Negócios

Especial: novo normal ressignifica casas de repouso

Especial: novo normal ressignifica casas de repouso
Crédito: Reprodução

Casas de repouso, instituições de longa permanência ou asilos. Os nomes são muitos, se misturam, mas pouco importa. O fato é que esses locais ganharam destaque na mídia há quase um ano, quando um novo tipo de coronavírus fazia estrago entre idosos em toda a Europa.

No Brasil, havia, ainda, a esperança de que o clima tropical pudesse ajudar a frear a velocidade da pandemia, mas a verdade é que essas instituições precisavam se preparar o mais rápido possível para continuar atendendo seus hóspedes/pacientes, manter a qualidade do serviço, controlar custos e ainda se livrar de vez da pecha de “depósito de velhos” que tanto incomoda.

Novos modelos de negócios estão surgindo e, mais uma vez, o uso cada vez maior da tecnologia moderniza a gestão e o atendimento aos idosos e suas famílias. O “novo normal” das Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) exige espaços amplos, profissionais especializados e bem treinados, atenção à legislação e muita transparência na relação com idosos e familiares.

Ágatha readaptou processos pós-pandemia

Relatório preparado pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), em abril de 2020, para subsidiar a Comissão de Defesa dos Direitos do Idoso da Câmara dos Deputados no enfrentamento da pandemia, mostrou o quanto as Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) são importantes para a contenção da doença não apenas para esse público, como também para toda a sociedade. Segundo o documento, havia cerca de 78 mil idosos em instituições credenciadas no Sistema Único de Assistência Social espalhados pelo Brasil.

Em meio ao alastramento da Covid-19 no Brasil, as ILPIs se desdobravam para entender o que estava acontecendo. Os protocolos sanitários começavam a ser colocados em prática e os custos explodiam com a compra de mais equipamentos de proteção individual (EPIs), afastamento de profissionais infectados ou membros dos grupos de risco, retreinamento das equipes e desconfiança das famílias.

Na região da Pampulha, no bairro Ouro Preto, em Belo Horizonte, a Ágatha Residencial Sênior, com capacidade para atender 12 pessoas, além de oferecer o sistema de day use, também precisou se adaptar rapidamente aos novos protocolos e criar condições para a continuidade do negócio.

Segundo uma das sócias da Ágatha Residencial Sênior, Nadeje Brant, nutricionista clínica atuando no atendimento domiciliar na área de geriatra há 16 anos, além de prestar consultoria e atendimento nutricional em casas de repouso, o aumento de custos obrigou a renegociação com as famílias e profissionais contratados para que o serviço continuasse a ser prestado com a mesma qualidade de antes e seguindo todos os protocolos de biossegurança.

“Não foi fácil promover novos treinamentos e arcar com os custos crescentes. Vi muitas casas diminuírem os atendimentos especializados, mas é claro que as famílias não gostam. Com a vacinação, vamos aumentar o número de estadias por dia. É imprescindível valorizar as atividades, resgatar a autoestima dos idosos, enfim, proporcionar a saúde como prevenção. O setor viveu um boom há quatro anos e continua em expansão. Sabemos que o número de idosos está crescendo no Brasil. O foco tem que ser no bem-estar, proporcionando independência dentro das condições de cada paciente”, afirma Nadeje Brant.

Nadeje Brant e Larissa Dumont | Crédito: Divulgação/Ágatha Residencial Sênior
Nadeje Brant e Larissa Dumont | Crédito: Divulgação/Ágatha Residencial Sênior

Outra aposta da Ágatha Residencial Sênior é no tratamento personalizado. Quem afirma é Larissa Aguiar Rabelo Dumont, enfermeira gerontóloga com ênfase em lesão cutânea, especialista em urgência, emergência, trauma e terapia intensiva, com experiência há mais de 10 anos na assistência ao idoso (home care, ESF, CTI) que divide a gestão da casa com a Nadeje Brant. “Disponibilizamos relatório mensal aos familiares contendo informações como a aceitação alimentar e hídrica, qualidade do sono, uso de medicamentos, função intestinal e urinária, participação das atividades, etc. Além disso, sugerimos às famílias um plano de cuidados focado na melhoria e/ou prevenção da parte cognitiva, motora e nutricional”, enumera.

Expansão – Para o sócio-fundador e diretor financeiro da rede da ILPI Terça na Serra, Pedro Moraes, a pandemia se dividiu em três momentos. O primeiro, de pânico com as notícias vindas da Europa e a mobilização das equipes para a criação de protocolos e treinamentos. O segundo, com as famílias fechadas em casa, os adultos em home office e os idosos dentro de casa correndo risco. Nesse momento – entre abril e junho – houve um aumento de demanda e unidades que estavam com 80% de ocupação passaram a ter fila de espera. E, por fim, a terceira fase a partir do começo da vacinação.

