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Protagonismo sustentável desponta como futuro da mineração, aponta estudo

Confira a entrevista exclusiva com o sócio e diretor de Operações da Academic Venture, Lucas Tomás
Protagonismo sustentável desponta como futuro da mineração, aponta estudo
Foto: Diário do Comércio / Daniela Maciel

Qual é o futuro da mineração? Essa pergunta pode ser perturbadora em muitos sentidos. O setor, que está na base da economia mineira e também da nacional, é determinante para o sucesso de quase todos os outros – da agricultura ao lançamento de satélites, da cosmética à segurança energética. Ao mesmo tempo, por seu grande impacto socioambiental, é visto com desconfiança por boa parte da população mundial.

Buscando traçar não só um futuro possível, como desejável para a mineração, a Academic Venture, em parceria com a KR Capital e a FCJ Venture Builder, realizou o estudo Mining Map 2040. O esforço deu origem a um relatório com mais de 300 páginas e contou com a participação de cerca de 300 fontes especializadas. Foram processadas mais de 1 milhão de linhas de informação, mapeando mais de mil sinais de futuro. Esses sinais foram agrupados em 17 drivers de transformação, que orientaram a construção de quatro cenários futuros para o setor mineral.

O cenário preferido, batizado como “Protagonismo sustentável”, traz uma visão desejável e alinhada com os princípios de sustentabilidade, eficiência e inclusão. Por isso, a entrevista especial da página Vanguarda de hoje é com o sócio e diretor de Operações da Academic Venture, Lucas Tomás.

Então, é possível fazer uma mineração justa e responsável?

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É possível e essencial! O nosso estudo tem a pretensão de indicar como será o futuro da mineração brasileira nos próximos 15 anos, especialmente para as pequenas e médias mineradoras. Essa parcela de médias e pequenas não tem toda a estrutura para imaginar o futuro, se posicionar da forma adequada e reivindicar os caminhos que enxergam.

O Mining Map é um estudo muito amplo. Escutamos mais de 300 fontes de informação, compilamos milhares de dados, identificamos os principais sinais que vão moldar o futuro da mineração até 2040 e conseguimos traçar alguns cenários estratégicos.

Entre eles, a inovação sustentável. Ela é um dos elementos fundamentais para garantir a licença social para operar, reduzir os impactos ambientais e, sem dúvida, tornar um setor muitas vezes estigmatizado, socialmente justo, ambientalmente correto e economicamente viável.

É possível entender o protagonismo sustentável como o cenário mais desejável e também viável. Mas ele é o mais provável?

Sim, é o mais provável, mas ele corre uma série de riscos. Entendemos que o futuro não é previsto, ele é construído. Dos cenários possíveis, identificamos aqueles que são plausíveis e, entre eles, aquele que vamos trabalhar para construir. Assim, chegamos a quatro grandes cenários. O que chamamos de protagonismo sustentável é o que tem maior probabilidade de acontecer e um caráter mais evolucionista, ou seja, não muda radicalmente a percepção de como o setor é hoje. Porém, entendemos que existe outro cenário com grande probabilidade de ocorrer também, que é o que chamamos de “Corrida aos recursos”.

Esse é um cenário com caráter mais revolucionário e também preocupante, porque sua concretização decorre da escalada geopolítica das disputas que temos observado. Temos a questão entre Israel e Irã; a guerra da Ucrânia, que também tem a exploração mineral como plano de fundo. Acompanhamos outras disputas geopolíticas, como a que envolve a Groenlândia e a defesa do Mar do Norte pelos Estados Unidos, ambas com perspectiva mineral.

O mundo vem passando por uma escalada geopolítica que redefine fronteiras, e a mineração também entra como pano de fundo, principalmente pela demanda por tecnologia de terras raras e minerais críticos. Estamos no meio de uma disputa em que o cenário de corrida aos recursos é bastante factível, mas entendemos que o protagonismo sustentável ainda é o cenário de maior probabilidade.

O Brasil, além de grandes reservas minerárias, tem estabilidade política. Podemos capitalizar diante dessa instabilidade geopolítica global?

O nosso estudo olha 15 anos para frente. As notícias que acompanhamos no calor do momento são muito importantes, porque representam o cenário atual, mas muitas vezes acontecem com muitos ruídos. Precisamos olhar, no longuíssimo prazo, para os grandes movimentos. Temos que entender, ao longo do tempo, o que de fato é concreto e o que é uma retórica pontual e, muitas vezes, política.

Há alguns dados muito interessantes: o território brasileiro é pouco mapeado. Temos apenas 25% do nosso País mapeado em uma escala suficientemente precisa e, quando olhamos para os grandes players da mineração, esse número ultrapassa 50%. Portanto, há um ponto de pesquisa e desenvolvimento muito importante para identificarmos quais são as nossas oportunidades.

Se eu pudesse destacar três pontos que chamamos de “ações vencedoras” para mudar o panorama da mineração brasileira, o primeiro seria a automação, que impulsiona a produtividade. Esse é um cenário que já está se concretizando. Os países de ponta investem massivamente em automação e produtividade, e os resultados são muito positivos.

