enquanto nas denúncias em geral é de 63,67%.

Além disso, o tempo médio de resolução de denúncias sobre lideranças é sempre maior, com 55 dias, enquanto o tempo médio geral é de 47 dias. Isso sugere que casos envolvendo lideranças podem ser mais complexos ou exigir investigações mais detalhadas. De modo geral, o tempo de resolução em 2023 foi reduzido de 54 dias em 2022 para 47 dias, refletindo em uma melhoria significativa na eficiência operacional dos canais de denúncia, principalmente pelo uso da Inteligência Artificial, que passou a ser adotada pela Aliant para ajudar na identificação e na qualificação dos relatos.

Mais detalhes da pesquisa nos links abaixo:

Colaboradores de grupos de diversidade se sentem desconfortáveis

Na prática, a realidade das empresas que seguem políticas de Diversidade, Equidade e Inclusão (D&I) é pouco favorável a profissionais socialmente classificados como minorias (mulheres, negros, pessoas com deficiência e LGBTQIAPN+).

Como revela a pesquisa “Saúde mental, diversidade e ambiente de trabalho” da Lupa, startup de RH, a maioria dos grupos de diversidade se sente discriminada e em um ambiente que oferece baixa segurança psicológica (proteção e apoio a pessoas diversas).

O levantamento revela que uma proporção de 4 em cada 5 colaboradores de grupos de diversidade se sentem desconfortáveis ou não pertencentes ao ambiente de trabalho (79%). Já os que foram vítimas, presenciaram situações de discriminação, preconceito e/ou assédio no ambiente de trabalho, correspondem a 80% dos entrevistados.

Ainda na pesquisa, 53% dos entrevistados responderam que trabalharam ou trabalham em empresas que possuem ações para a promoção da inclusão e diversidade no dia a dia. Mas 62% admitiram que essas empresas não proporcionam um ambiente seguro e acolhedor para grupos de minoria.

Precursor

Para que os colaboradores possam manifestar livremente suas ideias, pedir ajuda e contestar padrões vigentes, precisam estar respaldados pela organização e protegidos de consequências sociais negativas. Nesse contexto, ambientes psicologicamente seguros são precursores da diversidade e da equidade de gênero, observa a psicóloga organizacional Patrícia Ansarah, fundadora e CEO do Instituto Internacional em Segurança Psicológica (IISP).

“Para que esta diversidade no local de trabalho aconteça, é preciso que as pessoas sintam que têm permissão de serem seus verdadeiros ‘eus’. Elas precisam se sentir bem-vindas e livres para contribuir com suas próprias ideias e perspectivas únicas, porque não há diversidade e inovação, sem inclusão de perspectivas diferentes. E não há estratégia de D&I que se sustente, sem segurança psicológica”, argumenta.

Como já evidenciado por pesquisas e casos práticos, é da diversidade de pensamento e formações que nascem as ideias inovadoras, continua Patrícia Ansarah. “Quando não há inclusão, diversidade e equidade de gênero, não há pontos de vista diferentes para que as conversas sejam levadas ao caminho da inovação. E sem inovação, não há crescimento.”

Ainda de acordo com Patrícia Ansarah, os resultados da pesquisa da Lupa revelam que a diversidade já é uma realidade nas empresas. Mas ainda é preciso promover mudanças no topo da organização para garantir que haja mais inclusão e equidade de gênero. “Não basta ter indicadores e ações criativas se a estratégia de negócio não estiver construída em cima do modelo da segurança psicológica”, assinala.

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