Millennials estão moldando a agenda ESG nas corporações

Uma pesquisa organizada pela consultoria Korn Ferry sobre o futuro do trabalho mostra que examinar os negócios quanto à sustentabilidade e boas práticas sociais e de governança é uma tendência, principalmente entre os mais jovens. Mais de 60% dos millennials – aqueles nascidos entre os anos 1981 até 1996 – afirmam que se sentiriam mais inspirados em uma empresa que tenha uma boa política de ESG, assim como são mais fiéis a essas empresas.
Ao mesmo tempo, o número de empresas brasileiras que têm adotado práticas ambientais, sociais e de governança – o chamado ESG -, ou pelo menos declaram ser adeptas, vem crescendo nos últimos anos. O levantamento Panorama ESG Brasil 2023 examinou a adoção dessas práticas no mercado brasileiro. Um dos destaques mostra porque as empresas aderem aos pilares ESG: para 61% dos entrevistados, as práticas têm o objetivo de fortalecer a reputação da marca no mercado e apenas 40% afirmaram que o ESG tem a finalidade de reduzir os riscos ambientais, sociais e de governança
Para entender como o ESG é compreendido pelas diferentes gerações e qual o papel do RH na integração geracional com o objetivo de criar empresas mais responsáveis e rentáveis, o Diário do Comércio conversou com a especialista e mestre em gestão humana e social, a professora Andrea Moreira. Fundadora e CEO da Yabá Consultoria, nos últimos vinte anos, ela tem se destacado nas áreas de Sustentabilidade, Investimento Social e Advocacy.
Entre 28 e 43 anos, os millennials já ocupam cargos de média e alta liderança. Qual a importância dessa geração na criação e condução das estratégias ESG?
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Cada geração tem uma visão diferente sobre vários aspectos e, obviamente, tais vivências impactam em como esses profissionais aderem e valorizam a cultura adotada pelas empresas. Trabalho há mais de 20 anos com a causa da sustentabilidade e vejo o empoderamento de diferentes grupos, especialmente das mulheres. Isso diz muito sobre o desenvolvimento da sociedade. A visão e postura da mulher, que consegue conciliar diferentes dimensões da vida, gera impacto em toda a sociedade. E, claro, também na visão de futuro, posicionamento e postura da empresa. Isso tem tudo a ver com as estratégias da empresa, com o desenvolvimento das oportunidades. As empresas querem se relacionar com os mais jovens. É a primeira vez que temos a estrutura familiar inteira dentro da empresa. O conflito geracional sempre existiu, mas agora ficou mais difícil porque a mudança entre as gerações foi encurtada, passando de dez para cinco ou até três anos. O desafio da alta liderança é entender os novos hábitos e comportamentos, reconhecendo e valorizando a diversidade para criar algo inovador. Eu acredito nos jovens, na entrega deles.
E qual o papel do RH para que essa integração seja efetiva e que gere bons resultados no pós-pandemia?
A pandemia foi caótica e atingiu a todos, mas de formas diferentes. O ponto principal do RH é considerar que vivemos em um tempo complexo e instável e que não é possível dissociar o pessoal do profissional. Então, quanto melhor for a pessoa, melhor será o profissional. Quanto mais autoconhecimento, mais qualificada ela será como profissional. Então, eu sendo parte mais madura nessa relação, sendo a líder, devo olhar para todos os perfis que lidero. Eu que tenho o desafio de aprendizado, de lidar com essa diferença. A primeira coisa é cuidar do desenvolvimento da alta liderança e entender que essa nova geração, realmente, veio com novos olhares, novos hábitos e comportamentos. O que deu certo lá no passado, não dará certo agora. O RH precisa estar junto à liderança, entendendo a estratégia do negócio. A sociedade, às vezes, nem sabe direito o que quer, mas o líder precisa se antecipar. A tendência da sociedade é olhar de forma mais coletiva, integrando as decisões aos impactos ambientais e sociais. A partir disso, a gente já sabe para onde ir.
Se, ao longo do tempo, existia dentro das empresas o preconceito contra os jovens, hoje vemos o etarismo (preconceito contra os mais velhos) crescendo. Como fazer para não trocar um problema pelo outro?
Precisamos lidar com a questão do etarismo, porque muitas vezes vi jovens executivos, que estão nos cargos de média gerência ou começando a alta liderança, não querendo lidar com as pessoas mais velhas porque elas não são hábeis o suficiente nas redes sociais ou nas tecnologias diversas, e muito mais porque elas questionam as ordens ou as decisões dos mais jovens. Daí a necessidade do desenvolvimento desses jovens líderes porque eles podem gerar mais um preconceito. Há de se desenvolver esse jovem para entender as habilidades e competências das pessoas mais velhas e que elas têm muito a agregar, principalmente em um mundo de superficialidade. Ao mesmo tempo, a geração mais velha precisa entender o seu novo lugar. Se os mais velhos se desenvolverem com um olhar de educadores, de facilitadores do desenvolvimento do outro, será bom para todos. Creio que existe um desafio de inteligência emocional para os dois públicos. As empresas precisam sair daquele formato padronizado e entregar o que de fato cada público precisa.
A pandemia escancarou a necessidade de adotarmos o ESG dentro das empresas, porém enfrentamos, ainda, muita resistência e uma oposição que descredibiliza o discurso de responsabilidades social e ambiental e utiliza as fake news como instrumento. Como podemos garantir os avanços conquistados pela sociedade nessa questão?
Na época da pandemia achávamos que sairíamos daquele caos pessoas melhores, mas muitas pessoas não mudaram. O lado bom, porém, é que muitas outras mudaram e os resultados disso vão aparecer nas próximas décadas. Tem muita coisa acontecendo: mudanças no estilo de vida, na visão de mundo, de propósito e conexão maior com a humanidade e o meio ambiente. Acredito que isso vai acontecer na política também. As fake news são um ponto de atenção para todos nós. Hoje não vivemos uma crise econômica ou política, vivemos uma crise de valores porque seguimos acreditando em coisas que não fazem mais sentido. Um exemplo é a ideia de virilidade e poder no imaginário brasileiro que é ultrapassada. Quando uma fake news valoriza esse perfil viril é bem recebida por quem tem uma visão de mundo alicerçada nessas ideias. Então, as pessoas precisam ficar alertas sobre essa prática. Muitas pesquisas apontam que pessoas e empresas não estão abrindo mão do lucro, mas não estão só a serviço dele. Isso muda tudo, especialmente para os executivos líderes que precisam considerar todos os aspectos ambientais, sociais, econômicos, culturais e a estética na sua tomada de decisão. A sociedade só será sustentável e próspera quando for bom para todo mundo.
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