Gestão colaborativa vai ancorar novo normal

Em meio à maior crise sanitária mundial dos últimos 100 anos, que, segundo dados oficiais, já tem cerca de 70 mil casos confirmados e caminha para 5 mil mortes por Covid-19 somente no Brasil, os setores produtivos no País tentam prever qual mundo surgirá depois que a fase mais aguda da crise passar.
Especialistas da área de saúde apontam que a pandemia deve atuar pelo mundo pelo menos pelos próximos dois anos, alternando períodos de maior isolamento social e outros de relaxamento.
A se confirmar essa expectativa, nenhum setor funcionará mais da mesma forma como aconteceu até aqui. Alguns terão sua lógica de funcionamento subvertida e, se “reinvenção” já era uma palavra comum no vocabulário empresarial, impactado pela crescente digitalização da economia, agora ela passa a ter um valor imensurável e sua prática instalada cotidianamente.
Por isso é preciso tentar “colocar a cabeça para fora d’água” mesmo em meio à tempestade e enxergar um futuro que se aproxima rapidamente. Traçar estratégias para o “novo normal” que virá é fundamental para a saúde das empresas, manutenção dos empregos e restabelecimento da economia nacional e mundial.
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Especialistas apontam estratégias gerais para a economia e específicas para setores e segmentos da cadeia produtiva. O certo é que nada será como antes e que é preciso traçar estratégias de sobrevivência imediata e outras para o pós-Covid-19 em um mundo impactado por uma recessão econômica severa – muitos já falam em depressão econômica – e relações comerciais desmaterializadas e digitais.
Logística – A logística, essencial para qualquer nação, e que no Brasil apresenta características e dilemas tão marcantes, já é e continuará sendo um dos setores mais afetados e demandados no pós-crise. Enquanto alguns param totalmente e a maioria reduz o ritmo e se mantém em marcha bastante reduzida por muito tempo, a logística continua trabalhando. As restrições de deslocamento impõem uma modificação de rotina imediata, os clientes têm novas necessidades e soluções precisam ser encontradas sem que o serviço seja paralisado.
Em um país de dimensões continentais como o Brasil, diferenças geográficas e sociais gigantescas e um modal preponderante – o rodoviário -, estabelecer parcerias, focar em estruturas mais enxutas e flexibilidade para atender as demandas de clientes e demais parceiros fazem parte de uma receita fundamental de sobrevivência nesse período mais severo da crise e no novo normal que se anuncia.
De acordo com o professor do Ibmec BH, mestre em economia e especialista em logística, Frederico Martini, algumas medidas tomadas pelos governos ajudaram a manter as empresas do setor de logística operando – como a flexibilização dos contratos de trabalho, por exemplo -, mas a verdade é que o setor não estava preparado para uma crise dessa natureza e nas atuais proporções.
Para ele, a principal estratégia nesse momento é trabalhar de forma colaborativa e procurar opções menos onerosas. “Muitas empresas estão trocando o transporte aéreo pelo marítimo que é mais barato, porém exige prazos bem maiores. Se agora as vendas estão paradas, existe tempo para a recomposição dos estoques para o futuro. Também as companhias aéreas estão transformando voos de passageiros em voos de carga com o objetivo de diminuir prejuízos. Esse tipo de serviço está demandando do agente de cargas novas atividades. Esse movimento tem sido feito, inclusive, para exportação com cargas compartilhadas, uma prática que não tínhamos antes”, explica Martini.
Ainda que o momento indique a necessidade de desenvolvimento de outros modais além do rodoviário e a integração entre esses diferentes modais (aéreo, ferroviário, hidroviário, marítimo) no Brasil, o professor não vê esse desenvolvimento possível no curto e médio prazo. A medida exigiria coordenação e investimentos públicos e privados pouco prováveis.
“A concepção tem que mudar, temos que aprender a lidar com outros problemas que podem vir daqui para frente. O Brasil precisa mudar o modelo de gestão. No médio prazo, não conseguiremos fazer uma integração eficaz de modais. A deficiência é muito grande. Infelizmente a questão política é lenta, a máquina burocrática muito pesada”, pontua o professor do Ibmec BH.
Ineditismo – Segundo o CEO da Pacer, Alexandre Caldas, o ineditismo dessa crise fez com que nenhuma empresa estivesse totalmente preparada para enfrentá-la. Aquelas que tinham uma situação financeira mais confortável e processos mais ajustados, tendem a ter um pouco menos de dificuldades. A primeira medida a ser tomada, para ele, é preservar o caixa.
“Essa era uma situação inimaginável no mundo e todos teremos que reinventar a forma de viver e de fazer negócios. Não prevejo uma recessão longa, logo a economia vai ter que girar novamente, mas a recuperação, sim, será lenta. Será um trabalho de muito tempo. Alguns lugares já começaram a reabrir, mas as pessoas estão receosas, segurando as compras. A China já voltou a produzir, mas poucos voltaram a comprar. Vamos viver uma época de poucos investimentos”, analisa Caldas.
Delivery – Impulsionado pelo isolamento social a logística de pequenas entregas (delivery) deve continuar crescendo, ainda que em menor ritmo, no pós-crise. Os grandes varejistas devem fazer investimentos importantes em logística, já que a tendência é que o e-commerce continue crescendo, exigindo o incremento das redes de entrega domiciliar.
Tudo isso, aliado à dificuldade de crédito para as pequenas empresas, que deve levar à concentração de negócios, pode desembocar em um setor mais colaborativo no futuro.
“Como é comum em grandes crises, existe uma tendência de quebra das pequenas empresas e, assim, uma concentração de negócios. Ao mesmo tempo, mesmo as grandes, vão ter que trabalhar mais em rede, buscando parcerias com serviços locais. O Brasil é um grande mercado, mas a nossa rede de distribuição é frágil. Não temos centros de distribuição (CDs) espalhados pelo País, como os Estados Unidos, por exemplo”, destaca o CEO da Pacer.
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