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Brasil enfrenta crise de deslocamento climático e carece de política pública, aponta estudo

País já tem 20 milhões de pessoas em áreas de risco, mas carece de política pública para enfrentar migração causada por secas e enchentes
Brasil enfrenta crise de deslocamento climático e carece de política pública, aponta estudo
Cenário de seca extrema ilustra os impactos das mudanças climáticas em comunidades vulneráveis | Foto: Reprodução Adobe Stock

O Brasil já enfrenta uma crise silenciosa de deslocamento climático, com milhões de pessoas afetadas por enchentes, secas e incêndios florestais, mas segue sem uma política pública específica para lidar com o fenômeno. A conclusão é do estudo Mobilidade Climática no Brasil: Migração, Território e Justiça Ambiental, elaborado pelo pesquisador Bruno Magalhães e lançado pelo Centro Soberania e Clima.

A pesquisa aponta que a falta de coordenação entre os órgãos federais e a ausência de um marco regulatório impedem o país de responder de forma eficaz a uma realidade que já pressiona orçamentos públicos, infraestrutura urbana e políticas de habitação e assistência social.

“O clima sempre interferiu na mobilidade humana, mas agora a magnitude do impacto exige respostas planejadas. O problema não é a mobilidade, e sim a falta de gestão do processo”, afirma Magalhães.

Atualmente, 20 milhões de brasileiros vivem em áreas de alto risco climático, e cerca de 1,5 milhão foram deslocados entre 2010 e 2022. Somente nas enchentes da Bahia e de Minas Gerais, em 2022, 257 mil pessoas ficaram desalojadas.

O estudo alerta que 60% dessas regiões não possuem infraestrutura adequada de monitoramento e resposta. Entre 2010 e 2023, dos R$ 69,7 bilhões destinados à prevenção de desastres, apenas 65% foram executados. Em 2024, o orçamento federal para prevenção representou 0,02% do PIB, enquanto os gastos emergenciais superaram R$ 3 bilhões.

Esses números, segundo o autor, demonstram um desequilíbrio estrutural entre prevenção e reação, que gera perdas econômicas, sociais e humanas recorrentes.

A pesquisa identifica quatro lacunas estruturais:

  1. Fragilidade dos sistemas de alerta e prevenção, com cobertura desigual entre as regiões Norte e Nordeste;
  2. Ausência de coordenação nacional, com ações dispersas entre ministérios e falta de liderança central;
  3. Carência de dados integrados sobre mobilidade climática – sem informações desagregadas por gênero, idade ou renda;
  4. Financiamento insuficiente e mal executado, com prioridade a respostas emergenciais em detrimento de infraestrutura resiliente.

“Deixar que o caos dite o ritmo tem custo econômico elevado. O estudo mostra que o Brasil gasta mais com desastres do que com prevenção, o que reforça a urgência de um planejamento coordenado”, pontua Magalhães.

Propostas de ação e impacto econômico

Entre as medidas sugeridas, o relatório recomenda a criação de um Fundo Nacional para Mobilidade Climática, com orçamento inicial entre R$ 110 milhões e R$ 225 milhões por ano, o equivalente a 0,05% a 0,1% das despesas discricionárias da União.

A proposta inclui ainda o fortalecimento dos sistemas de alerta precoce, o investimento em infraestrutura resiliente e a criação de um marco regulatório que reconheça o deslocamento climático como fenômeno de impacto econômico e social direto.

Tema ganha relevância diante da COP 30

Com a COP 30 marcada para ocorrer no Brasil, o tema da mobilidade climática deve ganhar espaço nas discussões internacionais sobre financiamento da adaptação e governança climática. O estudo busca subsidiar o debate, evidenciando que o deslocamento humano já é uma realidade no território brasileiro e demanda planejamento intersetorial para evitar agravamento de desigualdades regionais.

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