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Setor de franquias se volta para o interior do Brasil

Destaque de Minas Gerais fica com Uberlândia, no Triângulo Mineiro, que subiu uma posição, da 23ª para a 22ª
Setor de franquias se volta para o interior do Brasil
Crédito: Reprodução Adobe Stock

Cada vez mais próspero e movido especialmente pelo crescimento do agronegócio, a força de cidades de regiões fora do eixo Rio-São Paulo, como no interior paulista e mineiro, têm feito “os olhos do setor de franquias brilharem”. O mais recente Ranking das 30 Maiores Cidades, divulgado em novembro de 2023, pela Associação Brasileira de Franchising (ABF), revela que 40% (12 delas) não são capitais.

Segundo o levantamento, entre os Top 10 municípios que registraram o maior crescimento em número de unidades no primeiro semestre de 2023 frente a igual período de 2022, Londrina (PR) lidera o ranking. A cidade saltou 25 posições em relação ao ranking do ano anterior e apresentou a maior variação entre as listadas (15,7%), passando de 971 para 1.124 operações. O destaque de Minas Gerais fica por conta de Uberlândia (Triângulo Mineiro), que subiu uma posição, da 23ª para a 22ª.

O Censo 2022 do IBGE aponta que o Brasil tem 203 milhões habitantes, distribuídos em pouco mais de 5,5 mil municípios, sendo que apenas 41 deles têm mais de 500 mil habitantes. Essa faixa concentra 58,8 milhões de pessoas. Outras 278 cidades têm entre 100 mil e 500 mil moradores. Somadas, elas possuem uma população de 56,7 milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, cerca de dois terços das cidades do País têm menos de 20 mil habitantes. Isso quer dizer que 43,1% da população vivem em cidades consideradas pequenas.

Para o diretor-regional da ABF Minas, Antônio Bortoletto, além do número de pessoas, ajuda a explicar o interesse das franqueadoras pelas cidades menores, a desconcentração de renda observada nos últimos anos no Brasil.

Antônio Bortoletto
Quem não tiver presença no interior está fadado ao fracasso, afirma Antônio Bortoletto, da ABF | Crédito: Keiny Andrade

Também de acordo com dados do IBGE, em 2002, apenas quatro cidades – São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte – representavam cerca de 25% do PIB nacional. Já em 2021, 11 cidades formavam o grupo, entrando para a lista três interioranas: Osasco (SP), Guarulhos (SP) e Maricá (RJ).

“Quem não tiver presença no interior está fadado ao fracasso. Especialmente depois da pandemia, as pessoas querem mais qualidade de vida e entenderam que com a tecnologia podem trabalhar quase de qualquer lugar. Com o tempo economizado nos deslocamentos, elas podem realizar o sonho de empreender. As franquias são um ótimo modelo para quem está nessa fase porque entrega um negócio testado e aporta o conhecimento necessário”, explica Bortoletto.

Criada em Santarém (PA), em 1999, a Casa do Celular não só nasceu como projetou o seu crescimento pelo interior do Brasil. De acordo com o CEO da marca, Hugo Casasanta, a opção foi levar um serviço imprescindível e que precisa ser rápido para um público desassistido. São 225 unidades, metade delas fora das capitais.

Hugo Casasanta
Hugo Casasanta: Casa do Celular não só nasceu como projetou o seu crescimento pelo interior do Brasil | Crédito: Divulgação Casa do Celular

“No nosso setor o cliente necessita de atenção imediata. E, por mais que o e-commerce cresça, o País tem uma dificuldade logística. Modelamos o negócio para ter lojas em cidades a partir de 40 mil habitantes e pode ser que a gente baixe essa régua que já foi de 60 mil. Os grandes varejos acabam não olhando para essas cidades, então, acabo surfando sozinho. Minas Gerais é um país para a gente trabalhar. Já estamos nas principais cidades e agora abrindo em Montes Claros (Norte de Minas). Já são mais de 30 unidades no Estado e acredito que a participação mineira possa chegar a 18% do total de lojas”, afirma Casasanta.

Interior pede franquia de diferentes setores

Ao mesmo tempo em que atraem marcas de diferentes lugares, o interior também tem gerado franquias vencedoras, apostando em originalidade e formatos pensados por quem vivencia as características e dores das cidades menores.

“Além de entender como o interior funciona, essas franqueadoras têm como vantagem uma maior aproximação com a comunidade local, o que gera, via de regra, uma mão de obra mais engajada, custo operacional menor e, em muitos casos, incentivos tributários municipais e estaduais”, pontua o diretor-regional da ABF Minas.

A Calçados Bibi, fundada em 1949, em Parobé (RS) , tem 47% das 130 unidades fora das capitais. De acordo com a presidente da marca de calçados infantis, Andrea Kohlrausch, os famosos sapatinhos sempre chegaram ao interior através das multimarcas, mas a partir do franchising o relacionamento com esse público ficou mais próximo.

“Em 2007 tivemos a oportunidade de levar a nossa essência direto para o consumidor e com a pandemia, em 2020, o interior ganhou ainda mais força. Ao mesmo tempo, a digitalização impôs como desafio fazer com que os canais de contato com consumidor estejam integrados. Minas Gerais é uma região rica e populosa, onde ainda temos muitas oportunidades para explorar. Estamos em cidades como Uberlândia e Uberaba (Triângulo), Juiz de Fora (Zona da Mata), Varginha (Sul de Minas), Montes Claros, Contagem (Região Metropolitana de Belo Horizonte), além da Capital. Queremos avançar pelas cidades polo das microrregiões”, pontua Andrea Kohlrausch.

