Ecossistema de inovação mineiro precisa de mais integração entre os membros

Estudo realizado pela Fundação Dom Cabral (FDC), em parceria com a A3Data – consultoria de dados e Inteligência Artificial (IA) –, no fim do ano passado, revela que quase metade das empresas mineiras (45,2%) adota uma abordagem seletiva em relação à inovação, priorizando iniciativas pontuais e estratégicas, gerando impactos diretos sobre o ecossistema de inovação do Estado.
Essa seletividade revela um perfil pouco afeito às mudanças estruturais e que acaba utilizando a tecnologia de forma apenas tática, para resolver problemas imediatos e, na maioria das vezes, somente depois de as empresas serem fustigadas por seus clientes/consumidores.
Em evento realizado pelo Centro de Referência em Inovação da Fundação Dom Cabral (CRI/FDC), o professor e líder da pesquisa, Hugo Tadeu, refletiu sobre a necessidade de se criar uma verdadeira conexão entre empresas privadas, organizações públicas e o investimento necessário para dar vazão às pautas de inovação e tecnologia.
“Os dados mostram que temos uma grande necessidade de estruturar a inovação nessas organizações, ou seja, uma clareza de estratégia e de resultado para que isso se reverta em uma cultura de transformação dessas organizações públicas ou privadas. Existe uma dicotomia em dizer que o problema é a cultura quando, na verdade, o problema é estrutural”, explicou Tadeu.
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Ao mesmo tempo, cerca de 31,7% das organizações do Estado adotam uma postura mais otimizadora, ou seja, são mais proativas em inovação, investindo em tecnologias para melhorar seu desempenho e acompanhando as tendências do mercado.
Além disso, a pesquisa revelou que apenas 23,1% se mostraram visionárias, investindo de forma intensa em inovação, com uma visão de longo prazo. De acordo com o relatório, a inovação é vista como uma forma de aumentar a eficiência operacional (38,5%) ou desenvolver novos modelos de negócio (22,1%). No entanto, estrutura e cultura (28,7%) aparecem como os principais obstáculos, refletindo a resistência a mudanças.
A falta de rentabilidade dos projetos também preocupa, sendo apontada por 22,3% dos entrevistados. Por outro lado, 10,6% acreditam que a inovação pode promover mudanças culturais, enquanto 9,6% destacam a criação de novos serviços como um dos principais benefícios.
“Fundamentalmente, existe dinheiro para o fomento dessas práticas de inovação, mas o que temos visto, também, é a necessidade de as empresas privadas entenderem as nuances desses recursos, assim como de terem projetos estruturados de inovação. A gente precisa de uma agenda estruturante, de longo prazo. Isso faz falta a Minas e ao Brasil. Do ponto de vista das empresas privadas, a inovação não deveria ser vista só como aquela pauta de geração de boas ideias e resultados no curto prazo. É preciso ter um bom planejamento estratégico com indicadores que sustentem essas iniciativas nas organizações”, avaliou o professor da FDC.
Por fim, a pesquisa também gerou um índice geral sobre a maturidade das empresas mineiras em relação à inovação, em uma escala de 1 a 6. O resultado foi de 3,7, indicando um nível intermediário de maturidade.
Para o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), Carlos Arruda, essa imaturidade é causa e sintoma de uma falta de confiança entre os membros do ecossistema de inovação em Minas e também dos próprios consumidores em relação à inovação.
Na primeira edição do Índice Brasil de Inovação e Desenvolvimento (Ibid), realizado pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), divulgado em agosto de 2024, o Estado aparece apenas em sexto lugar, com 0,378. Antes de Minas aparecem, em primeiro lugar, São Paulo (0,891), Santa Catarina (0,415), Paraná (0,406), Rio de Janeiro (0,402) e Rio Grande do Sul (0,401). A média nacional é de 0,291.
O Índice constitui um mapa da inovação no País, revelando o desempenho dos ecossistemas locais de ciência, tecnologia e inovação (CT&I) sob diferentes perspectivas. Medido por um número que varia de 0 a 1, o Ibid é um índice sintético que agrega 74 indicadores estatísticos coletados junto a fontes oficiais e/ou disponíveis publicamente, os quais são distribuídos em sete pilares:
- Instituições
- Capital humano
- Infraestrutura
- Economia
- Negócios
- Conhecimento
- Economia criativa
“Falando de Minas Gerais, que tem a economia ainda muito baseada em commodities, talvez o nosso desafio não seja pular da commodity para o produto de alto valor agregado, mas, sim, apoiar os próximos estágios dessa cadeia de valor. Então, no edital que vamos lançar na próxima semana, o Compete Minas, na Fapemig, vão ganhar pontos os projetos que tragam incrementalidade no desenvolvimento de alguma tecnologia. Entendemos que Minas vai continuar sendo um exportador de minerais, produtos agrícolas, mas será que não podemos exportar um produto com um pouco mais de valor agregado?”, destacou Arruda.
Já para o fundador da Samba e escritor, Gustavo Caetano, uma das grandes dificuldades para que um ecossistema de inovação seja ativo e potente é uma visão de futuro que se baseia no passado. E, em sociedades tradicionalistas como a mineira, isso se torna ainda mais grave.
“É natural que o cérebro projete o futuro com base no passado, porque ele sempre vai atrás de referências. Precisamos entender que o mundo e o desenvolvimento das empresas não são lineares. Historicamente, empresas líderes não sobrevivem ou não são mais líderes depois de passarem por um momento de crise no sistema e por uma disrupção tecnológica. Isso acontece porque estão presas a uma cultura passada, que não mais atende às necessidades do ciclo que se inicia”, analisou Caetano.
Para ele, é preciso saber como sobreviver (e prosperar) em um mundo dominado por IA, robôs, poder computacional e infraestrutura espacial. E, onde os entrantes não querem mais competir de igual para igual e a guerra é entre o ágil e o lento.
“Hoje, os novatos batem nos grandes onde eles são ineficientes. São milhares de ‘sardinhas atacando o tubarão’. Precisamos experimentar futuros. Ele já começou e é impaciente”, pontuou o empresário.
Para sobreviver nesse admirável mundo novo, ele orienta a:
- Foco no cliente: use dados reais para medir a satisfação, não só o ROI (retorno sobre o investimento). Inove onde o cliente sente dor.
- Uso estratégico da inteligência artificial (IA): crie comitê de IA, mapeie processos repetitivos. Pilote com IA generativa onde há atrito ou repetição. As empresas estão usando IA apenas como ferramenta no plano tático.
- Teste, erre e aprenda: implemente squads, sandbox, ciclos curtos. Mude o mindset de projeto para produto.
- Una dados, pessoas e tecnologia: teoria dos vidros quebrados. Use como ferramenta que vai te empoderar.
- Reinvente habilidades: leia, aprenda IA, leia dados e design thinking. Aprenda a perguntar. Aposte no poder do repertório e da diversidade. Valorize o conhecimento multidisciplinar. Ao invés de ter resposta pra tudo, precisamos ter repertório.
- Escale com ética: tecnologia sem consciência vira armadilha. Pense dentro da caixa. Tenha diretrizes claras de uso da IA e inclua o ESG nos processos de inovação.
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