Pedro Moraes, cofundador da Terça na Serra | Crédito: Jonatan Wiliam

A rede tem, atualmente, 72 unidades. A meta para 2021 é fechar o ano com 120 casas, sendo 90 delas em pleno funcionamento. “As ILPIs passaram a frequentar o noticiário, gerando curiosidade. Isso foi bom para quebrar estereótipos muito antigos e ruins. Apesar de ter aumentado a demanda, tivemos um impacto muito grande nos custos. Isso tudo pressiona as operações e não dá para repassar para as famílias. Existe uma necessidade de gestão desses custos e transparência com os clientes. Temos também conversado com os donos dos imóveis em que estão instalados os ILPIs”, explica Moraes.

Em Minas Gerais, a rede tem uma unidade em Uberlândia, no Triângulo, e se prepara para inaugurar na Capital (na região da Pampulha) e Juiz de Fora, na Zona da Mata. As casas comportam entre 24 e 30 idosos com atendimento médico completo, além de área verde, alimentação, medicamentos e terapias auxiliares.

Para o empresário, o mercado caminha para soluções profissionalizadas de bom padrão, fugindo dos modelos arcaicos de maior ocupação por metro quadrado, mas que também não se transformem em hotéis de alto padrão. Para ser um franqueado da rede, o empreendedor deve dispor de um capital médio que varia entre R$ 480 mil e R$ 800 mil a depender do imóvel escolhido e o nível de reforma e adaptações exigidas.

Crédito: Jonatan Wiliam

“Temos uma vantagem de trabalhar em rede, então os custos foram rateados. Por exemplo, temos um sistema de monitoramento único para todas as unidades. No Brasil, ainda estamos engatinhando nesse setor. Temos, de um lado, um mercado bastante informal e quanto mais gente, melhor. Por outro lado, são quase hotéis com serviços muito personalizados. Enxergo um modelo híbrido de casas muito boas, adaptadas, com ‘cara de casa’”, pontua o sócio-fundador da Terça na Serra.

Startup MedLogic lança soluções para o segmento

A visibilidade obtida pelas Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) ao longo da pandemia também mostrou a gama de serviços em volta desses empreendimentos e como a tecnologia pode apoiá-las desde a gestão até os procedimentos médicos e ocupacionais como os idosos.

Nascida no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC/UFMG), a MedLogic se tornou uma startup especializada em atenção aos idosos. A plataforma oferece como soluções: prontuário eletrônico especializado na saúde da pessoa idosa; gestão de esforço e tempo dos processos executados por equipes multidisciplinares; controle de estoque dos medicamentos, alimentos e demais materiais usados pelas pessoas idosas; e gestão do Fluxo de Caixa, com lançamento de despesas e receitas por hóspede/residente.

De acordo com o CEO da MedLogic, Daniel Melo, a tecnologia tem ajudado a manter a sustentabilidade dos negócios. A maior parte das instituições não tem caixa para mais de três meses. “Criamos um módulo específico para as ILPIs, que vai do estoque ao controle das terapias. Fica na nuvem e permite o acompanhamento longitudinal de casa idoso, melhorando as práticas de gestão da enfermagem e da geriatria. No início de março, montamos um grupo de trabalho com instituições de referência. Era um protocolo que serviu ao Brasil e outros 10 países”, relembra Melo.

Daniel Melo | Crédito: Washington Costa
Daniel Melo | Crédito: Washington Costa

Para ele, no futuro, as instituições terão rotinas mais aprimoradas e maior entendimento sobre as doenças infecciosas. Além disso, a gestão digital deve favorecer essas instituições.

Para 2021, a empresa vai lançar, em parceria com o Hospital Albert Einstein, de São Paulo, um módulo baseado em inteligência artificial. “Estamos vivendo a revolução digital e as instituições geriátricas estão defasadas. Esse processo vai se intensificar. Eficiência é palavra-chave. A tecnologia atua muito bem nisso”, destaca o CEO da MedLogic.

A paulista IsGame, até março de 2020, através de cursos inovadores e divertidos, prometia manter o cérebro dos idosos ativos por meio de atividades de raciocínio lógico e interação social. Segundo o CEO da IsGame, Fabio Ota, sem aglomerações o jeito era treinar idosos para a convivência no mundo virtual, além das equipes das ILPIs e centros-dia para a missão.

Fabio Ota, CEO da IsGame | Crédito: Divulgação

Além dos cursos, a IsGame oferece gratuitamente o aplicativo “Cérebro Ativo”, que reúne jogos que ajudam a treinar o cérebro de forma divertida.

“Já em março, introduzimos cursos on-line para os idosos.Começamos um treinamento chamado ‘orientação tecnológica’ para explicar como ia funcionar. Começamos a fazer bate papo para eles se acostumarem com a ferramenta. Aos poucos pudemos voltar com os cursos de games. Nosso foco é a melhora cognitiva através dos jogos.Essa convivência diferente ajuda na saúde mental. Agora fizemos um programa para treinar os profissionais cuidadores para usar as nossas soluções. 2020 foi um ano difícil mas conseguimos nos reinventar e apoiar muita gente. Em 2021, voltamos aos cursos pagos, apostando no modelo de licenciamento”, destaca Ota.

Rádio Itatiaia

Ouça a rádio de Minas