Outro fator muito importante, atualmente em discussão nas nossas camadas legislativas, é a redução do tempo médio de licenciamento, que, no Brasil, é superior a 10 anos. Não falamos em reduzir esse tempo em detrimento das discussões sobre impacto social, ambiental e viabilidade econômica. Precisamos ter mecanismos que tornem esse processo mais eficiente.

E o terceiro é o investimento maciço em pesquisa e desenvolvimento (P&D). O Brasil, em média, investe cerca de 0,3% do PIB em P&D – valor que engloba todos os setores, não apenas a mineração. Minas Gerais se destaca porque, constitucionalmente, investe ao menos 1% do PIB. Isso já é um diferencial em relação à média nacional, mas ainda é pouco. As grandes potências investem taxas acima de 2%. Em um cenário de corrida por minerais críticos, novos processos metalúrgicos e rotas mais sustentáveis, o investimento massivo em P&D não será suficiente.

É nítido que as pequenas e médias empresas ficam, muitas vezes, com as operações que as grandes empresas não têm interesse, mas que são necessárias. Qual é o papel das grandes mineradoras no fortalecimento da cadeia produtiva?

Um ponto importante é que essa cadeia produtiva é a mais horizontalizada entre todos os setores da economia. O papel das grandes mineradoras é definir os padrões tecnológicos, já que possuem maior capacidade de investimento. Outro ponto a destacar é que, embora haja uma corrida pelos grandes volumes, com o avanço de tecnologias como chips, sistemas militares, processamento autônomo e precisão, as cadeias produtivas menores – que lidam com materiais especiais, como terras raras ou minérios voltados a setores econômicos específicos – ganham cada vez mais destaque.

Falando agora sobre a desconfiança da população. O Brasil e Minas Gerais, especialmente, sofreram muito com os rompimentos das barragens da Vale em 2015 (Mariana) e 2019 (Brumadinho). De lá para cá, muita coisa mudou por força de lei e por pressão da sociedade, mas não parece suficiente. A sociedade ainda se sente muito distante da mineração, diferentemente do que ocorre com o agro, por exemplo, que é uma atividade tão impactante quanto a mineração. A comunicação é mais um gap na construção desse futuro desejável e possível para a mineração?

Sem dúvida, esse é um grande desafio. Há um esforço para mostrar o que está sendo feito, mas a mineração, muitas vezes, aparece como um setor invisível, muito distante do cidadão médio. Um dos objetivos do nosso estudo é também ajudar a comunicar o quanto a mineração é importante e qual papel de protagonismo ela pode exercer no Brasil – uma mineração responsável, que gere cada vez mais riqueza para o País. Diante disso, traçamos linhas de desenvolvimento em várias frentes: ambiental, política, econômica e tecnológica. Cada ator tem uma responsabilidade em cada um desses pilares.

Ainda falando em futuro, no segundo semestre teremos a Conferência do Clima – a COP 30 – na Amazônia, em Belém (PA). O mundo inteiro estará com os olhos voltados para o Brasil. Como podemos capitalizar esse evento e mostrar tudo de bom e correto que é feito aqui, inclusive pela mineração?

Precisamos saber aproveitar a COP 30. Além de demonstrar que é possível desenvolver economicamente e equilibrar as questões ambientais, acredito que a COP seja uma grande oportunidade para apresentarmos esse futuro que enxergamos para a mineração e posicionarmos o Brasil como protagonista sustentável nesse setor. Esperamos também apoiar e oferecer insumos. Nosso relatório detalha uma série de oportunidades para a COP.

A possível sub-representação dos EUA na COP 30 abre espaço para o Brasil ser, além de anfitrião, protagonista do evento?

O grande desafio é como vamos nos posicionar. O Brasil tem muitos bons projetos e é preciso demonstrá-los de forma adequada. Muitas vezes, os recursos estão disponíveis, mas o que falta é uma apresentação, uma defesa bem elaborada. Precisamos brigar menos internamente e buscar alternativas que destravem a produção do ponto de vista regulatório, sem desrespeitar os envolvidos.

Agora, vamos dar uma boa notícia: o lançamento da KR Mining Venture, que vai apoiar 30 startups do setor. O que você pode adiantar?

Foi muito providencial lançarmos o estudo no Minas Summit, um evento de inovação, porque se trata de um estudo sobre o futuro tecnológico. Chamamos toda a comunidade de inovação a construir esse futuro conosco. Aproveitamos para lançar a KR Mining Ventures, que é uma venture builder e um venture capital. É uma iniciativa da KR Capital, da FCJ e da Academic Ventures. Vamos desenvolver, nos próximos anos, uma rede de 30 startups.

Já estamos discutindo também projetos de desenvolvimento socioeconômico e de proteção ambiental em uma comunidade próxima a Belo Horizonte, que não têm necessariamente relação com o desenvolvimento de startups, mas mostram que a construção do futuro vai muito além disso. Nos próximos meses, teremos muitas novidades.

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