Entrevista: Presidente da Federaminas Mulher fala sobre superação e o fortalecimento do empreendedorismo feminino no Estado
A trajetória de Izabel Mendes confunde-se com a própria evolução do empreendedorismo feminino em Minas Gerais. À frente da Belpa Embalagens há 43 anos, a empresária transformou sucessivas crises econômicas e o enfrentamento ao machismo em combustível para uma gestão humanizada e resiliente. Um exemplo prático dessa força ocorreu durante a pandemia de Covid-19: enquanto o mercado recuava, Izabel investiu todo o capital da empresa em estoque de papelão e apostou na ascensão do e-commerce, garantindo a sobrevivência do negócio e de 114 famílias.
Hoje, essa experiência baliza sua atuação como presidente da Federaminas Mulher, braço da Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Estado de Minas Gerais (Federaminas). Com a missão de suavizar o caminho para novas líderes, ela lidera um movimento de interiorização, focado em dar voz e suporte técnico às pequenas associações e câmaras de mulheres. Nesta entrevista ao Diário do Comércio, a executiva detalha essa estratégia de expansão, reflete sobre a autenticidade na liderança e conta como transformou desafios em legado.
Empreender sempre foi uma vontade ou você se tornou empreendedora?
Essa é uma vontade que nasceu comigo. Criança, eu fazia pulseiras para vender para as colegas de escola. Eu sempre gostei de produzir e nunca vi o trabalho como um fardo. A minha mãe me ensinou a encarar os desafios e dores com bom humor e otimismo. Quando comecei a Belpa com o meu sócio Paulo Silveira, não tínhamos dinheiro, mas tínhamos uma vontade enorme. Enquanto ele cuida do financeiro, vou para a frente dos negócios. Foram muitos dias sem dormir, enfrentando viagens cansativas, mas tudo valeu a pena. Hoje não é mais fácil, mas é diferente. A experiência nos dá mais calma para resolver as coisas.
Com mais de 40 anos de mercado, a Belpa passou por diversos momentos importantes e difíceis da nossa história. A pandemia de Covid-19, você já disse em outras oportunidades, talvez tenha sido o mais crítico deles. Você pode contar como superou essa fase?
Na pandemia, o mundo parou e a gente não sabia como seria o dia seguinte. Com as pessoas dentro de casa, eu tive a clareza de que elas apelariam para o e-commerce e que o mundo ia precisar de embalagens de papelão. Se o mundo parou, as pessoas teriam que levar o mundo para casa. Peguei todo o dinheiro da Belpa e gastei em papelão. O detalhe é que não trabalhávamos com esse material, então tinha também que adaptar o maquinário. Foi uma loucura, mas não tive medo porque não havia outro caminho. Íamos fechar e, para piorar, o Paulo [Silveira] teve a doença e foi intubado. Eu tinha 114 famílias sob a minha responsabilidade. Deu certo. Em um determinado momento não havia papelão no mercado e eu tinha para vender. Repassei a metade, recuperei o investimento e iniciamos uma nova fase. Costumo dizer que a crise não me pega porque não dou chance para ela.
Trato a Belpa como se ela fosse um ser vivo que precisa ser cuidado, que precisa respirar e descansar. Sempre fiz uma gestão humanizada e já fui muito criticada por isso. Hoje sabemos que a empresa que não é humanizada vai acabar.
Agora, falando do trabalho na Federaminas Mulher. Como você chegou à entidade?
É preciso entender que o mundo de hoje é coletivo. Represento mais de 10 mil mulheres. Nosso movimento busca conquistar espaço por meio de resultados e talento. Não é uma questão de mulheres contra homens, mas de oportunidade e reconhecimento. O associativismo é importante para o fortalecimento mútuo, a partir não de um personagem, mas da autenticidade e da transparência, focando em resultados e legado.
Eu sempre tento mostrar para as pessoas o caminho mais fácil. Eu e o Paulo [Silveira] vivemos uma verdadeira saga, sem ninguém para apontar o caminho. Tudo foi na base da tentativa e erro, e isso exige muita coragem. Você tem que aprender a colocar as coisas que te rodeiam de uma maneira orgânica, senão, tudo vira um fardo.
E como você faz para atender um estado tão grande, diverso e desigual como Minas?
Minha estratégia é ampliar os espaços, não disputá-los, e priorizar o apoio às pequenas associações, que de outra forma continuariam invisíveis. Dividimos o Estado em nove regiões, seguindo o modelo do Sebrae para facilitar a obtenção de recursos. Vou dar o exemplo do Sudoeste de Minas, onde o número de câmaras de mulheres cresceu de quatro para 22 em um curto período. Focamos em líderes sensibilizadoras em cidades menores, incentivando encontros regionais para alcançar mais municípios. Esse trabalho tem levado mulheres do movimento a ocupar cargos de liderança política, como vereadoras e secretárias de desenvolvimento econômico.
A gente não pode e não precisa disputar espaço. Devemos ampliar os espaços. E quando a gente chega lá, tem obrigação de fazer caber mais gente. Partindo disso, quando eu assumi, eu deixei claro para o presidente da Federaminas, Valmir Rodrigues da Silva: Eu vou focar em dar colo para as pequenas e fortalecer as grandes.
Trabalho também para preparar uma nova liderança para a Federaminas Mulher, pois o movimento está se tornando grande demais e não quero que o meu sucesso pessoal ofusque a organização. Os resultados da Federaminas Mulher são exponenciais, e tenho orgulho de ter construído isso, mas tenho mais orgulho ainda de ter colocado a minha essência, porque ninguém sustenta um personagem por muito tempo. Sempre falo: faça, seja autêntico, seja transparente, seja verdadeiro, sem ser arrogante, porque, às vezes, as pessoas confundem sinceridade com falta de educação.
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