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Quiet quitting é a nova e questionável tendência do mundo corporativo

Movimento se tornou comum entre as gerações Z e Millenials
Quiet quitting é a nova e questionável tendência do mundo corporativo
Fabiana Teixeira: as pessoas estão pedindo por um tratamento humanizado | Crédito: Arquivo Pessoal

O recente, porém, impactante termo ‘Quiet Quitting’ (que significa ‘demissão silenciosa’ na tradução do inglês), vem tomando as redes sociais e publicações na mídia nas últimas semanas, principalmente no TikTok.

O termo, cunhado por usuários do Reddit durante a pandemia, ganhou tração e cada vez mais visibilidade por ser considerada uma ‘resposta’ às condições de trabalho não favoráveis, principalmente nos Estados Unidos. Basicamente, consiste em um colaborador fazer apenas o necessário para manutenção do emprego, sem nenhum esforço a mais do que lhe é pago, e se tornou um movimento comum entre pessoas das gerações Z e Millenials.

Recentemente, como uma solução, empresas ainda adotaram o ‘Quiet Firing’ (demitir silenciosamente), onde gradualmente se cria um ambiente de trabalho insustentável, que force o colaborador a sair. “O que, na minha opinião, está longe de um recurso viável para resolver o reflexo de uma insatisfação em grande escala, onde o colaborador procura apenas trabalhar conforme o acordado, nem mais, nem menos,” comenta Fabiana Teixeira, especialista em Comunicação Empresarial, que já trabalhou com muitas empresas e profissionais para resolver falhas em sua comunicação.

Para Fabiana Teixeira, esse é o ‘X’ da questão, e onde se desencontram líderes e colaboradores: uma comunicação efetiva, que não envolve apenas falar, mas também escutar. “Esse é um movimento de ruptura, um momento de oportunidade para reflexão, um ‘presta atenção’ para gestores e empresários. O grito silencioso dos jovens por uma transformação ainda mais radical do mindset, que procura viver para se dedicar a outras atividades além do trabalho, e assim cultivar uma boa saúde mental,” ela explica.

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A especialista acredita que ambos os fenômenos mostram que existe um buraco neste diálogo, e a conversa entre empregado e empregador se torna apenas focada na rotina, na meta e no resultado, o que não cria um ambiente de trabalho saudável e pode forçar pessoas à um nível de produção insustentável.

“Pode ser uma realização desconfortável para muitos, principalmente depois de tanto tempo aplicando um mesmo formato. Mas as pessoas estão pedindo, mesmo que de maneira silenciosa, por um tratamento humanizado”, ela pontua. “Querendo ou não, estamos evoluindo como sociedade e o novo mundo do trabalho exige diálogos mais transparentes sobre os indivíduos que compõe uma instituição.”

Ela explica que o que resta entre o ‘Quiet Quitting’ e o ‘Quiet Firing’ é apenas o silêncio entre as partes, o que não leva a nenhuma solução, e apenas gera antipatia. Para Fabiana Teixeira, para que haja mudança é preciso dialogar, se comunicar com o outro, e isso só acontece com o amadurecimento do senso de coletividade. “E essa transformação para a visão humanizada vem gerando resultados positivos e comprovados para empresas no mundo todo.”

Ela exemplifica o levantamento do Empresas Humanizadas, divulgado em 2019, que mostrou 225% mais engajamento entre os colaboradores, e 240% maior fidelização de clientes em organizações do tipo.

“O líder precisa entender o seu time, e conforme o tempo passa isso significa um alinhamento da cultura organizacional. O ‘a mais’ do colaborador deve ser conversado e recompensado, devemos incentivar e respeitar os limites da dinâmica trabalho/vida, para evitar o esgotamento. Um protesto silencioso é sinônimo da falha em ouvir, e essa correção é essencial para caminharmos juntos em frente,” finaliza Fabiana Teixeira.

Novas gerações reagem ao trabalho excessivo

O movimento nascido nos Estados Unidos “Quiet Quitting” trouxe reflexões em sinal de descontentamento aos modelos de relação de trabalho atuais que, ao longo da pandemia, foram colocados em cheque. Apesar da revisão de atitudes e processos que aconteceram no mercado de trabalho para além da produtividade e saúde financeira, dois anos depois, muitas empresas voltaram aos velhos hábitos – o que contribuiu para as manifestações.

Segundo o CEO da Randstad no Brasil, consultoria global de Recursos Humanos, Fabio Battaglia, “o ‘Quiet Quitting’’, que viralizou por meio de diversos conteúdos no TikTok e no Twitter e começou nos EUA, também refletiu no Brasil. E, apesar da sua tradução literal ser ‘demissão silenciosa’, é preciso entender a real proposta da expressão: as pessoas não estão desistindo do seu emprego, mas abandonando a ideia de ir além em detrimento de mais equilíbrio com sua vida pessoal. Assim como A Grande Resignação, é um movimento que reflete esse comportamento e funciona como manifesto, com o objetivo de ressignificar as relações entre pessoas e empresas”.

Seguindo essa tendência, mesmo em um cenário de alto desemprego, o Brasil registrou recorde de demissões, o que tem se estendido até os dias de hoje, com a dificuldade de recolocação e difícil retomada das empresas. Nos últimos 12 meses, até julho de 2022, foram mais de 6 milhões de pedidos de demissão entre os trabalhadores com carteira assinada, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Esses números representam um terço de todos os desligamentos registrados nos últimos 12 meses – mais de 19 milhões.

“De acordo com a nossa pesquisa Workmonitor, no Brasil, 92% dos trabalhadores anseiam por formatos de trabalho e carreiras mais flexíveis para acomodar outras atividades ao longo do dia. Isso reforça que os talentos seguem valorizando companhias que se preocupam genuinamente com o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Eles querem se sentir satisfeitos, gerir o próprio tempo, evitar situações de desgaste e ter mais qualidade em suas relações”, complementa Fabio Battaglia.

O “Quiet Quitting” está mais presente nos jovens trabalhadores da Geração Z e Millennials, que têm se mostrado a favor de reescrever essas regras. A tendência está alinhada ao estudo Workmonitor, que destaca que cerca de 56% da geração Z e 55% dos Millennials deixariam seus empregos caso interferissem em sua vida pessoal. O levantamento também mostra que a maioria dos jovens busca trabalhar em empresas cujos valores estejam em sintonia com seus valores pessoais.

“Esse fenômeno reforça que a mão de obra mais qualificada – principalmente jovens adultos que tiveram experiência em modelos mais flexíveis e em um ambiente que puderam equilibrar demandas profissionais e pessoais – começou a questionar o que queriam para si em termos de desenvolvimento. Com todas as mudanças que estamos vivenciando, destaco a importância de preparar as lideranças para administrar as metas e objetivos de forma mais empática e sustentável, principalmente com as novas gerações que estão desistindo, não do trabalho, mas sim, de alguns modelos de relações”, conclui o executivo.

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