Projeto visa reforçar laços de britânicos e mineiros

Duas tradições separadas por um oceano, mas unidas por laços históricos. O que começa por causa da mineração de ouro e tem relação com a Revolução Industrial, tem continuidade hoje por um intenso intercâmbio econômico e cultural e se revela em uma fina iguaria britânico-mineira: a queca.
O bolo é um símbolo da cidade de Nova Lima – na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Tombado como bem imaterial do município, é uma versão “mineirizada” do Christimas Cake trazido pelos ingleses para Minas Gerais no século 19.
E é a partir desses laços, que também são afetivos, que o cônsul britânico em Belo Horizonte, Lucas Brown, quer fortalecer as relações entre os dois territórios. O caminho escolhido é a gastronomia.
“O consulado em Belo Horizonte funciona como um escritório de negócios e estamos em um momento muito oportuno. Existe uma nova geração de mineiros ambiciosos, orgulhosos da própria história e que querem que o mundo todo conheça Minas Gerais. Do outro lado, temos a Inglaterra, especialmente Londres, cada vez mais aberta ao mundo, onde pouca gente conhece Minas Gerais e Belo Horizonte. É um campo enorme de oportunidades”, explica Brown.
Para isso, um passo importante é a apresentação da culinária britânica no Festival Minas é o Mundo, que vai acontecer entre os dias 9 e 11 de setembro. O tradicional Bitaca Capetinga – bar localizado no bairro Anchieta, na região Centro-Sul –, que foi o responsável pelo bufê da festa do Jubileu da Rainha, realizada pelo Consulado – vai apresentar dois pratos típicos da terra de Shakespeare: o vitoriano fish and chips e a emblemática torta de maçãs.
“A gastronomia britânica não é tão popular como a italiana ou a japonesa, por exemplo, mas está espalhada pelo mundo e passando por uma grande modernização neste momento. E tem muitas semelhanças com a comida mineira. Um dos pratos mais pedidos nos pubs londrinos é a barriga de porco, tão apreciada em Minas Gerais”, pontua.
E a culinária britânica tem mesmo se espalhado. Em março desembarcou na Capital a primeira loja da rede FiChips – franquia de food service com pratos típicos do Reino Unido. Instalada no bairro de Lourdes (região Centro-Sul), a unidade conta com o tradicional happy hour de segunda a quinta-feira, e estão sempre em alta o lanche London Burguer e a porção Fish and Chips, representando quase 50% das vendas de todos os produtos da loja.
“Além desses, temos um cardápio repleto, com diversas opções, como fish e onion, onion rings, fritas, batata recheada, escondidinho inglês, opções de salada, pratos executivos e as tábuas de aperitivos”, enumera Sérgio Saliba, um dos sócios da casa inaugurada em Belo Horizonte.
Além dela, são mais duas unidades no Estado, uma em Araxá, no Alto Paranaíba; e outra em Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. Mais duas estão em processo de implantação: Juiz de Fora, na Zona da Mata; e outra na Capital. Esta última com previsão de abertura ainda em agosto.
Turismo gastronômico
Os números do turismo mundial dão razão ao cônsul. A atividade gastronômica vem sendo utilizada por diversos países como diferencial para atrair turistas e investidores. Países como Peru, Espanha, França e Japão têm trabalhado o posicionamento dos seus produtos mais tradicionais, vinculando-os ao local de origem, para transformá-los e consolidá-los como fonte de dinamismo econômico.
Um caso bastante conhecido e emblemático é o do Peru. O nosso vizinho venceu por cinco anos consecutivos (2012 a 2016) o World Tourism Awards, na categoria melhor destino gastronômico. E, antes da pandemia, dos 33 milhões de habitantes, 6,2 milhões trabalhavam no setor. Em 2017, a Feira Mistura – umas das maiores feiras gastronômicas da América Latina – recebeu 400 mil visitantes, sendo 30 mil turistas estrangeiros.
O chef de cozinha e empresário Eduardo Maya, idealizador de projetos como a Feira Aproxima, entre outros, destaca que assim como o Peru, a gastronomia mineira despontou para o mundo a partir da homenagem recebida pelo Madrid Fusión – considerado um dos mais importantes congressos de gastronomia do mundo -, em 2013. Geralmente o evento escolhe países como tema, mas Minas Gerais foi a primeira unidade subnacional a receber essa honraria.
“O Madrid Fusión foi um divisor de águas. Naquele momento setor, governo e sociedade se envolveram e deram início a um movimento importante da gastronomia como vetor de desenvolvimento econômico e de identidade do nosso povo. A eleição de Belo Horizonte como Cidade Criativa pela Gastronomia pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) foi outro impulso importante. A gastronomia hoje é a maior ferramenta de internacionalização do Estado e da Capital. As pessoas vêm para Minas para conhecer todas as nossas riquezas e a primeira delas é a gastronomia. A nossa culinária é tão reconhecida, que os restaurantes de comida mineira estão espalhados pelo Brasil inteiro. Isso acontece com pouquíssimos culinárias estaduais”, analisa Maya.
Segundo dados da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult), cerca de 24% dos turistas que visitam Minas Gerais têm na gastronomia a principal imagem do Estado. O sucesso da típica comida mineira tem ajudado na disseminação de produtos especiais do Estado como cervejas, azeites, cafés e queijos, entre outros.
“Temos uma grande oportunidade de mostrar os produtos mineiros ao mundo pela sua qualidade e por outras características muito valorizadas por consumidores e investidores, como a responsabilidade socioambiental. São produtos que têm recebido os mais importantes prêmios internacionais, com alto valor agregado, capazes de gerar divisas para o Estado e trabalho e renda para uma longa cadeia produtiva que começa com o pequeno produtor”, avalia o cônsul britânico em Belo Horizonte.
Produtos esses que fazem parte do dia a dia do chef Eduardo Maya à frente da Pitza 1780. A casa, criada em 2016, nasceu do questionamento da qualidade das pizzas oferecidas ao público, aliado ao desejo de valorizar os melhores ingredientes locais. Um exemplo é a castanha de baru, que estrela um dos sabores mais pedidos: a pizza Pesto de Baru. A iguaria leva molho de tomate, muçarela e pesto de baru (castanha do Cerrado mineiro processada com azeite, queijo minas artesanal curado, alho e manjericão).
Com duas unidades na região Centro-Sul, o empreendimento está se aprontando para virar uma rede de franquias. Sem deixar escapar muitos detalhes, o chef diz que essa era uma meta desde o início, porém era preciso traçar a estratégia correta.
“Estamos no processo final de formatação e espero lançar o nosso plano de franquias para o mercado em quatro meses. Fizemos tudo com calma, com muito foco em qualidade. Queríamos ser desejados pelo mercado. Temos agora um modelo adequado, com novidades no cardápio, simples e objetivo e uma operação enxuta”, revela o empresário.
Ouça a rádio de Minas