Andrea Kohlrausch
Andrea Kohlrausch: os calçados Bibi chegaram ao interior do Brasil através das multimarcas | Crédito: Divulgação Bibi

Especializada em produtos biológicos, nutrição e tecnologia de aplicação, a Naval Fertilizantes, nasceu como Global Agro do Brasil, em Campo Novo do Parecis (MT), em 2014. São três formatos: Pleno, a partir de R$ 83,1 mil; Sênior, a partir de R$ 120,5 mil e o Master, a partir R$ 138,5 mil. Segundo o CEO da Naval Fertilizantes, Luís Fernando Schiavo, a expectativa é de que a empresa de insumos encerre a safra 2024/25 com 100 franquias e em cinco anos, a meta é chegar a mais de mil unidades.

“Buscamos como franqueados vendedores que já atuam no segmento do agro e que já não têm mais como crescer. O negócio do agro é de confiança. O produtor precisa confiar no vendedor. Quero construir algo em que o cliente veja valor. Minas é o estado onde eu tive mais chamados para conversar. Vamos montar um CD em Minas ainda dentro da safra 2025/2026”, anuncia Schiavo.

Minas lança franquias do interior para o interior

A origem no Sul de Minas e o “jeitin” mineiro são apontados pelo coCEO da Cheirin Bão – maior franquia de cafeterias do Brasil -, Wilton Bezerra, como alguns dos fatores que justificam o sucesso da marca, além da qualidade dos produtos – quase todos produzidos no interior do Estado – e do atendimento prestado.

“Entendemos que o diferencial que ninguém consegue copiar é estarmos aqui. O tema da nossa última convenção foi “Ligando as nossas raízes ao futuro”. Aqui conseguimos ter insights diários. Nascemos levando a cultura do interior, aquele lugar onde as pessoas descansam e têm memórias afetivas. Nossos sabores são degustados no dia a dia. As receitas são de famílias centenárias. Precisamos ser originais e tradicionais, sabendo inovar”, afirma Bezerra.

A Cheirin Bão tem o centro operacional em Varginha e fazenda e indústria em Carmo de Minas. A posição geográfica privilegiada, entre Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte, além da infraestrutura da cidade, que oferece aeroporto e porto-seco, também merece destaque.

De acordo com o mais recente balanço da ABF, a rede de cafeterias no ano passado ocupava a 36ª posição no ranking das franqueadoras, com 539 operações, registrando um crescimento de 23,2% e avançando nove posições na lista. Hoje já são mais mil unidades comercializadas.

“O modelo de cafeteira não era comum nos interiores e percebemos que isso era uma oportunidade. O desafio era a ausência de shoppings. Montamos, então, um modelo de rua, que corresponde a 65% do total atualmente. Começamos a montar lojas nos extremos do País com desempenhos tão bons quanto nas capitais e tíquetes maiores. Temos uma missão de levar esse pedacinho de Minas para o mundo. Para atender o interior não é só fazer um modelo menor. As pessoas não são menores nas cidades pequenas. Elas querem ter a mesma experiência. É preciso pensar em estratégias específicas”, ensina o coCEO da Cheirin Bão.

Para o vice-presidente da vertical de Consultoria da 300 Ecossistema de Alto Impacto, Lucien Newton, as marcas precisam estudar antes de se aventurarem pelo interior e configurar novos modelos para atender essas cidades.

“Do ponto de vista de negócios, o custo operacional no interior é menor, mas o volume de venda também. No final das contas, o retorno é muito similar. Cabe às franqueadoras compreender o boom do lançamento e saber se reinventarem. E também tomarem cuidado com o comportamento de manada dos candidatos a franqueados enquanto a marca ainda é novidade. De outro lado, os municípios também precisam se preparar e estabelecer políticas públicas de atração e retenção das franquias, inclusive promovendo eventos para apresentar a cidade às franqueadoras e futuros investidores”, analisa Newton.

Enfrentando estereótipos, a Homenz – rede de clínicas estéticas masculinas, criada pelo empresário Luís Fernando Carvalho – surgiu em Uberaba de maneira tímida. Hoje, com 60 unidades e mais 110 em implantação, a meta é chegar a 500 nos próximos cinco anos.

Fernando Carvalho
Muita gente dizia que não daria certo, revela o empresário Luís Fernando Carvalho, da Homenz | Crédito: Divulgação Homenz

“Tudo começou quando depois de um tratamento oncológico quis cuidar da aparência e me senti envergonhado ao entrar numa clínica que só tinha clientes mulheres. Achei naquele momento uma oportunidade de negócio. A primeira unidade foi montada em um prédio comercial para ser discreta. Naquele ano, entendi que o DNA do negócio é a experiência do cliente e já sabia que a expansão seria pelo franchising. Muita gente dizia que não daria certo porque o homem do interior não gastaria com isso. Hoje focamos em cidades com mais de 100 mil habitantes e temos oito unidades em operação em Minas e mais sete negociadas”, completa Carvalho.

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