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Mais de 74% das mulheres já sofreram assédio

Pesquisa da Infojobs revelou que, em 72,2% dos casos, a vítima foi abordada por seus superiores
Mais de 74% das mulheres já sofreram assédio
Crédito: Reprodução Freepik

Embora a Constituição de 1988 estabeleça que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, a igualdade ainda está em falta em diversas áreas, especialmente na vida profissional. Um levantamento exclusivo do Infojobs, HR Tech que desenvolve soluções para RH de empresas, mostrou que 88,5% das mulheres acreditam que as oportunidades não são as mesmas para ambos os gêneros e mais: 74,1% das entrevistadas afirmam já ter sofrido assédio ou preconceito na vida profissional.

A abordagem partiu de superiores em 72,7% dos casos, seguido de colegas de trabalho em 12,9% das vezes. A maior parte das participantes (43,8%) teve receio de reportar e omitiu a situação. Apenas 25,7% se posicionaram no mesmo momento, 16,7% pediram demissão e 3,8% comunicaram ao RH.

“Alertar sobre esse cenário tão triste no mercado de trabalho é importante o ano inteiro, mas, especialmente no Mês da Mulher, em que todos os olhares estão voltados para o tema. Precisamos falar sobre como tornar ambientes profissionais mais igualitários desde a base, lá no processo seletivo e também na cultura das empresas”, comentou a CEO do Infojobs, Ana Paula Prado.

O apontamento de Ana Paula Prado é reforçado por números apresentados no levantamento. Afinal, 61,9% já enfrentaram situações invasivas em processos seletivos, onde o foco não era apenas suas habilidades profissionais. A situação é pior em áreas predominantemente masculinas, como engenharia ou tecnologia, já que 89,7% das respondentes acreditam que o gênero influencia na contratação.

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Uma vez inseridas no mercado de trabalho, as barreiras se mantêm. Na percepção de 88,4%, as mulheres enfrentam mais dificuldades para se desenvolver quando comparado com outros grupos. Além disso, 69,7% afirmam que já tiveram a credibilidade questionada apenas por ser mulher.

Entre os principais desafios enfrentados, destacam-se: conquistar uma oportunidade de emprego (27,7%) e a dificuldade para conquistar reconhecimento e crescer profissionalmente (26,3%). Em 2022 a mesma pergunta foi feita, e os mesmos pontos apareceram em destaque.

Com os preconceitos sociais, 78,9% das entrevistadas responderam que sentem a necessidade de que uma mulher seja mais qualificada para assumir cargos de liderança. Para 96,3% das participantes, a promoção de mulheres ajuda a incentivar outras profissionais.

Isso porque 66% das entrevistadas afirmam que nunca trabalharam em uma empresa onde a quantidade de mulheres na liderança era maior do que a de homens.

“A liderança feminina pode ter mais sensibilidade diante de alguns assuntos, como licença maternidade. No entanto, reforço que a igualdade precisa ser trabalhada como um todo, especialmente em lideranças masculinas. Precisamos desconstruir padrões. O fato de uma colaboradora ter filhos ou não, não deve ser relevante nem no processo seletivo e muito menos ser usado como critério de demissão”, conclui Ana Paula Prado.

Decreto pode gerar tsunami de processos

No final de novembro o Diário Oficial da União (DOU) publicou o Decreto nº 11.795, que regulamenta a Lei nº 14.611, considerada um marco no sentido de estabelecer as regras relacionadas à igualdade salarial entre mulheres e homens. O instrumento aponta o mês de março de 2024 como primeiro prazo para as empresas apresentarem os Relatórios de Transparência. Este documento terá por finalidade oferecer as informações necessárias para viabilizar a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos.

Mas, apesar da distância ainda relativamente grande até esta data, a movimentação em torno do tema já tem levado as empresas a buscarem apoio jurídico se preparando para um tsunami de processos. A hipótese é de que a medida vai gerar exposição dos valores recebidos pelos trabalhadores, que será seguida de constrangimentos e questionamentos, terminando numa corrida aos tribunais pela quebra do sigilo.

O advogado Gabriel Henrique Santoro, do escritório Juveniz Jr. Rolim e Ferraz Advogados, afirma que desde a publicação das novas regras o escritório já foi procurado por duas empresas que se enquadram no perfil de abrangência da legislação. “Os departamentos de Recursos Humanos estão desesperados e em busca de alternativas para cumprir com as regras do novo decreto sem, ao mesmo tempo, ferir o sigilo necessário neste tipo de relação”, explica.

Segundo ele, o grande problema é que para não arcar com uma multa que pode chegar a até 100 salários mínimos para hipótese de descumprimento, uma empresa que tenha mais de 100 empregados precisará publicar esses relatórios periódicos em locais de grande visibilidade, inclusive nos sites das próprias empresas.

“É neste ponto que reside o problema já que, mesmo não citando os nomes das pessoas, será muito fácil identificar pelo cargo ocupado nas empresas quem são as pessoas e quanto cada uma delas recebe de remuneração. Tradicionalmente, expor os vencimentos das pessoas costuma gerar muito desconforto e guerras judiciais”, afirma.

Santoro ressalta que a alternativa para evitar este ciclo perigoso para o ambiente trabalhista seria realizar uma mudança no Decreto, fazendo com que a obrigação das empresas fique restrita ao envio do relatório para o Ministério do Trabalho, sendo dispensada a divulgação destas informações nos canais oficiais ou na internet. “Neste caso, os fiscais do trabalho teriam totais condições de fazer a análise de eventuais disparidades de gênero, tomando as providências cabíveis. Isso protegeria as empresas de acusações relacionadas à divulgação de informações sigilosas, bem como preservaria a intimidade do empregado”, comenta.

Ele lembra ainda que a tão desejada equidade entre homens e mulheres vem sendo buscada desde as versões mais remotas da CLT, quando o artigo 461 estabeleceu que “sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá, igual salário, sem distinção de sexo”.

De lá para cá, de acordo com ele, foram introduzidas novas exigências, estabelecidos critérios e regras com o objetivo de assegurar esse direito, mas as dificuldades demonstradas para a conformidade com essa exigência de exposição dos salários revelam mais uma vez que é preciso um esforço ainda maior para ir além da boa vontade e dos textos bem escritos.

“As leis funcionam como asseguradoras dos desejos da sociedade, mas neste caso, a impressão que se tem é que, se a sociedade pretende mesmo fazer com que homens e mulheres recebam o mesmo salário em situações iguais de prestação de serviço, será necessário muito mais do que o estabelecimento de normas. A conquista deste patamar exige mudanças na estrutura social que passam pela educação, cultura, geração de oportunidades e uma série de aspectos que possam fazer com que essa equiparação passe a ser natural e não forçada por instrumentos fiscalizatórios e punitivos”, conclui.

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